Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

jugular

a lei que rende injustiça

As medidas anunciadas no novo Orçamento do Estado "para dinamizar o mercado do arrendamento" - um alargamento da possibilidade de desconto, em sede de IRS, do valor das rendas por parte dos inquilinos e a hipótese, para quem efectue obras de reabilitação em imóveis para arrendar ou em casas arrendadas, de isenção de IMI assim como de uma tributação reduzida de IRS - só podem ser vistas como um reconhecimento de que a chamada lei das rendas (o Novo Regime do Arrendamento Urbano, ou NRAU) não serviu para nenhum dos objectivos propalados à época da sua aprovação e entrada em vigor (Setembro de 2006).

 

De facto, como poderia um diploma que zela para que seja praticamente impossível a um senhorio que recebeu décadas de rendas baixíssimas aumentá-las para valores razoáveis e tendentes a ressarci-lo de prejuízos acumulados e que, além disso, obstaculiza ao máximo o fim dos contratos de arrendamento criar qualquer movimento no mercado? Como pode uma lei que caso haja más condições de conservação dos imóveis obriga o proprietário a fazer obras antes de aumentar as rendas (sendo que o valor das obras, ao contrário do das rendas, não foi sujeito a congelamento durante décadas e portanto implicará gastar o que jamais será possível recuperar) incrementar a reabilitação? Quem é que poderá estar interessado em investir para (continuar a ) perder dinheiro?

 

O NRAU não se limita, porém, a prolongar o regime de excepção e privilégio que faz dos inquilinos com arrendamentos anteriores a 1990, independentemente dos seus rendimentos, uma espécie protegida e dos senhorios correspondentes os seus reféns. Chega ao ponto de, no seu delírio de protecção, permitir que os arrendatários por ele abrangidos tenham direito, em situações rigorosamente idênticas de rendimentos do agregado e de valor da renda, a subsídios de renda bastante mais elevados que os previstos no regime geral da Segurança Social (para quem não saiba, é o regime existente para pessoas que efectivamente têm dificuldade em pagar as rendas). No âmbito do NRAU são até elegíveis para subsídio agregados com rendimentos até cinco salários mínimos mensais, ou seja, mais de 2000 euros - basta que o arrendamento esteja em nome de alguém com mais de 65 anos. Que conceito de justiça social justificará isto?

 

Numa altura em que se discutem as rendas "incrivelmente" baixas das casas da Câmara de Lisboa, um diploma com três anos atenta olimpicamente contra o princípio da igualdade. E, já agora, da racionalidade: como pode um Governo dizer que quer incrementar o mercado de arrendamento quando mantém em vigor uma lei que decreta a perseguição e o sacrifício dos senhorios? Não é preciso decerto ser constitucionalista nem sequer jurista para perceber que estamos perante uma aberração jurídica. O NRAU é uma obscenidade em forma de lei, uma lei que rende injustiça. E se nunca é tarde para reconhecer erros, a sua revogação virá sempre tarde de mais.

 

(publicado hoje no dn)

15 comentários

Comentar post

Arquivo

Isabel Moreira

Ana Vidigal
Irene Pimentel
Miguel Vale de Almeida

Rogério da Costa Pereira

Rui Herbon


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Comentários recentes

  • f.

    olá. pode usar o endereço fernandacanciodn@gmail.c...

  • Anónimo

    Cara Fernanda Câncio, boa tarde.Poderia ter a gent...

  • Fazem me rir

    So em Portugal para condenarem um artista por uma ...

  • Anónimo

    Gostava que parasses de ter opinião pública porque...

  • Anónimo

    Inadmissível a mensagem do vídeo. Retrocedeu na hi...

Arquivo

  1. 2019
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2018
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2017
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2016
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2015
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2014
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2013
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2012
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2011
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2010
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2009
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2008
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2007
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D

Links

blogs

media