"Quem quiser conhecer a verdade, repito a verdade, insisto a verdade, sobre o diz e faz o Presidente da República, basta ir à página da internet da Presidência da República. Lá está a verdade"
Cavaco Silva
Ao contrário de todos os que intervêm na esfera pública, Cavaco acha que tem o direito de só comunicar directamente com o Povo, sem mediação. É sem dúvida um político singular. Ou melhor: pensa que é. Está enganado
Esta é uma medida de transparência. Como é usual, gera contestação, alguns uivos, como o de querem saber dos nossos nomes, dos nossos rendimentos, diz que é inconstitucional, parece que tinha de ser por lei, pelo meio fica sempre a impressão de que ninguém sossega um minuto para ler o que que está em causa e ver o lado bom de uma alteração legislativa, sim, o lado bom, esse que é de fazer dos demónios de tantos dos nossos textos - a administração fiscal e a banca - mundos menos ocultos, ou, melhor dizendo, caminhos que se cruzem com a tal transparência, podendo a primeira saber da segunda.
O que está em causa diz apenas respeito aos rendimentos tributados, ao cumprimento de um dever declarativo, pelo que as instituições financeiras só transmitem à administração fiscal os juros efectivamente pagos pelos sujeitos passivos. Não há, assim, identificação das nossas contas, dos rendimentos que estão nas nossas contas, não há essa devassa ameaçadora. Não se quebra, pois, o sigilo bancário. Calma, pois. Há, sim, maior transparência, essa palavra que nos vem faltando.
Será que era necessário um decreto-lei autorizado? Talvez, por causa da alínea i) do artigo 165º da CRP. Ou um diploma daquele tipo ou uma lei. Mas a questão da constitucionaldade orgânica é a menos importante. Se se chegar à conclusão de que o simples cumprimento de um dever declarativo está presente na ratio deste preceito constitucional, pois faça-se o diploma na AR. Qual é o drama? Mais importante é entender o diploma do ponto de vista material. Ele é bom.
Why the wrong turn in policy? The hard-liners often invoke the troubles facing Greece and other nations around the edges of Europe to justify their actions. And it’s true that bond investors have turned on governments with intractable deficits. But there is no evidence that short-run fiscal austerity in the face of a depressed economy reassures investors. On the contrary: Greece has agreed to harsh austerity, only to find its risk spreads growing ever wider; Ireland has imposed savage cuts in public spending, only to be treated by the markets as a worse risk than Spain, which has been far more reluctant to take the hard-liners’ medicine.
It’s almost as if the financial markets understand what policy makers seemingly don’t: that while long-term fiscal responsibility is important, slashing spending in the midst of a depression, which deepens that depression and paves the way for deflation, is actually self-defeating.
So I don’t think this is really about Greece, or indeed about any realistic appreciation of the tradeoffs between deficits and jobs. It is, instead, the victory of an orthodoxy that has little to do with rational analysis, whose main tenet is that imposing suffering on other people is how you show leadership in tough times.
And who will pay the price for this triumph of orthodoxy? The answer is, tens of millions of unemployed workers, many of whom will go jobless for years, and some of whom will never work again.
Nota: Num artigo publicado na semana passada, Wolfgang Schäuble dizia que a austeridade era necessária para recuperar a confiança dos investidores. O que o Ministro das Finanças alemão não percebe é que, com o sector privado fortemente endividado e com a procura deprimida, a falta de confiança dos investidores não se deve a défices públicos elevados. Obrigar o Estado a poupar, quando o sector privado está a fazer exactamente o mesmo, só pode ter um resultado: recessão ou - pior - o colapso daquele sector privado que Schäuble imagina estar a estimular.
In an exceedingly rare personal message and rebuke of a sovereign country, the pontiff also stressed the church's "autonomy" to conduct its own investigations and criticized the "lamentable methods" of Belgian police (...) On several occasions I have personally reiterated that such serious issues should be attended to by both civil and canon law, with respect for their reciprocal specificity and autonomy," Benedict said in a statement circulated by the Vatican on Sunday.
Para além desta extraordinária revelação de que Bento XVI considera que a Igreja deve ter jurisdição sobre os crimes de abuso sexual de menores cometidos po membros da Igreja, é preciso ter muita falta de vergonha na cara para se atrever sequer a falar na forma como a ICAR tem tratado este assunto, na Bélgica como no resto do mundo.
De facto, como nos diz a AFP, as autoridades belgas agiram por frustração crescente com a Igreja que, segundo um acordo assinado nos anos 90, deveria ter encaminhado para a justiça os casos de que tivesse conhecimento. A Igreja nunca enviou um único caso aos procuradores pelo que as pomposas declarações de Bento XVI de que a ICAR deveria ter autonomia para investigar o que são assuntos de polícia não passam de estertores de uma igreja que «olha para o passado, para um poder que está a apodrecer».
Lá veio mais uma. Há pouco mais de uma hora, na RTP (foi? não tenho a certeza), e novamente acerca da chegada da selecção à Cidade do Cabo (que mereceu ligação em directo e tudo, emocionante, emocionante, comovente, ver um autocarro a chegar e uns tipos a saírem de lá, dois dias antes de um jogo, quase chorei). Lá veio a bambochata do costume do Cabo das Tormentas baptizado depois de Cabo da Boa Esperança, mas desta vez esmeraram-se: a jornalista de serviço filmou e deixou-se filmar no dito, relembrando a história batidíssima do Bartolomeu Dias, mas decidiu embelezar o retrato com um pormenor que, digo sem ironia, nunca pensei ouvir da boca de alguém com mais de 8 ou 9 anos, a de que o dito navegador terá visto o Adamastor no rochedo (algo como "parece-nos hoje impossível imaginar que B. Dias tenha confundido este rochedo com a figura do Adamastor, mas é o que na verdade aconteceu"). Fosse eu director de informação, ainda por cima da televisão pública, e oferecia já do meu bolso (porque já é suficiente carregar os contribuintes com atestados de ignorância) à dita senhora que se reclama de tal epíteto um briefing elementar de História e, sobretudo, um curso intensivo de literatura camoniana, ramo epopeia, especialidade Lusíadas. A ela e a quem visiona, edita, prepara, dirige, emite e é responsável por tais disparates.
Vou contar um episódio familiar passado vai para oito anos, em S. Pedro do Sul, no Andanças - para reavivar a memória, antes de continuar, uma figura tirada daqui:
Depois do jantar, na volta para casa, um carro com três crianças de 11, 8 e 6 anos e duas adultas - a mãe de duas e tia de uma e a mãe de uma e tia de duas. Dentro da viatura estavam meia dúzia de preservativos que a Abraço tinha andado a distribuir nesse dia no recinto do festival. Perante as perguntas do rapaz, o mais novo dos petizes, responde-se naturalmente, retirando o preservativo do invólucro. No final da explicação, ouvida atentamente e em silêncio (coisa difícil de conseguir com aqueles três juntos, para mais dentro de um carro), ele pergunta "e essa coisa aí na ponta, assim pequena, mais fininha, é para quê?". Responde a rapariga mais nova "então, é para guardar o esperma, assim para ele não sair". O rapaz, entre o incrédulo e o admirado, comenta "é tão pequeno, cabe tão pouco", ao que a miúda retorquiu enfadada "quê, pensavas que era uma litrada, não!?".
Não se apoquente, Filipe, ninguém vai enganar a sua rapariga com um pirilau de esferovite, até porque, aposto, ela não cairia no logro (um destes dias conto-lhe o episódio do canal Vivir, passado no mesmo festival e com os mesmos personagens). Quiçá a próxima geração de psis tenha menos cabeças baralhadas à conta de uma sexualidade merdosa, sofrida e disfuncional. É também esse o propósito de uma real educação para a saúde, com a participação activa dos progenitores.
A entrevista de Miguel Sousa Tavares ao bispo que disse «proibir o preservativo é consentir em muitas mortes» já tem uns meses e algumas inconsistências mas esta do i é de ontem e é francamente recomendável. É pena, usando as próprias palavras de Januário Torgal Ferreira, «uma andorinha não fazer a Primavera»...
Afirmei, aquando do último debate a propósito despenalização da IVG até às 10 semanas, nas circunstâncias referidas na pergunta objecto de referendo, que era a favor da mesma. Era e continuo, convictamente, a sê-lo. Não vale a pena renovar o debate.
É para mim claro que todos os argumentos que se centram exclusivamente na liberdade da mulher ou exclusivamente na vida humana estão errados. É, também, para mim, evidente, que se trata de uma questão que encontra uma resposta equilibrada, do ponto de vista constitucional, que tem que ver com os graus dos deveres de protecção do Estado da vida humana, cuja ponderação obrigam-no a recuar e a dar espaço à própria mulher, até a um certo momento, que se tem por razoável, aquele momento que corresponde ao período que reflecte, em larga maioria, o problema social detectado, por um lado, e em que ainda é admissível o tal recuo do Estado, em face do tempo - dez semanas - que o momento representa. Isto tem como único argumento contrário situado no terreno da incomunicabilidade (e respeitável) o de fé.
A posição que defendo está reflectida no Acórdão do TC cujo importante excerto reproduzi aqui.
Foi, pois, finalmente, acrescentada esta alteração ao Código Penal, que significou uma vitória suada para as mulheres, as quais, por razões que não cabem numa lista de alíneas de um preceito legal, que não podem estar sujeitas a escrutínios de grupos de sábios variáveis de norte a sul do país a decidirem da bondade das suas angústias, passaram a participar neste momento inicial da gravidez - a fixação do momento inicial põe um limite ao monopólio da decisão sobre os deveres de protecção por parte da mulher, pois esta não pode ser donadaquela para todo o sempre, naturalmente -, de mote próprio, naquilo que é o dever de protecção da vida intra-uterina, através da sua até então desprezada e hiper-qualificada habilitação para a decisão.
Já existiam, é certo, outras situações de não punibilidade da IVG, as quais, para uma certa direita, por exemplo, durante o debate referido mais acima, estavam todas muito bem. Também as acho muito bem. Lendo o artigo 142º do Código Penal, acho muito bem tudo o que lá está, mas tenho algumas dúvidas quanto à interpretação que seja dada à possibilidade de pôr fim a uma gravidez quando "houver seguros motivos para prever que o nascituro virá a sofrer de grave doença ou malformação congénita, e se for realizado nas primeiras 24 semanas de gravidez, excepcionando-se os casos de fetos inviáveis, caso em que a interrupção poderá ser realizada a todo o tempo" (alínea c) do nº 1 do artigo 142º do CP. As minhas dúvidas adensam-se, perante a calma de quem foi ferozmente contra a IVG até às 10 semanas mas sempre dizendo que "a lei tal como está é equilibrada" (portanto esta alínea também), quando vou sabendo da discricionariedade com que esta previsão legal é aplicada ou sugerida à mãe ou aos pais em cada caso. Como a norma claramente isola a situação de feto inviável, o que significa exactamente grave doença ou malformação congénita? Não ter um dos membros, como um pé, ou um braço, parece-vos suficiente, para abortar um feto de seis meses? Estou só a lançar a discussão, mas se a estou a lançar é porque cada vez sei de mais casos que, a haver inferno, devem estar a fazer rasgar sorrisos a Hitler.
Vem também isto a propósito da legislação muito avançada em termos de prazo para uma IVG, quer no Reino Unido, quer em alguns Estados dos EUA. Precisamente a esse propósito, o que se questiona nas recentes notícias de um debate sempre em aberto, não é a razoabilidade da permissão de uma IVG em fase tão tardia como as 24 semanas em situações que não de limite (risco para a vida da mãe; para a sua saúde; inviabilidade do feto; etc), mas se o feto, de acordo com uns inevitáveis estudos, sente ou não sente dor.
Essa perspectiva, na minha opinião, é insuportável a todos os níveis: éticos, filosóficos, constitucionais, científicos e, pura e simplesmente, humanos. O feto não sente dor? Tem seis meses? Aborta-se. É esse o sentido que, para o debate, se pretende retirar destes estudos. E se não sentisse dor aos nove meses? Que raio de critério das cavernas é este? Insuportável.
Nota: (corrigido. Dizia-se "é esse o sentido desses estudos" e passa-se a dizer "é esse o sentido que para o debate se pretende retirar destes estudos". não tinha expressado claramente o meu pensamento)