comissão de quê?
ainda não li a decisão citada -- tenho tido mais e melhor que fazer -- mas conheço os termos (de resto, extraordinários) daquela de que recorri. em todo o caso, e porque agora não tenho muito tempo, vamos ver se percebi (e se percebemos todos, porque isto, caso ainda se não tenha percebido, diz respeito a todos):
não atenta contra a reserva da intimidade quem identifica publicamente outra pessoa com base numa sua relação íntima, sem que esta a isso autorize;
a matéria em causa -- identificar uma pessoa com base na sua alegada relação íntima -- era 'do conhecimento público' (não interessa pelos vistos perceber como -- isto é, por que meios e com que legitimidade e rigor e deontologia jornalística é que terá chegado ao 'conhecimento público') e de 'interesse jornalístico' (será o mesmo que o interesse de vender jornais/revistas/folhas de couve? seria muito muito interessante que a comissão explicasse que é que considera interesse jornalístico, embora fiquemos desta forma com uma ideia).
apesar de haver 'conhecimento público' e 'interesse jornalístico', afinal não há infracção disciplinar porque 'tal relação afectiva foi assumida na biografia autorizada do primeiro-ministro'. esta parte é das mais interessantes desta curta notícia e também da decisão da comissão. quem lê fica obviamente com a ideia -- foi com esse objectivo que a coisa foi pensada -- de que na dita biografia (que se apelida de autorizada para significar que foi como que escrita ou pelo menos toda aprovada pelo biografado, o que a comissão se exime de provar ou sequer de consubstanciar) o biografado 'assume' a tal dita relação. por acaso é falso. mas o mais relevante nem sequer é isso -- é que em relação à queixa de alguém que considera não dever ser qualificada com base numa eventual relação íntima, uma comissão composta essencialmente por jornalistas decida que basta para a qualificar como tal a existência de uma (não existente, de resto) assunção da outra parte da alegada relação (que terá sucedido ao princípio do contraditório? à necessidade de atender a 'todas as partes'? e, já agora, à mera decência?)). é de facto muito bom.
por fim: a queixosa/recorrente 'não podia ignorar a repercussão e as apreciações que as suas opiniões coincidentes com as manifestadas pelo chefe do governo teriam'. a ver se percebemos também esta: se uma pessoa não só tiver opinião como for chamada a dá-la sobre um determinado assunto, deve sempre ter o cuidado de certificar que não é nem de perto nem de longe coincidente com a de alguém com quem tem ou julgam que tem uma relação íntima, para não correr o risco -- ou merecer, pelos vistos -- que apresentem a sua opinião como sendo 'apenas' a de alguém que tem uma relação íntima com o outro, desqualificando-a assim -- à pessoa e à opinião -- por completo.
voltarei a este assunto quando tiver mais vagar. para já, e para se perceber como pode haver opiniões um bocadichinho diferentes, atente-se a este excerto de um parecer do conselho deontológico do sindicato dos jornalistas sobre o mesmo assunto:
adenda: a propósito destes assuntos, um velho texto do provedor do dn, com respostas minhas, de judite de sousa e ricardo costa