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jugular

Despachos, Sol, Liberdade de Expressão, Sócrates, Asfixia: posso?

Depois de ter visto on line a publicação de despachos judiciais sobre as escutas de um processo judicial por este jornal, ouvi dizer muita coisa, li alguma coisa, a confusão parece-me enorme e parece-me que eu aumentaria a mesma se enchesse este texto de remissões para o que disse Marcelo Rebelo de Sousa, ou Pedro Lomba, ou Pedro Marques Lopes, ou Daniel Oliveira, ou Pacheco Pereira. Fora o que disseram os Partidos políticos, os Ministros, comentadores que não referi, tanta gente, felizmente,  porque há liberdade de expressão em Portugal.

Talvez esta notícia sirva para resumir um pouco do que se tem dito por aí.

Comecemos pela questão da imparcialidade. Há gente que entende que defender, como eu tenho defendido, que as escutas indirectas a Sócrates são ilegais e, como tal, não deviam jamais ter sido escutadas, ou, feito o mal, deviam ter sido de imediato destruídas, é ser-se "empregado do governo", "socratista", no fundo uma vendida. Esquece, quem assim pensa, que quando eu defendo valores como o respeito pela lei, pela privacidade, pela intimidade de cada um, estou a defender todos nós, esta coisa que se chama a cidade, a democracia, porque acredito que não há liberdade sem lei.

É-me indiferente que amanhã me digam que descobriram uma ilegalidade confessada por um ministro sob tortura, porque no Estado de direito em que eu vivo, as palavras proferidas sob tortura como que não foram proferidas, não valem nada, são nulas. O direito é assim. O que se obtém de forma ilícita não vale, é como se não se tivesse obtido, ou lentamente cai uma liberdade, depois duas, depois três, e por aí fora, e quando um homem perde um direito civil, somos todos nós que o perdemos.

É isso e só isso que me move no que escrevo em defesa da legalidade e dos direitos, liberdades e garantias. Seja Sócrates, seja Manuela Ferreira Leite, seja Pim, Pam, Pum, o Primeiro-Ministro.

Em segundo lugar, aproveita-se este caso para se confirmar uma tese antiga de asfixia democrática. Quem o faz são os do costume. Os que têm colunas de opinião, os que falam nas rádios, os que se fazem ouvir livremente, e bem, na televisão. Às vezes, de resto, caluniando as pessoas. Aqui, mal. Liberdade de expressão? Esses têm-na, e, muitas vezes, tentam condicionar a de quem os contraria, precisamente acusando-os de escravos do poder.

Vivemos num país plural, com televisões privadas, neste momento com mais comentadores contrapoder do que pró-poder, se me permitem a expressão, o mesmo se passando na imprensa escrita. Como se atrevem a usar a liberdade de expressão para pretender que quem os contraria asfixia a dita liberdade? Como se atrevem a usar a liberdade para pretender calar o próximo? Posso continuar a escrever sem estar sob suspeita? Agradecida.

Em terceiro lugar, diz-se por aí que não houve violação do segredo de justiça e que vendo bem as coisas até podia ter havido um inquérito. Já lá vamos à política, mas o processo é o processo face oculta e sendo estes despachos incidentes do mesmo, o processo é o processo, que não transitou em julgado, pelo que as peças processuais não podiam ter sido transcritas por um jornal.

Jornalimo dinamite, diz-nos Pacheco Pereira, elogiando a ilegalidade, e o perigo da coisa, essa de termos acesso a partes de um todo, a peças fora do contexto, eis o parabéns à violação da lei, à derrota dos direitos civis, dos dos outros, não percebendo o intelectual que também são os dele.

Depois há a política. Ninguém diz nada sobre estes despachos. Toda a gente, incluindo os juristas imparciais, tem por natural que magistrados tenham arrastado matéria política meses a fio, fingindo que aquilo enquadrava alguma espécie de crime.  Marcelo Rebelo de Sousa, ou outros, podem, de conciência tranquila, dizer que há ali matéria para crime contra o estado de direito? Claro que não. Sabem que não. Não há nada com relevância criminal naqueles dados. Nada de nada.

Do ponto de vista estritamente jurídico, só havia uma coisa a fazer. Destruir as escutas e arquivar de imeditato aquele incidente. Mas, então, por que é que aqueles magistrados andaram a enrolar-se com tanto palavreado político-jurídico? Porque houve, da parte deles, um comportamento inadmissível. Os magistrados não são políticos. E, já agora, por que é que ninguém, nestas teorias infindáveis sobre conspiração, se pergunta acerca dos vastos conhecimentos do PSD sobre esta matéria? Olhando para trás, para as perguntas feitas no Parlamento, parece-me um partido muito bem informado. Isto, porque se quiseremos ter um debate sério sobre troca de informações e de influências, convém não deixar o maior partido da oposição de fora.

Finalmente, a política pura e dura. O modo como os dados (incompletos) vieram a público através do Sol é de repudiar. Mas o facto é que vieram a público. Já temos pedidos de divulgação integral de escutas pelos próprios. Acho de gargalhada a ideia de sócrates ter tentado fazer o que se diz que tentou fazer. Mas se tentou é grave. E é bom que isso se esclareça. Nomeadamente através de uma comissão de inquérito. Não vejo razão para a impedir.

Tenho pena que não se possa fazer nada quando fica demonstrado que Belém tem uma tramóia montada contra o Governo, como foi o caso há tão pouco tempo.

Nessa altura, a "expressão" dos do costume andou bastante limitada.

7 comentários

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    Isabel Moreira 08.02.2010

    caro josé basílio
    refiro-me entre ioutras coisas, ao silêncio de muita gente. claramente não percebeu o texto da fernanda.
    recoda-se que o mail foi divulgado depois de o "público" ter mentido à opinião pública, ou não?
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    LRa 08.02.2010

    Tal como esta revelação surge depois de Sócrates ter mentido à mesmísima opinião pública ao declarar o seu desconhecimento sobre a tentada compra da TVI. Certo?
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    Isabel Moreira 08.02.2010

    e aquele mail entre privados estava num processo sijeito a segredo de justiça? e estava sujeito à obrigação de ser destruído?
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    Cristiano 08.02.2010

    Portanto basta um email privado, roubado, truncado e publicado pelo jornal "amigo" para se "acreditar" no que o PR fez ou deixou de fazer. Mas se vêm noticias a público que dão nota de suspeitas levantadas por magistrados, para além de se criticar a sua divulgação ilegal (neste ponto concordo consigo, continuo sem perceber como a Isabel pôde defender a publicação do email roubado), acha-se que a história é recambulesca demais para ser verdade e portanto conclui-se que enquanto o referido email roubado descrevia a mais pura das verdades, as suspeitas de magistrados não são mais do que o fruto da imaginação...

     
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    Daniela 09.02.2010

    Então e o silêncio inicial de Cavaco Silva, antes da publicação dessa tal email? E o discurso de Cavaco Silva depois?

    E o facto de NUNCA ter desmentido que estava envolvido? Ele ou Fernando Lima? NUNCA eu ouvi o PR dizer que é tudo mentira. Fernando não disse que o mail era falso! Fernando Lima não foi realmente afastado do cargo - Fernando Lima foi promovido quando a poeira assentou!

    E todos estes pequenos e insignificantes factos não contam, pois não? Claro que não.

    O pior cego é sem dúvida aquele que não quer ver...
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    Cristiano 09.02.2010

    Eu nem sequer estou a discutir a substância por detrás do caso das escutas de Belém. Limitei-me a referir que para esse caso muito boa gente que agora vem bradar aos céus com os meios de obtenção de informações, na altura não se importou nada que o caso ganhasse vida com, volto a repetir, um email com mais de um ano, que foi roubado, truncado e peublicado por outro jornal. Se roubar um email pessoal, pode ter interesse publico face ao seu conteudo, não consigo perceber como é que suspeitas do sistema judicial que chegam (de forma errada) a um jornal não têm ainda mais interesse público.
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