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Joaquim , deixou um comentário ao post banho de vergonha às 16:12, 2013-11-23.
Comentário:
Ó Cancio qual é a parte que não percebes de que quem tem as armas tem o poder, que o contrato social se trata de uma mera concessão do poder violento, que a democracia só é tolerada se o poder das armas assim o considerar. O sistemático rancor, antipatia e insídia que exalas contra os policias tem natureza patológica e por isso remeto-te para aqueles que tratam desse assunto. Os policias e os militares não são iguais à canalha, quando se manifestam, estamos perante um golpe de estado, o que tens que agradecer ó vistas curtas, é que foi um golpe de estado sem banho de sangue. Achas por acaso que irias ver policias contra policias para gáudio e manifestações de suor dos anarcolgb e afins. Ganha juízo, comparar uma manifestação de policias com as da canalha. Mas em certa medida tens desculpa, é que a houve uma tendência desde guterres em domesticar e equiparar à canalha aqueles que por maioria de razão, tem de ser brutos, porcos e maus, para permitir que tu escrevas as porcarias que escreves sem correres o risco de levares umas valentes lambadas.
Olá f.,
Pinto, deixou um comentário ao post banho de vergonha às 21:45, 2013-11-23.
Comentário:
(...) O que vi antes de ontem foi um exercício de cidadania ímpar em Portugal. Foi a manifestação com maior sucesso - do ponto de vista cívico - alguma vez realizada no nosso país. Não houve "carga" nem havia legitimidade para tal.
Pinto, deixou um comentário ao comentário banho de vergonha às 15:02, 2013-11-25.
Comentário:
(...) O facto do director nacional ter dito que tratando-se de manifestantes pertencetes às forças e serviços de segurança incrementava o risco de haver armas e por isso de haver um banho de sangue não é propriamente o mesmo que dizer que foram vistas armas. A passagem de um cordão policial, no âmbito de uma manifestação, por pressão, sem violência, nesse mesmo cordão, não consubstancia qualquer crime. Aliás, desafio-a a apontar uma, uma única manifestação, em que tenha havido carga policial sem que previamente não tenha havido arremesso de garrafas e pedras, polícias feridos, etc [por exemplo esta].
O cordão policial serve para impedir a invasão da AR. Ultrapassar esse cordão sem recurso à violência e no exercício de uma manifestação é o quê? Desobediência a uma ordem policial? (...) Não gostei particularmente de ver (embora não seja proibido) manifestantes de cara tapada. Se de facto eram membros das forças de segurança (há quem diga que eram membros da extrema-direita francesa; não sei) é censurável. Não gostei de ver o comportamento e postura dos "gauleses" (grupo mais afoito de guardas prisionais da Carregueira) que, alegadamente, insultavam os seus colegas (da PSP) que faziam a segurança. Mas convenhamos: em nenhuma manifestação a políca carrega ou sequer detém um manifestante por injúrias por ele ter dito "filhos da puta". Pelo menos não tenho memória de uma situação dessas.
Olá f.,
Pedro Esteves, deixou um comentário ao post banho de vergonha às 17:14, 2013-11-25.
Comentário:
Mas por acaso este sr. f., fez a devida interpretação da Lei? Por alguma ventura o art. 8º se dirige a Órgãos de Polícia Criminal? Para que saiba, os OPC (polícias) têm direito ao uso e porte de arma, assim como têm o direito à manifestação... Esse art.º8 (nem qualquer outro artigo de Lei ou Decreto), não pode nunca abster seja que direito for a que cidadão for. Mais: uma arma de defesa legalmente obtida e na posse do seu legitimo proprietário, devidamente acondicionada não pode nunca ser retirada ao mesmo por parte de um promotor de uma manifestação que, por acaso até pode nem ser agente de polícia! Sr. f, leia um pouco mais, interprete convenientemente, antes de dizer disparates.
Olá f.,
Pinto, deixou um comentário ao comentário banho de vergonha às 18:04, 2013-11-25.
Comentário:
Destruição? Qual destruição? Houve alguma destruição? Se a pretensão fosse entrar na AR, e uma vez que estavam pessoas lá dentro (que parecendo-lhe que não, são mais importantes que os bens patrimoniais), havia legitimidade para interromper o exercício de manifestação através de carga policial. Assim não houve. O mais engraçado é que à hora que ocorria um civilizado exercício de manifestação em frente à AR, na Aula Magna cometiam-se crimes graves contra o Estado. Porém parece que se queira passar uma borracha por cima disso e focar as atenções a uma manifestação ordeira.
(negritos meus)
Quando irá a justiça nacional adaptar-se às novas realidades sociais e familiares? Já vai tarde.
Há 20 anos foi assim:
João Miguel Tavares respondeu ao meu post. A propósito, umas breves notas:
1. Sobre os €28 mil milhões do ajustamento irlandês referidos no artigo do FT, está esclarecido o lapso cometido. Longe de se tratar do valor total do corte na despesa, é o montante global que ascenderá o pacote de medidas que reduzem a despesa e aumentam a receita entre meados de 2008 e fim de 2013. Como é lógico, isto faz uma enorme diferença.
2. João Miguel Tavares considera a austeridade irlandesa mais "inteligente" porque cortou fortemente na despesa. Continuo a achar a dicotomia "corte na despesa = bom / aumento de impostos = mau" perigosamente redutora. A avaliação que fazemos da composição do ajustamento depende de inúmeras questões: para além daquelas de cariz normativo e ideológico, sobressaem as que dizem respeito às consequências económicas e sociais das escolhas de política orçamental - em particular, do valor dos multiplicadores que os cortes de despesa e o aumento de impostos assumem em economias tão diferentes como são a portuguesa e a irlandesa (esta, por depender menos da procura interna, sobrevive melhor a choques de austeridade), que serão muito provavelmente bem diferentes. Aquilo que, mesmo sob um certo prisma favorável à austeridade, pode parecer "inteligente" numa economia pode ser particularmente "estúpido" noutra.
3. Na questão sobre se a Irlanda começou - de forma “inteligente” - a cortar na despesa, as coisas são um pouco mais complicadas do que João Miguel Tavares menciona. O gráfico seguinte, retirado do relatório do FMI relativo à 11ª avaliação do programa irlandês, mostra como as medidas se distribuem entre o lado da despesa e da receita entre 2008 e 2013.
Embora as primeiras medidas – do lado da despesa – tenham sido tomadas (na segunda metade) de 2008, o ajustamento arranca verdadeiramente em 2009. Começou pelo corte na despesa? Não. A primeira decisão do governo irlandês foi, no orçamento de 2009 (apresentado em outubro de 2008), a de aumentar quase todos os impostos sem praticamente tocar na despesa (imagem retirada deste documento).
Porém, o sério agravamento da economia nos meses seguintes obrigou o governo a mais dois pacotes de medidas separados apenas por dois meses. No primeiro, em fevereiro (o 'The Financial Emergency Measures in the Public Interest Act 2009'), o governo avançou com um conjunto de medidas no valor de €2 mil milhões - agora bem mais assentes na redução de despesa. É neste momento em que é feita a primeira redução no salário dos funcionários públicos (através da Pension-related deduction from the remuneration of public servants). Dois meses depois, em abril, apresentou um orçamento retificativo para 2009, onde reforçou as medidas de consolidação - com as medidas de lado da receita a valerem mais do que as que visavam a redução de despesa (ver imagem retirada deste documento).
Foi preciso chegar a 2010, depois de quatro rondas de medidas (verão/2008; outubro/2008; fevereiro/2009; e abril/2009), para o governo preparar um orçamento quase só assente na redução de despesa - e mesmo assim os salários só valem €1000 milhões dos €4000 milhões de consolidação. No discurso de apresentação do orçamento, o Ministro das Finanças diz que “we have reached the limit” [do aumento de impostos]. Ou seja: até este momento, a estratégia do governo irlandês parece ter sido a de, à medida que se sucediam as rondas de austeridade, ir reduzindo despesa e aumentando impostos. Não encontro aqui nenhuma prediposição nem estratégia para dar prioridade a um ajustamento concentrado na redução de despesa.
Curiosamente, no parágrafo seguinte sobre o "limite" do aumento de impostos, Brian Lehinan anuncia uma reforma do imposto sobre o rendimento para o ano de 2011, com o objetivo de alargar a base fiscal e, ao mesmo tempo, reforçar a progressividade.
Conclusão: em 2009, o corte na despesa teve a mesma dimensão que o aumento de receita; em 2010, a consolidação foi efetivamente maior do lado da receita – mas nos dois anos convém ter em conta que uma parte importante da redução de despesa é redução de despesa de capital. Assim, na redução de despesa, 2/3 terá sido despesa corrente e 1/3 redução de despesa de capital (a Irlanda era em 2008, curiosamente para um "modelo liberal", o país do zona euro com mais investimento público em % do PIB, com um valor que era o dobro da média europeia: 5,3% vs. 2,6%; em 2013 este valor foi cortado para 1,8% do PIB, inferior à média da zona euro de 2,1%). Resumindo, nas minhas contas de guardanapo a partir dos diferentes orçamentos, o corte na despesa corrente deverá valer perto de 40% dos €28 mil milhões de ajustamento, com o peso do corte de salários e pensões a representar cerca de 20% no total das medidas de consolidação na Irlanda. Ora, entre 2011 e 2013, o peso dos cortes de salários e pensões nos €24 mil milhões em Portugal não me parece andar longe disto. A diferença entre os dois países estará sobretudo no facto de a Irlanda ter comprimido brutalmente o investimento público, enquanto que Portugal aumentou a carga fiscal, sobretudo o IRS (que sempre garante alguma progressividade no esforço).
Sublinho, porém, aquela que me parece ser a ideia fundamental: mais do que a composição do ajustamento, a diferença essencial entre o que se passou em Portugal e na Irlanda é que se retiraram €24 mil milhões a uma economia mais dependente da procura interna em apenas 3 anos e €28 mil milhões a uma economia mais aberta ao exterior ao longo de 5 anos e meio. Sobretudo, no decurso do PAEF irlandês não se duplicou a austeridade: o plano inicial de redução de despesa/aumento de impostos foi razoavelmente seguido e ninguém foi "além da troika".
4. João Miguel Tavares pergunta sobre o impacto dos apoios ao sistema financeiro nos défices orçamentais em Portugal. Há uns meses, a Comissão Europeia fez precisamente essas contas nesta publicação. Os dois gráficos seguintes, dela retirados, mostram o impacto orçamental entre 2008 e 2011, primeiro, e o impacto em 2012, depois:
Assim, ao contrário do que tipicamente se pensa quando se evoca o BPN, BPP, etc., vemos que a recapitalização da banca pesou relativamente pouco nos défices dos últimos anos em Portugal. 2010 foi o ano mais penalizado: o défice ficou nos 8,5% em vez dos 9,8% se descontarmos o apoio à banca. Em 2011 e 2012 (bem como acontecerá em 2013, com a recapitalizaçao do BANIF), o défice foi penalizado em cerca de meio ponto percentual do PIB.
5. Na medida em que uma das questões do artigo original de João Miguel Tavares era sobre se a Irlanda se tinha sabido "defender" melhor perante as instituições internacionais, vale a pena lembrar o que aconteceu no início de 2013, que foi, na prática, uma reestruturação da sua dívida pública.
Em fevereiro passado, o Governo conseguiu uma troca de dívida que consistiu na substituição das notas promissórias emitidas (num total de €25 mil milhões) em 2010 para recapitalizar dois bancos e que eram detidas pelo Banco Central irlandês por uma emissão de títulos de longo prazo com maturidade média de 34-35 anos. Esta notícia resume o impacto nas finanças irlandesas:
Como escrevia o FMI no relatório relativo à 9.ª avaliação do PAEF irlandês (pág.5): "Ao reduzir as necessidades de financiamento na próxima década em cerca de 1,3% do PIB por ano, esta transação ajudará o regresso da Irlanda ao financiamento de mercado". Ao mesmo tempo, permite que o orçamento poupe, pelo menos até 2018, €1000 milhões/ano (ver gráfico retirado do mesmo relatório, pág.13).
Poucos se lembrarão hoje desta reestruturação da dívida irlandesa. Só para comparar, €1000 milhões foi quanto valeu o corte de salários dos funcionários públicos irlandeses em 2010.
6. A ideia de que os irlandeses cortaram valentemente na despesa é a explicação muitas vezes implícita para o caso de “sucesso” em que a Irlanda se transformou, agora confirmado na decisão de o país ter optado por um “corajoso” regresso aos mercados sem o apoio de um programa cautelar (esta continua a parecer-me uma historia mal contada, mas isso é tema para outra conversa).
Antes disto, o "sucesso" era medido pelo regresso ao crescimento económico desde 2011. Já sabemos que o PIB é um mau indicador para avaliar a riqueza irlandesa, e que o Produto Nacional Bruto (PNB) é mais rigoroso, por expurgar o efeito de repatriação dos lucros das multinacionais (responsável pelo conhecido por efeito soufflé que insufla o PIB; em finais dos anos 80, o PNB irlandês valia 97% do PIB, enquanto que no início dos anos 2000 valia apenas cerca de 80%).
Se o PIB cresceu 2,2% em 2011, estagnou nos dois anos seguintes: variou 0,2% em 2012 e estima-se que cresça apenas 0,3% em 2013. Por isso, como o gráfico seguinte mostra, embora ainda muito abaixo do valor de 2008, o PIB (real) estará no fim de 2013 acima do valor de 2009.
O que aconteceu ao PNB? Em 2014 estará, segundo as estimativas, ainda €3 mil milhões (2%) abaixo do valor de 2009.
A divergência entre o PIB e o PNB não é tão ampla em Portugal (o rácio entre o PNB e o PIB é cerca de 0,95), mas se fizermos o mesmo exercício vemos que se estima para 2014 que a pequena subida do PIB não seja acompanhada pelo PNB, que continuará a cair.
Esperemos que, no caso de Portugal, a “retoma” seja mais robusta e evidente que a irlandesa. Se o caso irlandês é um “sucesso”, significa que nos congratulamos com uma situação de prolongada estagnação.
Diz-se que o imperador romano Sétimo Severo terá dado o seguinte conselho aos filhos, no seu leito de morte: "enriqueçam a soldadesca e marimbem-se no resto". A adaptação ao Portugal de 2013, pós-21 de novembro, poderia ser a seguinte: "não brinquem com a bófia". Um aviso que, como em quase tudo o resto, este governo invulgarmente perspicaz só parece ter percebido tarde demais e da forma desastrada que se conhece, com um ministro a fazer um comunicado mais de 24 horas depois dos eventos, e a anunciar aquela trapalhada que se sabe: exigiu demissões, o diretor da PSP fez-lhe a vontade e ele nomeou para o lugar o comandante da Unidade Especial de Polícia, aquela mesmo que costuma formar o cordão de segurança nas manifestações na AR mas que, desta vez - e sabe-se lá porquê - não o fez. Portanto, na manifestação de anteontem, a segurança era composta por "polícias de esquadra". Colegas dos manifestantes, portanto.
Estes, os manifestantes, não eram perigosos subversivos que exigissem segurança reforçada e bastonada em barda, como ocorre com Indignados, Que se Lixe a Troika e outras organizações sinistras, "profissionais da agitação" como Miguel Macedo os classificou em anteriores eventos. Não, estes são apenas agentes, cidadãos, gente como nós com contas para pagar, pais (e mães) de família com dificuldades e preocupações legítimas em relação ao seu futuro e à sua carreira. A "invasão da escadaria" foi um incidente grave? Depende do ponto de vista. O governo não diz que sim nem que não. O Primeiro Ministro, com aquela sapiência que lhe é peculiar, disse que "não é um bom indicador da própria autoridade das forças de segurança", o que é seguramente tranquilizador para toda a gente. Não diz o que é, diz o que não é.
E a PSP? Tudo calmo, que o povo é sereno: foi uma estratégia "inteligente", aquela de deixar os manifestantes dar um passo ameaçador em direção à sede do poder democrático. Afinal, "havia manifestantes armados" e a coisa podia ter dado para o torto se alguém os tentasse impedir, podia ter ocorrido um "banho de sangue". Ontem ouvi aquele senhor do Observatório da Segurança, ou lá o que é, dizer mais ou menos o mesmo. Extraordinário. Eu digo que sim, que foi gravíssimo: dois pesos e duas medidas, claro como água. E que estes tontos que nos governam estão a criar roturas insanáveis e a arrastar tudo para o fundo.
Agora podem tirar as conclusões que quiserem, fazer balanços, mudar chefias, refletir sobre aquele momento onde podia ter havido sarilho à séria. Eu fiquei com a certeza de que há manifs de primeira e manifs de segunda, protestos que são para ignorar - ou cascar, consoante mostram ou não respeitinho - e protestos que são para ouvir. Velhos, desempregados, sem-abrigo, classe média empobrecida, jovens sem esperança são mais incómodos que perigosos, fazem comichão mas não mordem; polícias são outra história. E eles sabem-no bem. Um deles, manifestante, até se dignou provar a um jornalista que estava ali mas podia estar do outro lado, ao sacar-lhe a câmara ou o telemóvel, ou lá o que foi.
Posto tudo isto, o cidadão que sente que Portugal está bloqueado entre um sentimento generalizado mas surdo de descontentamento e um governo cercado mas protegido pelas regras da democracia e pelo Presidente da República hesita em classificar os incidentes de quinta feira, em mostrar empatia pela polícia em protesto ou temer o caráter excecional que este tomou. Eu digo o que penso: foi mau e vai piorar.
Duas coisas podem acontecer. A primeira é o governo recuar, e já. "Não se brinca com a bófia". Mas recuando, vai acentuar o sentido de injustiça dominante, porque a fatura vai cair em cima de outros, inevitavelmente os do costume: classe média, funcionários públicos, reformados. Vão todos engrossar as próximas manifs, e nessas os cordões de segurança já poderão funcionar como de costume contra as "invasões de escadaria". A segunda é ficar tudo como está. Sabendo que já não podem contar com uma lealdade policial incontestável, os imbecis governamentais irão acocorar-se atrás de uma guarda pretoriana e arriscam-se a ter que chamar a tropa dos quartéis. E numa altura em que já se ouvem rumores de que também os militares poderão vir para a rua, o prognóstico é mais do que incerto. Espertos como são (e com largas provas nesse sentido), seguirão provavelmente uma inteligente estratégia mista de "fazer sinal à esquerda e virar à direita", a somar à já anunciada mudança de chefias. Não tardará muito, quem sabe, a serem chamadas a S. Bento. O que, da última vez de que me lembro ter ocorrido, não foi exatamente um sucesso.
ao ler hoje o dn (edição impressa), deparo-me com isto:
'o director [da psp] advertiu que recorrer à força numa situação daquelas [a da manif das polícias] era potenciar um conflito que podia terminar num banho de sangue e reeditar uma versão ainda mais violenta dos 'secos e molhados' em 1989' (...) o ainda director explicou a miguel macedo [ministro da administração interna] a opção táctica do efectivo, incluindo a informação de que tinham sido observados alguns manifestantes armados.'
ora bem: temos portanto um director da psp (felizmente já demitido) a dizer a um ministro (que durante os acontecimentos que passaram em todas as tv e diziam respeito a uma manifestação de agentes de todas as polícias e basicamente contra ele devia estar, quê, a dormir?? a jogar gamão? a ler banda desenhada?) que:
1.polícias foram armados para uma manifestação e os polícias que lá estavam para controlar a manifestação deram por isso;
2. os polícias que lá estavam, ou seja, o comando, ou seja, o ministro, acharam que em face disso o melhor era deixá-los fazer tudo o que entendessem.
é isto, não é?
então, por partes: a lei em vigor para o direito de manifestação e reunião, o decreto-lei nº 406/74 (que é pré constitucional e pré democrático e que não se percebe porquê nunca foi mexido até hoje, apesar de estar obviamente desactualizado) diz muito claramente que ir armado para uma manifestação é crime e que quem promove a manifestação é responsável pelo desarmamento dos manifestantes:
2. Os promotores deverão pedir as armas aos portadores delas e entregá-las às autoridades.
logo, ao dar conta da presença de pessoas armadas na manif, os agentes da autoridade no local não cumpriram o seu dever, que era prendê-las, nem os organizadores da manif, os sindicatos das polícias, o seu, que era garantir que não havia gente armada, incorrendo no crime de desobediência qualificada (artigo 15º, 3. Aqueles que realizarem reuniões, comícios, manifestações ou desfiles contrariamente ao disposto neste diploma incorrerão no crime da desobediência qualificada);
logo, o facto de um director de polícia apresentar a presença de pessoas armadas numa manif como razão para a polícia não actuar pressupõe que a polícia por si comandada não só se demitiu de aplicar a lei como o fez por ter medo, o que é mau de mais para ser verdade, sendo-o no entanto.
o facto de os manifestantes alegadamente armados serem membros das forças de segurança e de a manif ter sido organizada por sindicatos que os representam significa que nem uns nem outros têm o menor respeito pela lei e se acham no direito de a violar, quando a sua estrita função e razão de ser é respeitá-la e fazê-la cumprir.
o facto de, alegadamente, um director nacional da psp usar como argumento a crença de que os agentes das forças da ordem que se manifestavam eram capazes de usar as armas que lhes foram distribuídas pelo estado contra a polícia que protegia o símbolo do estado e da democracia (o parlamento) diz bem do que alguém com a obrigação de conhecer os homens que comanda pensa deles: acha-os capazes de todas as barbaridades, até de 'um banho de sangue'.
perante isto, e perante o facto de nada se ter ouvido do ministro sobre isto, a demissão de um chefe da polícia é manifestamente insuficiente. é todo o sistema policial e toda a tutela que está em causa. é do culto da impunidade e da noção de estar acima da lei que conforma as polícias portuguesas que se trata -- e desta vez denunciado, mesmo que inconscientemente (??) por alguém que chefiou a psp durante mais de um ano.
que não se tenha ouvido até agora que a inspecção geral da administração interna, que depende do ministro e só pode agir com a sua autorização, vai investigar os acontecimentos é mais um sinal do completo desprezo pela lei e portanto pelo estado de direito e pela democracia que este episódio evidencia. desprezo e desrespeito que o ministro, naturalmente, corporiza, ao considerar que tudo se resolve com a demissão de um director da psp.
que perante isto haja quem considere que a subida da escadaria pelos manifestantes foi um sinal de 'viragem' e de 'esperança' é algo que só pode levar-nos a concluir que estamos muito longe de viver num país em que se saiba o que democracia quer dizer.
O depoimento de Pedro Arroja na RTP-I, ontem pelas quase 22 horas, a propósito do seu livro, é divertidíssimo. Não estou a ironizar. O ar sério com que diz os maiores dislates históricos, a-históricos e não-históricos é de gargalhada. O crédito que lhe é concedido, na RTP e noutras bandas, é que já me faz rir menos. É sempre bom encontrar alguém (e não é um alguém qualquer, "sou um estudioso, sou um académico") com ideias claras e simples: Qual é o grande mal de Portugal? Resposta: a importação de ideologias estrangeiras do norte da Europa (os socialismos germânicos e os liberalismos anglo-saxónicos) que são "versões laicas do mesmo fenómeno, o protestantismo religioso". Ideologias estrangeiras importadas, estranhas, "ruinosas" e "inimigas" da tradição portuguesa. Portugal importou a ideia de partidos e isso é terrível: "os partidos são uma evolução laica das seitas protestantes que visam dividir as comunidades (...) são uma agressão à nossa cultura". Simples e eficaz: não houvesse estes partidos, e Portugal uno e indivisível encher-se-ia de fraternidade lusitana, graças ao "sentido comunitário que os portugueses têm, devido à sua cultura".
De facto, se há povo com sentido comunitário, nada individualista, é o português. Basta tentar marcar uma reunião com mais de 3 pessoas e vê-se o resultado. Ná, isto sou eu que sou um gajo pirrónico, razão tem o Arroja: "o que é essencial daquela cultura germânica é a adversidade entre as pessoas; enquanto que nós portugueses constituimos uma família, eles não; eles são apenas um país com várias comunidades que frequentemente se odeiam umas às outras (...); o que não é o nosso caso, os portugueses não odeiam os portugueses, exceto quando há alguns incentivos a que o façam".
Ora bem, ainda no diagnóstico: o Estado-Providência é mais uma invenção alemã, "criado pelo Bismarck, que perseguiu os católicos". Portanto, proteção social é coisa que não compete ao Estado, mas (tradicionalmente, e assim é que deve ser) à Igreja, que os alemães arruinaram e a quem se tentaram substituir. E economia? Portugal deve fazer aquilo que sabe e que sempre fez: agricultura e pescas, em vez de andar metido nas indústrias aeroespaciais, supremo disparate. De facto, Portugal não tem tradição aeroespacial; o que temos de mais próximo é a Passarola de Bartolomeu de Gusmão. Os americanos, por exemplo, é que têm uma antiquíssima tradição dessas, secular, milenar mesmo. Toda a gente sabe que George Washington era um competente astronauta, que os extraterrestrres construíram Tihuanaco e que há séculos visitam o continente americano regularmente (diz-se que Roswell foi um infeliz incidente causado por um piloto em ressaca). Portanto, o Kennedy limitou-se a recuperar uma antiga tradição lá do país dele. Por cá - e com exceção de alguns intelectuais aluados - nada disso, o que temos com fartura é cortiça, analfabetismo e pesca à linha. E Papa, santos e santinhos, belas tradições muito nossas, sem partidos nem seitas. Os que havia, a Inquisição acabou com elas, acho eu de que, mas isso agora não interessa.
Só isto, coisas pequeninas e muito nossas? Não, senhor. "Portugal sempre foi viável, já dominou meio mundo sem a União Europeia... ainda esses países, que nós andamos agora a imitar, como a Alemanha e esses países do Norte da Europa, ainda eles não existiam como países e já nós éramos grandes no mundo". A descascar sobreiros e a roer côdeas de pão, presumo eu, porque explorar o Atlântico, construir a Mina e financiar uma viagem marítima até à Índia não faziam parte da nossa tradição, era - pouco mais ou menos - como... hmmm, como apostar na indústria aeroespacial hoje, não? isto é só um supônhamos.
Excerto da entrevista de Sobrinho Simões ao Público de hoje
Rogério da Costa Pereira
Rui Herbon
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De facto vivemos tempos curiosos, onde supostament...
De acordo, muito bem escrito.
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aaaaaaaaaaaaAcho que para o bem ou para o mal o po...