Desertar ou ir à guerra? Há mais de 40 anos, muitos jovens portugueses confrontaram-se com esta difícil alternativa.
Há dias, em conversa com um amigo, concluímos que a questão da guerra colonial tinha marcado impressivamente a nossa geração e que faltava fazer um estudo sobre as atitudes relativas à oposição à guerra, nomeadamente acerca dos desertores e refractários. Como se verá abaixo, as diversas oposições ao regime tinham tácticas diversas no combate à guerra colonial. Ora, tanto o meu amigo como eu própria continuamos ambos a defender que era então correcta a atitude de desertar, senão a mais correcta. A questão é polémica e quase tabu em Portugal. Quarenta anos após 25 de Abril de 1974, a questão deve ser discutida. Pessoalmente penso que também urge fazer "justiça" à atitude que tiveram dezenas de milhares de jovens portugueses, ao recusarem-se a participar na guerra colonial.
Ora, acabo de saber que o cineasta Rui Simões estreou, na Cinemateca, o documentário Guerra ou Paz, cuja sinopse pode ser aqui lida - http://guerraoupaz-2010.blogspot.pt/
«Entre 1961 e 1974, 100.000 jovens portugueses partiram para a guerra nas ex-colónias. No mesmo período, outros 100.000, saíram de Portugal para não fazer essa mesma guerra. Em relação aos que fizeram a guerra já muito foi dito, escrito, filmado. Em relação aos outros, não existe nada, é uma espécie de assunto tabu na nossa sociedade. Que papel tiveram esses homens que “fugiram à guerra” na construção do país que somos hoje? Que percursos fizeram? De que forma resistiram? Esta é a história que GUERRA OU PAZ pretende contar: a dos jovens que se recusaram a participar numa guerra que não sentiam como sua, sem pôr em questão o seu amor à Pátria. Se há a figura do Soldado Desconhecido, este filme pretende retratar esse outro Homem Desconhecido que recusou ser soldado».
A propósito do tema da deserção, publico aqui excertos do meu livro História da Oposição à Ditadura, 1926-1974 (Figueirinhas, 2014)
Capítulo V, pp. 415-417
«Para a maioria dos elementos da oposição ao regime, a questão da guerra colonial era, desde o início dos anos 60, um tema incómodo, dado que, enquanto os socialistas e republicanos tinham alguma reserva em aceitar a independência das colónias, o PCP, que foi o único partido a reconhecê-la, oscilara inicialmente entre uma retórica nacionalista sobre os custos da guerra e um «modo proletário» de encarar o assunto, que vincava a solidariedade internacionalista com os povos das colónias[1]. Lembre-se que o tema da independência dos territórios africanos tinha surgido pela primeira vez, em texto, no V Congresso do PCP, em 1957, com a definição de uma táctica organizativa que passava por criar secções do partido nas colónias. Posteriormente, esta táctica mudaria, passando os comunistas a estimular a criação e apoio aos partidos indígenas em luta pela independência nacional.
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