In Rasgo Veritas
No dia em que o Diário Económico desvenda alguns detalhes sobre o LEAF, o carro eléctrico da Nissan que rodará em breve com baterias made in Portugal, numa notícia aparentemente não relacionada dá-nos igualmente conta de um aviso da Agência Internacional de Energia. De acordo com o economista-chefe da AIE, uma «catastrófica» crise energética pende sobre a retoma da economia mundial devido ao facto de estarmos a atingir o peak oil, isto é, a capacidade máxima de produção de petróleo.
A relação que encontro entre ambas as notícias pode ser encontrada num artigo de Paul Ames no Global Post, reproduzido pela Reuters, intitulado «Has Portugal solved the electric car problem?» O artigo, que refere o grande investimento do governo Sócrates em energias alternativas, descreve igualmente o plano arrojado que pretende evitar que estes carros eléctricos sofram o destino dos seus antecessores, descrito num documentário de 2006 - que conta a história da «morte» dos carros eléctricos nos Estados Unidos, nomeadamente do General Motors EV1 (ou do Ford Ranger EV, ou do Honda EV Plus e do Toyota RAV4 EV). E o que matou o carro eléctrico foi a inexistência de uma rede de abastecimento de base eléctrica.
Assim, Portugal será o tubo de ensaio de uma experiência que o alerta da AIE sugere não poder ser adiada e que será um passo indispensável à ruptura em relação ao actual paradigma energético, completamente dependente do petróleo (o que por seu lado implica uma dependência dos países produtores de petróleo). Esta dependência tem como consequências, para além das questões ambientais, aquelas de que há um ano sentimos os efeitos, nomeadamente a instabilidade política e a crise económica que se seguiram ao aumento do preço do petróleo e ao efeito cascata que despoletou: aumento dos preços, da inflação e das taxas de juro, que por sua vez levaram a uma diminuição do consumo por parte dos particulares e do investimento por parte das empresas, para além de terem reduzido a factura energética cobrada pelo estado.
Este «abanão» corroborou o que muitos aprenderam com aqueloutro suscitado pelo primeiro choque petrolífero de 1973/74 e que foi de certa forma traduzido para o público em geral como a necessidade de um desenvolvimento sustentável, o tal «development that meets the needs of the present without compromising the ability of future generations to meet their own needs» que apontava em 1987 o Brundtland Report.
O 2º choque petrolífero mostrou a enorme vulnerabilidade da economia portuguesa face ao petróleo e a urgência na alteração de paradigma energético cá do burgo, que mais que preocupações ambientais terá como objectivo a redução dos custos médios da produção de energia directamente consumida pelos sectores produtivos da economia. Assim, é necessária uma visão energética de longo prazo que tem necessariamente a ver com o desenvolvimento e investimento numa panóplia de fontes de energia realmente alternativas face às previsões de consumo, como tem sido feito nos últimos 4 anos com a energia hídrica, fotovoltaica e eólica,
O que o João dizia hoje nas páginas do mesmo Diário Económico que nos brindou com este aviso, assume assim contornos catastróficos quando pensamos em políticas energéticas. Isto é, parar, adiar ou rasgar o que está planeado ou em execução nesta área é receita certa para o desastre e um luxo a que o país não se pode dar, a penas de se afundar num buraco estrutural de onde será muito complicado sair...