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Nem só de treinadores de bancada é feita a nação. O caso “Quinta da Fonte” deu para perceber que temos também urbanistas da Lego e “ciganológos” de café. Sem pretender branquear os balázios nem desconsiderar a bazófia que se lhes seguiu, há apenas uma conclusão a tirar deste debate moribundo: os partidários da tese de que o assistencialismo do Estado desresponsabiliza e perpetua a preguiça fazem regra de excepções de grande efeito mediático e comparam a realidade com uma idealização indefinida, quando a comparação deveria ser feita com uma ausência concreta, isto é, com o bairro de lata e as habitações clandestinas. Este exercício não restaura de imediato o conceito de bairro social, nem nos impede de o repensar. Acabo de ler a Carta de Atenas, um manifesto de arquitectos de 1933, imbuído de uma datada diabolização da iniciativa privada, mas com críticas ainda pertinentes e soluções entretanto materializadas no bairro onde cresci, os Olivais Sul. Construído a partir dos anos 60, com prédios isolados para aumentar a exposição solar, vastos espaços verdes e separação das vias pedonais do tráfego automóvel, muitos anos depois é apaziguador lá voltar, algo que interpretava como sinal de uma infância vivida na rua e entre muitos amigos vizinhos, até ao momento em que dei comigo a pensar se a “finalidade social” do bairro não terá ajudado também na construção desta memória feliz. Os Olivais foram habitados por gente humilde, jovens famílias da classe média e corporações diversas que por vezes tomavam conta de um prédio inteiro.
Para se ter uma ideia, o prédio dos militares estava à distância de um tiro de pressão de ar do prédio dos magistrados (é factual, visávamos as chaminés), vizinho do prédio da malta que nos roubava as bolas de futebol, de onde se avistava o prédio dos polícias. Fui assaltado, testemunhei assaltos, estive refém de ponta-e-mola, contornava a zona onde do tráfico de droga, frequentei escolas que concentravam assimetrias sociais, visitei salas de estar com napperons, muitos anos antes de lá ter voltado pela caneta de Lobo Antunes, custou a perceber o que levava um colega a fazer dos seus Adidas Nastase preciosidades. Não digo que a ameça de uma ponta-e-mola forje carácter, que a visão de napperons sobre o televisor faça de um Le Pen em potência um humanista túrgido de consciência social, ou que as assimetrias actuais não sejam mais difíceis de gerir do que as dos anos 70. Nem sei sequer se quem nos roubava foi contagiado pelos nossos valores pequeno-burgueses. Sugiro apenas que o bairro teria sido menos enriquecedor se fôssemos todos iguais. O gueto cristaliza as diferenças relativamente aos que estão fora e homogeneíza os que estão dentro. Isto não justifica que o Estado impeça o mercado de criar guetos de ricos, mas é razão suficiente para contrariar a tendência do mercado para formar guetos de pobres. Eis, pois, um argumento que até os liberais aceitam: se o bairro social é para funcionar como um gueto de pobres, então o Estado está a substituir-se ao mercado – e isto, como se sabe, é um sacrilégio. Que se faça do bairro social outra coisa, então. Uns novos olivais. Com um dia de atraso (já terão reparado que republico aqui as crónicas do Vasco no Metro às segundas) aqui fica a crónica de ontem.
Soube da história aqui e voltei a lê-la hoje de manhã no DN Online. A crença da sodomização do tareco e o acting out comportamental que essa convicção determinou não é, naturalmente, defensável. Em todo o caso, por provável deformação profissional, posso sempre colocar a hipótese diagnóstica que tal alteração do pensamento – ideia delirante – está na base das alterações comportamentais referidas – heteroagressividade e bizarrias comportamentais durante o julgamento – e integrar esta sintomatologia numa provável perturbação psicótica. Estupefacta fiquei, contudo, com as declarações que os orgãos de informação atribuem ao juiz – não me refiro à setença propriamente dita, entenda-se. Os sublinhados são meus. Sobre o arguido diz o senhor doutor ter sido a sua «postura durante o julgamento “profundamente desconcertante” e com um “comportamento homofóbico”». «Dar um tiro em alguém por ser homossexual e por supostamente ter tido relações sexuais com um gato que ajudou a resgatar, e por isso o animal ter ficado paneleiro, é talvez o motivo mais torpe que eu já vi na minha vida”, frisou o magistrado». «Esse motivo é revelador “de uma insensibilidade atroz pela pessoa humana”, referiu João Amaral lembrando o caso do transexual Gisberta que morreu às mãos de jovens menores e comparando o comportamento destas com o do arguido». Isto, sim, é para mim verdadeiramente incompreensível e desconcertante. Ps1: Só uma picuinhice, ou talvez não, senhores jornalistas: “da” Gisberta. Ps2: Já agora uma outra (verdadeira) picuinhice: “destes” (jovens) e não destas. Adenda: Sobre o mesmo assunto, aqui fica o link enviado pelo Jaime Roriz.
"Pó grande João Galamba", como diz o outro, porque és liiiindo.
In: Expresso, "Carta da Semana", 26 de Julho de 2008
O Dr. Paulo Paulo Portas, sempre disponível para defender a honra e o bom nome (de parte) dos portugueses, veio exigir uma investigação sobre o funcionamento do Rendimento Social de Inserção (RSI). Acho muito bem. Só não percebo a necessidade da tal 'investigação', uma vez que ele parece já saber que o país de divide entre quem trabalha e uma cambada de parasitas preguiçosos que vive do RSI e das benesses do Estado. Para quê investigar, se a análise já é conhecida?
Desta vez no Expresso, por Henrique "Bonifácio" Raposo "No sábado passado, vi e ouvi um debochado a cantar o apocalipse judaico-cristão. Ao criar uma atmosfera teológica com três madames de cabaré ao seu lado, Leonard Cohen oferece uma mistura única. A fusão entre o sublime e o deboche transforma Cohen num deus pagão contaminado pela ética monoteista. E esta tensão é deliciosa: sabe tão bem gritar um 'Halleluiah' e sussurar um «anal sex» no mesmo concerto."
Esta e esta. Entre Janeiro e Julho morreram, por mês, 4 mulheres vítimas de violência doméstica em Portugal.
Segundo o Expresso desta semana, no ano parlamento de 2007-2008 o deputado Manuel Maria Carrilho Carrilho não fez uma única intervenção na assembleia, não teve uma única iniciativa, um único requerimento, um único relatório. Em resumo, a ter feito alguma coisa foi figura de corpo presente. Recordo que na sua fase como autarca, que terminou em Janeiro de 2007, Carrilho não primou pela assiduidade na câmara. Esta preguiça autárquica e parlamentar de Carrilho seria quase estimável, pela coerência, caso o deputado não tivesse justificado a desistência da actividade de autarca com os trabalhos no Parlamento. É possível que Carrilho tenha passado este ano a escrever antecipadamente o livro em que explica por que motivos nesse mesmo ano foi um deputado sem actividade - e ninguém duvida que ele contornaria a circularidade do argumento com brilhantismo. A causa última, porém, é mais complexa. Apoiei este homem na campanha para câmara de Lisboa porque me parecia que acoplar a vaidade de Carrilho à cidade seria bom para os lisboetas. Perdida essa batalha, o ex-ministro da cultura nunca mais recuperou e a minha tese vinga: a vaidade de Carrilho é uma força poderosíssima. O problema é que a vaidade tanto incita à produção como condena à prostração, tudo depende do contexto. Mas também aqui se vê como Portugal esbanja os seus recursos naturais. Ao desaproveitar a imensa vaidade de Carrilho, dando-lhe tarefas que ele tem por menores, já não se corre o risco de lhe pagar uma pensão vitalícia, mas ainda se vai pagando um ordenado inútil. Não é caso único, mas uns irritam mais do que outros. Para quando a redução do número de deputados?
Rogério da Costa Pereira
Rui Herbon
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Cara Fernanda Câncio, boa tarde.Poderia ter a gent...
So em Portugal para condenarem um artista por uma ...
Gostava que parasses de ter opinião pública porque...
Inadmissível a mensagem do vídeo. Retrocedeu na hi...