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Continuemos a fazer de conta

Mário Crespo faz de conta que escreve uma crónica, que é o mesmo que dizer que faz de conta que comenta factos da actualidade.

Comecemos por fazer de conta que Mário Crespo sabe tudo o que se passou no caso Freeport, que não mistura a gosto tios e primos, sobrinhas e sobrinhas. Que não recorre ao folhetineiro estilo “vocês sabem do que é que eu estou a falar”.

Continuando a acompanhar o estilo e a metodologia da mistela feita crónica, façamos de conta que o pregão onde Mário Crespo pretende fazer de conta “que a Universidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo” jamais poderia ser proferido numa feira, conjugado num “ó freguesa dois pares de cuecas pelo preço de uma; e a Universidade que licenciou José Sócrates está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo”.

Façamos ainda conta que tirar um curso numa universidade que “está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo” é, também por si, um caso de polícia. E que todo este fazer de conta de Mário Crespo quer dizer alguma coisa, que é afirmação contextualizada, com alguma espécie de substância, que não fica no ar uma espécie de conclusão que não chega a ser retirada. E aqui chegados façamos de conta que o inconclusivo não é propositado.

Façamos de conta que fazer de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês é arrasador para o destinatário. E que não há má fé na piadola e que a piadola ainda não chegou à tasca.

Façamos igualmente de conta que Mário Crespo sabe do que fala quando nos aconselha a fazer de conta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral. Façamos de conta que ignoramos as demais considerações que o neófito entrevistador de horário nobre tece a propósito da entrevista concedida por Freitas do Amaral. Façamos de conta, para isso, que Mário Crespo foi ao fundo de questão, que analisou quês e porquês, que estudou o assunto - que procurou, encontrou, comparou e concluiu. O que fez de conta que concluiu.

Façamos de conta que os media nada têm a ver com todo este mundo do faz de conta e que alguns jornalistas não escrevem crónicas como a que Mário Crespo deu à estampa, com elas contribuindo para tanto faz de conta. E, porque não?, façamos ainda de conta que uma mentira repetida à exaustão não tende a transformar-se numa verdade.

Façamos de conta que misturar o enjoativo "Magalhães", as declarações do director do Sol e a existência do SIS não dá origem a uma mixórdia que só desacredita quem a assina.

Façamos de conta que Mário Crespo não recupera também a falsa questão do relatório da OCDE que afinal não o era. E façamos de conta que ninguém percebeu que o dito “caso” não se reduz a uma monumental gaffe política e que o Governo pretendeu mesmo tirar dividendos duma pantominice gerada por negligência.

Façamos de conta que faz sentido trazer novamente a terreiro as afirmações de Jorge Coelho e de Augusto Santos Silva – e aqui façamos igualmente de conta que eu aprecio as personagens. E façamos de conta que invocar, neste ponto, o que o carniceiro Nazi Klaus Barbie terá dito, à laia de comparação, é coisa para ser levada a sério. Dita por gente que quer ser levada a sério.

Façamos de conta que o que Mário Crespo diz acerca dos bastidores da entrevista com Pedro Silva Pereira não é dito por um jornalista. E façamos de conta que Mário Crespo nunca recebeu outros telefonemas de tão grave teor.

Façamos de conta que entender como Mário Crespo entendeu a suposta comparação entre o Caso Freeport e o Caso Dreyfus não é “infinitamente ridículo e perverso”. E que é de bom tom chamar os bois pelos nomes.

Façamos de conta que Sócrates é responsável directo pelos buracos da minha rua. E façamos de conta que é ele o responsável pelas indagações da Polícia antes de manifestações legais de professores. Porque temos provas disso. E façamos, já agora, de conta que essas indagações vão além de meras indagações procedimentais.

Façamos de conta que a entrevista dada pela procuradora Cândida Almeida não foi um momento ímpar, um precedente a ser seguido e invocado, nas espinhosas relações entre a comunicação social e Justiça. E façamos de conta que é correcto traduzir essas declarações por “sequência de entrevistas do Ministério Público”. Façamos de conta que não se é preso por ter cão e preso por não ter. Que a relação entre a Justiça e a comunicação social não tem areias na engrenagem, que esta nunca as invocou para malhar no segredo de justiça, e que colocar um pouco de óleo no mecanismo não é agora passível de crítica.

Façamos de conta que não é normal o Presidente da República chamar o PGR nas circunstâncias em que o fez. E façamos de conta que algo que mexe com os órgãos de soberania não é assunto de Estado, sem que daí possam ser tiradas outras conclusões.

Façamos de conta que a alusão ao funcionamento da democracia, a Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos e Kabila não fica ali a matar e que foi proferida no calor da rítmica. Aqui chegados façamos de conta que no pasa nada, que todos podemos dizer o que nos der na real gana.

Se fizermos estes de conta todos, teremos uma crónica séria, circunstanciada, de argumentos sólidos. Coisa sem segundas intenções, um momento feliz. E neste caso, ser entrevistado por Mário Crespo não voltará a ser uma obrigação.

E será caso para dizer: parabéns, Mário, essa foi bem esgalhada.

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