Quantos dentes tens?
Após catorze anos a ouvir testemunhas em tribunal, começo a especializar-me em detectar mentirosos e em desmontar-lhes o raciocínio. A forma como não olham nos olhos, como os fecham ou os piscam ao dobro da velocidade normal. A forma como parecem sempre fugir ao assunto que se pretende - um dia uma testemunha chegou mesmo a dizer-me que não tinha ido ali para falar daquilo. A maneira como, às vezes com uma sobranceria que enoja, pegam em tresleituras de factos para tentar corroborar algo em que eles próprios já não acreditam. Ainda assim avançam, para se justificarem aos botões do seu grilinho falante. Isto faz-me sempre lembrar o mito urbano do gato no micro-ondas, que a senhora lá tinha colocado porque as instruções não diziam que tal era de todo desaconselhável. Desculpas fracas, que procedem perante tontos ou fanáticos. No que me toca, detesto que façam de mim parvo. Pergunto-lhes sempre quantos dentes têm.