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Resposta (muito atrasada) ao Rui Moreira

Num artigo intitulado Trocar euros por Galambas, o colunista Rui Moreira mostrou-se escandalizado com a minha afirmação de que ‘no sistema monetário em que vivemos, o 'dinheiro' não é um recurso escasso. Escassos são os recursos reais que o dinheiro pode comprar, não o dinheiro propriamente dito. A partir daqui, e socorrendo-se da sua fértil imaginação – não das minhas ideias, que manifestamente não compreende – embarca numa diatribe sem nexo, de onde conclui, entre outras coisas, que eu defenderia uma repetição da hiperinflação de Weimar como solução para a economia da Zona Euro.

 

Lamento desiludir o colunista, mas limitei-me a dizer que, com níveis recorde de desemprego na Zona Euro (10.1% segundo o Eurostat), o risco de inflação, como é amplamente demonstrado por todos os indicadores que reflectem as expectativas do mercado, é reduzido, para não dizer inexistente. Não disse que a inflação é a solução; apenas que esta, no contexto actual, não é um risco com o qual nos devamos preocupar. Que haja pessoas para quem a hiperinflação está sempre ao virar da esquina, nada nos diz sobre a realidade, mas apenas sobre os estados emocionais e cognitivos de quem insiste em tal afirmação.

 

Quanto à afirmação que escandalizou Moreira – bem, dizer que o dinheiro não é um bem escasso é a mera constatação que vivemos num sistema de moeda fiduciária, não no padrão ouro. Aparentemente, Rui Moreira não percebe a diferença.

 

A criação de moeda é inflacionista? Teoricamente, sim; na prática, depende. Na economia, como em quase tudo, os riscos dependem do contexto e o que pode fazer sentido num momento, deixa de fazer no outro. É aqui que o desemprego elevado e o crescimento débil da economia se tornam relevantes. Lamento desiludir o colunista, mas se não fizermos nada para inverter a situação, por causa de uma ameaça teórica de inflação, não confirmada pela realidade, o risco maior é a deflação.

 

Desde o início da crise, os bancos centrais têm-se dedicado a desmentir as crenças de Rui Moreira, praticando políticas monetárias expansionistas para dinamizar a economia. Esta política não teve os resultados pretendidos, não por causa da inflação (apesar do que afirma o colunista), mas porque os privados estão mais preocupados em usar essa liquidez para reduzir os seus níveis de endividamento e não para consumir ou investir. A situação na Europa é ainda mais grave, pois o BCE não pode financiar os Estados que queiram substituir sectores privados em retracção. Quando defendo que o BCE devia financiar Estados com dificuldades de liquidez, limito-me a dizer que a política monetária só será eficaz na dinamização da actividade económica se for canalizada para quem está disposto a gastar, não para quem se limita a entesourar.

 

Rui Moreira até pode ter lido aquele tal ‘contramanifesto em que se defendiam todas as obras megalómanas do regime’, mas é evidente que não compreendeu o que lá estava escrito. O manifesto limitou-se a antecipar a situação em que hoje nos encontramos: sem uma firme resposta contra-cíclica, coordenada ao nível da UE, esta crise terá efeitos devastadores. O simples facto de estarmos hoje com os níveis de desemprego mais elevados desde a criação do Euro e de ser já praticamente consensual que vai haver uma desaceleração do crescimento económico, parece mostrar que os ‘solícitos economistas’ tinham razão. E que, até prova em contrário, continuam a ter.

 

Nota: ao abrigo do direito de resposta, e depois de falar com a direcção do jornal, enviei este artigo para publicação no JN. Isto passou-se no dia 22 de Novembro. Foi-me dito várias vezes que o iriam publicar, mas, até agora, e sem que me tenham dado qualquer explicação, tal não aconteceu.

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