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jugular

dos filhos da puta

a pedido de várias famílias (nomeadamente daquelas muito disfuncionais) republico aqui o primeiro tomo de uma série que ainda há-de ser uma coisa muito elaborada, se deus quiser (sim, tou a ver se consigo imitar o maradona, sem grande sucesso por dar-se o caso de ele ser inimitável, acto em que estou em contínuo a fazer as pazes com ele porque já chega de estar zangada), e que se deus também quiser há-de ser a minha fortuna -- alguma coisa, se deus quiser, há-de ser a minha fortuna e depressinha, que não vou para nova e até agora népias.

 

ora aqui vai a coisa, repescada daqui:

 

sempre me fez muita confusão que para chamar um nome a alguém — no caso, para dizer que alguém não presta — se optasse por qualificar a respectiva mãe. ora não só me parece de manifesto mau gosto partir do princípio de que uma pessoa é má rês por alguma coisa que a mãe fez ou deixou de fazer, como não me é minimamente óbvio que o trabalho sexual deva ser associado à geração de más índoles. mas o mais curioso de tudo será a espécie de desculpabilização do facínora implícita na designação. como quem diz que o problema não é bem dele, é da mãe.

 

 

se me estivesse a dar um acesso de feminismo diria que é a velha mania, pelo menos tão velha quanto o livro do génesis, de atribuir a culpa de tudo às mulheres. como, pensando bem, se calhar não há momento nenhum em que não tenha acessos de feminismo, vou mais longe: fazer coincidir o epíteto ‘filho da puta’ com uma pessoa sem princípios é também dizer (entrando no subtexto da coisa, naturalmente) que é alguém sem pai conhecido, ou seja, fazendo um pouco de arqueologia cultural (sem grande esforço, basta mergulhar nas caixas de comentários dos blogues), alguém ’sem figura da autoridade’, assim a modos que sem ninguém que lhe explicasse o certo e o errado (coisa para a qual, como é sabido, as mulheres em geral não servem e as putas ainda menos).

 

aqui temos pois o filho da puta como vítima do destino, como mau por afinidade: tadinho, não podia fazer diferente, não podia ser diferente. never had a chance.

 

ora parece-me tal coisa uma insuportável afronta ao verdadeiro filho da puta, o escroque de primeira, que não se esconde atrás de ninguém nem pede desculpa de nada. o gajo que faz mal por gosto, por desfastio. um gajo que se pode respeitar, até. o contrário do sonso — ai, o que eu odeio sonsos e sonsices.

 

está pois na hora de arranjar umas palavras velhas para substituir esta desprimorosa, inexacta e facilitadora expressão. sobretudo porque estamos sempre a precisar dela, quando e onde menos se espera.

nos próximos capítulos da série, debruçar-me-ei sobre as expressões ‘vai para o caralho’, ‘vai-te foder’ e quejandas, numa aprofundada reflexão sobre o paradoxo de a linguagem venal fazer coincidir o que parece ser o desejo de (quase) toda a gente (ter sexo/foder) com o pior dos impropérios.

 

isto, claro, se amanhã quando acordar ainda me apetecer.

 

(a ver se me apetece, pois)

 

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