a estrada
fui ver o filme no sábado. estive à procura do trailer para colocar aqui mas decidi não o fazer por duas razões: a música estraga tudo e a identificação dos actores estragaria o post.
li o livro há muito, quando saiu, e gostei muito. gosto muito de cormac mccarthy e li praticamente tudo o que escreveu, à excepção do primeiro livro -- the orchard keeper -- porque mo roubaram há anos e só recentemente consegui outro (estava esgotado, segundo me disseram na fnac, onde o encomendei). the road está entre os melhores, mesmo se ao contrário do que sucede com a maioria tem um final relativamente feliz. creio que apesar do seu portentoso talento para a crueldade cormac não teve coragem de deixar o miúdo que é o alter ego do filho só no meio do horror, como costuma fazer com os seus personagens.
a escrita totalmente cinematográfica de cormac, tanto nas descrições como nos diálogos, faz fazer um filme a partir de um livro seu aparentemente fácil. no country for old men foi um bom filme e a estrada também é. mas para quem leu os livros são uma espécie de ilustração -- nada está à altura.
no caso da estrada, 20 valores para viggo mortensen e para a cor e o ambiente e a forma como a acção se desenrola, em permanente perplexidade, resignação e tenacidade (sim, resignação e tenacidade, é possível -- chama-se estoicismo). mas a coisa que mais retenho é o facto de, à excepção de viggo, imediatamente identificável apesar da magreza, alguns actores estarem tão irreconhecíveis que levei minutos a ver robert duvall (na verdade, a suspeitar que era ele -- só tive a certeza no genérico) e guy pearce passou-me completamente ao lado. num mundo em que o que está em causa é conseguir manter alguma coisa de familiar, de comunidade (que é o mesmo que dizer de amor), é justo que tenhamos de fazer um esforço para reconhecer o que conhecemos. que corramos o risco de nos enganarmos completamente -- para um lado ou para outro. não muito diferente afinal esta estrada da nossa: tudo depende de sermos capazes de continuar a ser the good guys e de conseguirmos perceber quem o é. e sobreviver aos enganos.