o cu e as calças, parte 2
não, tomás. não o li apressadamente. o tomás escreveu 'se, por sorte, os polícias se tivessem antecipado e, em legítima defesa, disparado sobre os assaltantes, o «pessoal do costume» estaria, em coro, a brandir despautérios contra «a violência policial sobre gente pobre, de um bairro pobre»'.
esta falsa dicotomia entre os que defendem a integridade dos polícias e os que condenam a violência policial é uma minha muito velha conhecida. é que, caro tomás, é possível, ao mesmo tempo, condenar o uso ilegítimo e injustificado da força pelos agentes policiais e defender a integridade dos agentes e a nobreza da sua missão. eu diria mesmo que essa é a única atitude aceitável num defensor do estado de direito. é que achar que a integridade dos polícias só pode ser defendida através do uso indiscriminado da força é uma coisa um bocado inaceitável -- e não faltam filmes e livros e tratados, para além de realidades tristemente célebres, para o provar.
talvez tenha sido então o tomás a escrever apressadamente. ou talvez não, já que na resposta que me dá diz 'A Fernanda pergunta-me: se o tomás ou alguém das suas relações um dia destes levar um tiro estúpido e injustificado da polícia vai achar bem e aplaudir? Penso que a pergunta só faz sentido se a Fernanda acha que eu ou alguém das minhas relações andamos no gamanço.' daqui se depreende que o tomás acha duas coisas. uma é que só corre o risco de levar um tiro injustificado 'se andar no gamanço'. outra, que decorre mais ou menos desta, é que para o tomás, de certa forma, andar no gamanço justifica levar tiros. o tomás está enganado na primeira coisa que acha, como muitos casos, recentes, recentíssimos e nem tanto provam -- e que o tomás, se calhar por distracção, ignora. e nem preciso de lhe dizer -- diz a lei -- que está enganado na segunda. mas, lá está: às vezes dispara-se sem pensar.

