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TVI memória

A propósito do grande choque que aparentemente foi para muita gente a nomeação de Pina Moura para a administração da TVI, e do pavor que foi demonstrado pelo 'alinhamento ideológico' que esta opção evidenciaria, vi muito poucos recordar que o mesmo canal foi atribuído, no início dos anos 90, à Igreja Católica. Havia duas frequências para 'leiloar' e o governo em funções, o chefiado pelo primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva, decidiu que os projectos de Francisco Pinto Balsemão e da Igreja Católica Portuguesa deveriam ganhar a corrida. Pelo caminho ficou um projecto cujo protagonista mais visível era Proença de Carvalho, mas que incluia também Paulo Portas e, salvo erro, Miguel Sousa Tavares. A viabilidade da opção Igreja e a consistência do seu projecto ficou patente poucos anos depois, com a transferência do controlo para o grupo Media Capital. Fernando Madrinha, no Expresso, foi dos únicos a lembrar o facto de a TVI ter começado por ser uma televisão de tendência -- mais tendência que aquilo era difícil arranjar. Para concluir: "Não deixa de ser extraordinário ver nas mãos de um grupo espanhol amigo dos socialistas portugueses a concessão de um canal de televisão que o Estado atribuiu... à Igreja Católica. E não menos extraordinário é o facto de tudo isto parecer razoável e absolutamente natural." Não consigo perceber se Fernando Madrinha está a ser irónico ou se acha mesmo que é razoável e natural ou, pelo menos, mais razoável e natural o Estado português atribuir um canal de TV a uma confissão religiosa que um grupo de comunicação, português ou estrangeiro, detentor de um canal, escolher, de acordo com aquilo que são os seus critérios, incluindo os ideológico-políticos, um administrador. Num país em que cada vez que se abre a boca para discutir o papel da Igreja Católica e a lamentável confusão que os responsáveis da coisa pública -- do Estado e das autarquias --, como os da própria Igreja Católica, continuam a fazer entre o que é uma alegada influência maioritária da dita confissão e a posição do Estado e das estruturas públicas face à mesma, tem de se ouvir a inevitável gritaria anti-jacobina e umas tiradas sobre o afonsocostismo, não pode surpreender que ninguém ache surpreendente ou sequer merecedor de espanto que alguém, algum dia, achasse que entregar um canal a uma confissão religiosa era a coisa mais normal do mundo. Mas um bocadinho de vergonha, por favor: por mais que se queira negar a evidência, é um bocadito difícil abrir tanto a boca quando Pina Moura diz que todas as nomeações são (evidentemente!) ideológicas e negar que nenhuma escolha foi algum dia mais ideológica que a de entregar um canal aos bispos. É que, como muito bem frisaram alguns, entre os quais Rodrigo Moita de Deus, o problema não é se se trata de uma escolha ideológica: o problema é se a ideologia em causa nos agrada. Isto dito, é claro que a Sic, nas suas variadas formulações, é uma empresa genericamente pluralista e o facto de Francisco Pinto Balsemão ser do PSD não implica que as suas televisões se alinhem com o PSD. Como o facto de Ricardo Costa, o director da Sic Notícias, ter um irmão no governo não significa que a Sic Notícias beneficie o governo ou só dê notícias simpáticas sobre o irmão do director. Porquê? Porque a Sic é sobretudo -- ou melhor, é completamente -- um projecto profissional de TV, não é um projecto de posicionamento político-ideológico ou um braço armado de uma tendência, embora possa, pontualmente, agir ou ser lida como tal. Se a TVI do Grupo Prisa tenciona ser um projecto profissional de TV ou quer antes transformar-se num mecanismo de conformação ideológica é algo que está por ver. Não é decerto o facto de ter à sua frente um 'socialista capitalista ex-comunista' que permite, à partida, determinar que será uma ou a outra coisa. Ao contrário, entregar um canal à Igreja foi só e apenas uma decisão ideológica, com o propósito absolutamente claro e confesso de criar um mecanismo de influência político-ideológica da sociedade. Pelos vistos, há 15 anos, os que agora gritam de pavor viveram bem com isso. Ou mudaram muito ou não mudaram nada. Que é que acham?

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