os números 'expressivos' do aborto legal
Este fim de semana, li no semanário Sol uma pequena notícia sobre o número de abortos efectuados sob a vigência da nova lei. 300, dizia a notícia, que considerava o número 'expressivo'. O tamanho do texto não terá permitido ao autor explicitar o carácter desta expressividade. À qual, frisava-se, faltaria juntar os abortos efecuados no privado. Hoje, a Sic abriu o jornal da tarde com um novo número, 'mais de 500' (mais exactamente 526), que incluirá já as intervenções fora do público. Ora recordemos um facto: aquando da discussão sobre o referendo e sobre a nova lei, falou-se repetidamente de uma estimativa, baseada nas médias gerais para abortos em função do número de nascimentos (calcula-se de um modo geral que aqueles corresponderão a cerca de 20% destes), que remetia para 20 mil interrupções de gravidez/ano. Se fizermos as contas, verificaremos que este valor corresponde a cerca de 1666 abortos por mes. Parece pois que longe de 'expressivo', o número de abortos contabilizados desde a entrada em vigor da lei está muito aquém daquele que se esperaria. O que é, naturalmente, normal: ninguém espera que no primeiro mês de aplicação da lei se alcance uma média. Aliás, de acordo com o que ameaçaram alguns dos adversários da lei, deveriamos assistir a um tropel de mulheres no sentido das virtualidades abortivas -- e afinal o que temos é um número muito abaixo daquele que a estimativa, assumida aliás pela Direcção Geral de saúde, prevê. O que me parece muito expressivo é que haja notícias sobre estes números em que não se faz referência à estimativa existente, descontextualizando assim radicalmente a informação.