«O que justifica o fim?»
Um excelente texto de Daniel Oliveira
«Para que fique claro: não tenho qualquer tipo de ilusão em relação a uma suposta neutralidade do Estado. Muito menos quando me refiro ao uso da violência. Quando um grupo de operários tenta impedir que o patrão leve as máquinas antes de lhe pagar as dívidas a polícia aparece para travar os operários, nunca para impedir o roubo das máquinas. A questão é outra: sem o monopólio da violência por parte do Estado seria melhor? Cada um de nós à solta seria mais justo? Pelo contrário: quem tem poder tem o poder de garantir para si o poder violento, com Estado ou sem ele, porque poder gera poder, incluindo o poder da violência. Em vez de polícias, milícias contra pobres e minorias ou seguranças privados. Em vez de exército, paramilitares e mercenários. Em vez dos tribunais, a Mafia e as suas próprias regras. Em vez de julgamentos, pelotões de fuzilamento. Alguém se chega à frente para defender que a alternativa é melhor do que o que temos?» (subl. meu)
«sim, em democracia sou a favor do monopólio da violência por parte do Estado. A violência não é mais doce por isso. Pode até não ser mais justa por isso. Não será seguramente neutral por isso. E, definitivamente, não deixa de ser violência por isso. Mas ela deixa-me uma saída não-violenta por isso. Porque podemos socorrer-nos de uma coisa inexistente na violência fora do Estado: a denúncia da ilegitimidade de cada acto e a acção política para o combater. Resume-se assim: é mais fácil resistir à violência de Estado do que às restantes. E ela é, apesar de tudo, mais previsível. E isto faz muito mais diferença do que parece».
Daniel Oliveira esclarece que está a falar sempre de «Estado democrático», aquele que para alguns cultores da violência não difere do Estado ditatorial ou totalitário. Alguns que são os primeiros a fugirem para as suas tocas quando a violência tem de ser confrontada. Alguns que se consideram os epígonos (representantes não eleitos, vanguardas…) da «Justiça» e do «Povo». Alguns que adoram o princípio de que «os fins justificam os meios».