má informação
Os jornalistas são sistematicamente acusados de preguiça e de fazerem tudo a correr e em cima do joelho (sucede muito); de se copiarem e repetirem uns aos outros - diariamente, é só ver o que as TV e rádios fazem com as notícias dos jornais e o que as edições online fazem com tudo -; de só quererem saber de sound bites e benficas-sportings e títulos ululantes e politiquices e não se interessarem pelo "fundo dos problemas"; de estarem sempre "contra"; de terem "agendas"; de chamarem investigação a receber uns papéis com coisas contra alguém; etc.
Sucede que quem queira fazer a coisa certa - investigar, ir ao tal "fundo dos problemas", perceber o que se passa antes de embarcar no primeiro comboio que aparece, descobrir novos ângulos de abordagem - tem a vida muito dificultada no que respeita à informação dita "oficial" que não tenha sido coligida para comunicado. No tempo em que os ministérios, os institutos, as câmaras, a presidência, tudo e mais um par de botas (menos os tribunais) têm sites, "gabinetes de comunicação", assessores de imprensa e imagem e todo um exército de gente paga pelo erário público para disponibilizar informação e responder a perguntas, obter "dados" sobre seja o que for, é, como há 20 anos, um martírio.
Assessores de imprensa que nunca têm tempo para atender o telefone ou que quando o atendem é para dizer "mande-me um mail"; que chegam a levar meses (tenho um caso recente) a responder a perguntas e mesmo assim só parcialmente ou nada; que escolhem a quem dar uma informação que lhes foi solicitada por vários meios, sem que haja um critério mínimo de equidade (sendo a ordem de chegada o único aceitável); uma atitude geral de saloiice (é regra ligar-se para um assessor e atender alguém a explicar que "o doutor" não está) e não raro de arrogância e até má educação. Tudo isto, que é tanto mais encanitante quando a maioria dos assessores já foram jornalistas (e em muitos casos voltarão a sê-lo), e contrasta com a disponibilidade e profissionalismo tantas vezes encontrados em gabinetes de imprensa de outros países ocidentais (que se dão ao trabalho de ligar para um telemóvel português para responder a um pedido de informação), ultrapassa a mera incompetência.
A ideia da informação que tem e só pode ter carácter público como propriedade privada das instituições e de gente contratada para a coligir, tratar e divulgar, a ideia dos "segredinhos" e dos "favores" a "jornalistas amigos", a ocultação e o tráfico do que é de todos, é coisa de terceiro mundo. E, sobretudo, favorece manipulações e distorções. Quem delas se queixa, e tantas vezes com razão, deveria pensar a que ponto a atitude geral dos governos na gestão da informação se repercute e o quanto, se a democracia depende em muito do jornalismo que se faz, o jornalismo depende da democracia que se pratica.