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jugular

ah a História, essa água de Lourdes

Água de Lourdes (se calhar a de Fátima faz o mesmo efeito), que as avós tinham numas coisinhas transparentes de plástico com o santuário e "neve" lá dentro. Ou, em alternativa, nuns recipientes, pronta para unções e rezas. Era bom, ajudava, fortalecia a convicção, o fervor. Era um instrumento da fé popular. A História? Podia repetir aquela minha máxima (há-de constar na minha tumba, e pagarei por ela por toda a eternidade, de que "é a puta mais deslavada e maltratada de que há memória, de quem toda a gente se serve e que ninguém respeita nem paga o devido preço pelo uso e, quantas vezes, abuso"), mas hoje não quero fazer misturas explosivas. Prefiro dizer que é como a água de Lourdes, salvaguardadas as devidas - e não são poucas - diferenças entre fé e fala-baratice. Convém sempre ter à mão, fica sempre bem, ninguém leva a mal, disfarça ignorâncias, pode ser usada sem receio de alguém chamar nomes, fica bem na fotografia, é um direito pessoal de cada cidadão, não cobra direitos nem reclama, não paga imposto, não protesta, grunhe, uiva, dá traques ou cheira mal da fossa sética. A História é um maná infinito e renovável, no dia em que alguém descobrir uma forma de produzir energia a partir dela, Portugal dominará o mundo.

"Os Portugueses que exportam são hoje uma espécie de navegadores de há quinhentos anos. Comportam-se como verdadeiros heróis", escreve Marques Mendes no último número da Visão. Irra, que se o populismo baratucho produzisse esteróides, os nossos comentadores eram uma casta de gigantes.

A deserção como escolha ética, por José Queirós

Num post anterior, desafiei à discussão sobre a atitude de deserção durante o período da guerra colonial. Um amigo com o qual tinha falado sobre o assunto,  no Porto, José Queirós, enviou-me este texto. Como me reconheço nele, publico-o como mais um contributo para a discussão sobre o tema.

 

«A deserção como escolha ética

Julgo que o tema da deserção merece estudo e debate. Ele enquadra-se, aliás, no tema mais geral dos diferentes posicionamentos das oposições à ditadura portuguesa face à guerra colonial.

Na minha opinião, algum silêncio que nestas quatro décadas se abateu sobre a importância histórica da deserção maciça nos últimos anos da guerra não poderá ser desligado do facto de se tratar de um tema incómodo para sectores da oposição tradicional (com posições ambíguas sobre a questão colonial), do PCP (que se opunha à deserção dos seus militantes) e dos militares vencedores de Abril (que tinham feito a guerra, antes de darem a contribuição decisiva para o seu fim). Sem falar da direita política, uma parte da qual verá ainda hoje na deserção uma "traição à pátria".

A história que (espero) venha a ser feita o dirá, mas parece-me claro que não deve continuar a ser desvalorizado o papel muito significativo que a recusa maciça dos jovens portugueses (refractários e desertores) em participarem na guerra nos últimos anos do Estado Novo teve no enfraquecimento do regime, no desgaste das tropas coloniais e na perda de legitimidade externa do regime.

Conheço o argumento contrário, segundo o qual a ida para as colónias de oficiais milicianos oriundos das universidades politizadas da época ajudou a acelerar o descontentamento no seio das Forças Armadas e a dar-lhe algum enquadramento político contra o regime, contribuindo assim para a vitória da rebelião militar de Abril de 1974. Haverá nisso uma parte de verdade, mas que não deverá ser sobrestimada. Julgo que, com ou sem esses putativos agitadores, o descontentamento provocado pela perpetuação da guerra no seio da oficialidade intermédia e os outros factores que se conjugaram para a queda da ditadura estavam de qualquer forma em marcha acelerada.

Em qualquer caso, e independentemente de considerações políticas e estratégicas ou mesmo de (re)avaliações historiográficas, convirá ter presente que a posição perante a guerra e a deserção colocava  uma questão ética incontornável aos jovens que então defendiam  a legitimidade e a justeza histórica da insurreição anti-colonial dos nacionalismos africanos. Incontornável mas divisiva, como se viu nas posições a esse respeito contraditórias das várias forças oposicionistas que nos últimos anos do Estado Novo se afirmavam, com maior ou menor clareza, contra a continuação da guerra.

Essa questão ética (o dilema de desertar ou participar na guerra) colocava-se de forma inescapável  aos jovens do sexo masculino em idade militar dotados de uma consciência anti-fascista e anti-colonialista. Não era possível, não era moralmente sustentável, apoiar a causa dos movimentos de libertação e ao mesmo tempo pegar em armas contra eles. Era aliás clara, a esse respeito, a posição dos próprios movimentos africanos, que apelaram à deserção dos soldados e oficiais portugueses e sempre saudaram as iniciativas nesse sentido.

Pessoalmente, estou certo (e julgo que a boa historiografia tenderá a confirmá-lo) de que a atitude abertamente anti-guerra e pró-deserção defendida e praticada, nos anos finais da ditadura, pela generalidade da chamada extrema-esquerda, e em particular pelos chamados movimentos maoístas, bem como por muitos jovens sem filiação partidária, contribuiu nessa época, de modo decisivo, para o fenómeno do rápido crescimento dessas forças entre a juventude, em detrimento, nomeadamente, da influência do PCP.

Entre os que então apelavam à deserção existiram, naturalmente, algumas diferenças de ordem táctica. A organização a que ambos pertencemos nesse tempo defendeu (e praticou) para os seus militantes e simpatizantes do sexo masculino a ida para a tropa (com excepção dos que ingressavam antes na clandestinidade), seguida de deserção, sempre que possível com armas. E apelou à deserção de todos os jovens em idade militar, apoiando e procurando organizar também aqueles, certamente a maioria, que simplesmente davam o "salto" e escolhiam o exílio para não terem de ingressar na tropa colonial. Hoje, a décadas de distância dos meus pressupostos ideológicos de então, continuo a entender que essa era, para um anti-colonialista, a única opção eticamente aceitável. E, para um anti-fascista, a posição mais acertada e útil.

E acho que é importante reafirmá-lo hoje, quando se ouvem vozes a falar da "cobardia" das muitas dezenas de milhares de refractários e desertores que recusaram fazer a guerra e partiram para o estrangeiro. "Cobardia" de quem assim corria importantes riscos pessoais, de quem cortava com projectos de vida, com a família e a comunidade, muitas vezes com a actividade profissional ou os estudos, sem saber se um dia poderia regressar ao país sem ser perseguido e preso, pois ninguém sabia até quando duraria a ditadura? Pelo contrário, a deserção deverá ser vista como demonstração de coerência e de coragem de quem se opunha, no plano individual, a uma guerra indefensável. Repito: não era possível nem sustentável no plano ético declarar apoio aos movimentos de libertação e ao mesmo tempo pegar em armas contra eles.

José Queirós»

 

Muito aquém de Capricórnio

O tema do descobrimento da Austrália pelos portugueses renasce ocasionalmente na imprensa, ora pela descoberta de um canhão numa praia ora pela de um desenho de um alegado canguru num manuscrito seiscentista. Embora, do ponto de vista científico, se trate de uma questão menor - há muito que a historiografia se desinteressou por pormenores tão marcadamente eurocêntricos como "quem descobriu a terra X" - suscita natural interesse junto do público. Afinal, não vivemos hoje em plena nostalgia dos tempos - reais ou imaginários - em que as viagens portuguesas causavam assombro e Portugal era respeitado e invejado por toda a Europa? Como escapar ao fascínio da hipótese de terem sido também os portugueses os "primeiros" a chegar à Austrália?

Esta ideia tem um paladino: o jornalista australiano Peter Trickett e o seu Beyond Capricorn (em português, Para além de Capricórnio), de 2007. A sua "tese" - que não é nova, antes reformula ideias anteriores - resume-se rapidamente: na década de 1520, Cristóvão de Mendonça foi secretamente incumbido pelo rei para atingir a lendária "ilha do ouro" mencionada por Marco Polo. A sua armada partiu de Lisboa e acabou por reconhecer e cartografar o continente australiano. Os seus mapas perderam-se, mas hoje restam cópias de origem francesa, que formam o chamado Atlas Vallard. Trickett reconstitui a viagem de Mendonça e o seu périplo. É uma bela e apaixonante odisseia; pena ser pouco mais do que ficção. Deficiente domínio do português, desconhecimento da produção científica sobre a expansão portuguesa e a Ásia marítima, abordagem limitada e preconceituosa das fontes históricas, erros grosseiros de interpretação, são algumas das mazelas de que padece o seu trabalho.

Quem queira saber mais sobre o tema constatará que não falta informação, na internet e na imprensa (replicada em blogues e redes sociais), sobre as ideias de Trickett e suas variantes, tomadas como inovadoras, heterodoxas, desafiadoras das velhas tradições, ousadas, estimulantes. O autor esteve em Portugal, deu entrevistas e toda a imprensa reproduziu acriticamente a sua "tese", com maior ou menor entusiasmo. Um autor australiano a defender os brios do patriotismo português não é coisa que surja todos os dias, é um facto. Em 2009, como corolário, Trickett foi agraciado com a Comenda da Ordem do Mérito.

Já a crítica ao seu trabalho (quer à "tese" propriamente dita quer ao livro) é uma raridade. Não conheço qualquer recensão crítica à obra. A comunidade científica não reagiu? Sim, logo em 2008, o Museu da Ciência da Univ. de Coimbra realizou um colóquio e uma mesa-redonda com historiadores de reconhecida credibilidade: a obra de Trickett aponta algumas pistas de trabalho interessantes, mas a sua "tese" carece de fundamentação. Não é a hipótese de os portugueses terem, muito provavelmente, visitado a costa australiana antes de holandeses e britânicos que está errada; é, tão-somente, a novela Cristóvão de Mendonça. As atas deste encontro foram publicadas recentemente (Portugueses na Austrália: as Primeiras Viagens), mas a divulgação foi praticamente nula, em flagrante contraste com a ampla difusão de Para além de Capricórnio, cujas ficções continuam a fazer escola e a polir o ego nacional. Alguns poderão entender esta bizarria como uma prova do provincianismo português; para mim, é sobretudo um sintoma do enraizado divórcio entre público e academia, leigos e especialistas, divulgação e ciência, que persiste em Portugal.

(publicado anteontem no DN)

o navio fantasma

Acaba de sair na imprensa mais uma notícia sobre o possível achamento da Flor de la Mar, o navio que Afonso de Albuquerque carregou com o saque de Malaca após a tomada da cidade, em 1511, e que naufragou pouco depois da partida. As histórias sobre as fabulosas riquezas que transportaria são já uma lenda. A notícia do Público diz coisas engraçadas: a mais flagrante é a identificação precipitada do que estará em vias de ser encontrado com aquela nau. Ora, sabe-se que o local de naufrágio, embora incerto, foi seguramente junto a Samatra (em Pasai ou em Aru). Mas o que é noticiado é que se trata da região de Semarang (e não "Seramang", como lá consta), na costa norte de Java. Não importa? Importa, e muito, é que Java fica a leste de Malaca; a Índia - para onde Albuquerque seguia - fica, caso ninguém tenha reparado, a oeste. A confirmar-se o achado, poderá ser um navio português, mas nunca o Flor de la Mar.

A segunda curiosidade é a referência ao tesouro. Fala-se de "60 toneladas de ouro". Isto é uma informação reproduzida por tudo o que é site de curiosidades e tesouros, mas a verdade, triste e incómoda, é que tal tesouro, muito provavelmente, não existe: não só a carga original seria certamente de valor muito inferior ao que diz a lenda, como se sabe que, após o naufrágio, parte substancial das riquezas deram à costa e foram de imediato tomadas pelas gentes da terra. Um conselho: é melhor continuarem à procura do tesouro dos Templários.

No livro, faço uma síntese da questão: pergunta 19, "Existe um tesouro da Flor de la Mar?"

(Na SIC falam do assunto, mais precisamente na Flor do Mar. Nada de espanholadas, pois então).

(Em stereo).

to be or not to be burro comás casas

que a identidade dos discriminados é criada pela discriminação é dos livros. seria suposto que todas as batalhas contra a discriminação não só tivessem isso em mente como buscassem como objectivo último afirmar o facto de uma característica discriminada não definir nada -- ser só isso, uma característica discriminada.

 

desde que comecei a reflectir e a escrever publicamente sobre o movimento lgbt (muito antes de se usar essa expressão, movimento lgbt), em 1993, partindo do debate nos eua sobre o banimento de homossexuais das forças armadas americanas -- um banimento que bill clinton tinha prometido, em campanha, revogar, mas que acabou por permanecer através da política 'não digas, não perguntes' -- que me deparei com o paradoxo de afirmar a homossexualidade e a existência de uma 'comunidade homossexual' quando essa afirmação, operativa para efeitos de luta, acabava por incorporar o preconceito: o de que ser homossexual tornava alguém um ser 'à parte'. isto para não falar da questão mais funda: o que é isso de ser homossexual (ou heterossexual, ou bisexual)? e como é que consigo lidar com o facto de precisar de vincar, expor, afirmar isso, se, para mim, o fim último desta luta é que não seja sequer um assunto?

 

em portugal, em que tudo tende a chegar tão tão tarde, parece que a discussão chegou agora -- e de uma forma particularmente estúpida e desinteressante. a forma de alguns, que se arvoram verdadeiros da luta verdadeira, de dizer 'chega para lá' àqueles que denominam como outsiders instrumentalizadores oportunistas: os que, dizem os auto-proclamados genuínos combatentes, não 'sendo', querem dizer aos que 'são' como lutar.

 

o pretexto, neste caso, foi o outing. quem o defende e é criticado por o defender responde dizendo a alguns críticos -- neste caso, eu e daniel oliveira -- que não temos o direito de dizer aos homossexuais como devem lutar pelos seus direitos. 

 

a situação é tanto mais divertida quanto a razão essencial pela qual eu e o daniel criticamos o outing é ser uma identidade-jacking: um assalto ao direito que cada um tem de se afirmar e definir sexualmente como bem lhe aprouver. ao afirmarem publicamente que eu e o daniel não fazemos parte das categorias discriminadas que alegamos defender, os que o afirmam estão a fazer-nos um outing. mas estão também a fazer uma outra espécie de outing, a de si próprios como totalitaristas. não só por decidirem assim que têm o direito de saber o que eu e daniel somos na nossa vida sexual (e, que eu tenha dado conta, nenhum de nós afirmou publicamente) e de o dizer, mas sobretudo por certificarem que a orientação sexual e/ou as práticas sexuais definem a nossa capacidade e legitimidade de opinar política e publicamente sobre matérias tão políticas e públicas como a discriminação das pessoas que não são percebidas como alinhando com a 'norma' e as formas de combater essa discriminação -- e, mais, que ao opinarmos sobre isso estamos, na nossa situação de 'normais', a 'arvorar-nos' em 'protectores' dos 'anormais'.

 

o pungente destas afirmações, que incluem o mau gosto de insinuar que eu e o daniel ganhámos não sei o quê à custa dos nossos 'protegidos', consiste, é claro, numa incorporação de menoridade. quando digo, por exemplo, que é cómico dizerem que instrumentalizei a luta lgbt quando comecei a escrever sobre o assunto antes de haver luta lgbt em portugal, acusam-me de estar a puxar dos galões. como quando me garantem que não me devem nada, e que eu é que, pelo que ganhei ao participar nesta luta, devia bater a bolinha baixa. é quem me acusa que me está a colocar na posição de alegada superioridade, a de alguém que fez coisas 'pelos outros' e espera 'gratidão'. 

 

ora, como aliás ao longo destes anos tive ocasião de explicar a muitos homofóbicos, não me importando portanto de explicar a quem afecta sofrer da fobia reversa, não vi nunca esta luta como uma luta 'por outros'. nunca me senti 'outra'. esse é o fundamento da luta, para mim. no combate contra a discriminação com base na orientação sexual como em relação a outra qualquer. é por mim que luto, por mim e por toda a gente. lutar pelos direitos humanos significa crer que somos iguais, todos a valer o mesmo e portanto com os mesmos direitos.

 

é antes de mais por defender os mesmos direitos para todos que eu, que defendo o direito de cada um a ser dono de si próprio e a definir-se como bem entender, se entender definir-se, e ao respeito pela sua intimidade e privacidade, execro o outing. mas, para além disso, como escreveu o daniel, o outing é uma forma de reiterar o preconceito: expor a orientação sexual de que alguém supostamente se envergonha é instrumentalizar essa vergonha. 

 

e se percebo e até posso simpatizar com a ideia de que por vezes o terrorismo é um meio legítimo -- e pode ser mesmo o único -- de luta contra tiranias, parece-me óbvio que, chegados aqui, a 2014 e ao momento em que o último direito a conquistar é o da parentalidade (importantíssimo que é, não é isso que está em questão), depois de termos conquistado todos os outros, é no mínimo estúpido proclamar que isto só lá vai à bomba. mais estúpido ainda quando a coadopção só não passou no parlamento in extremis, sendo óbvio que passará da próxima vez -- se cada um de nós, nas urnas, fizer o que tem de fazer para isso, em vez de, como tantos que agora rasgam as vestes, afirmar que 'são todos iguais' e 'tanto faz votar nuns ou noutros'.

 

para concluir, então, um conselho que deviam esse sim agradecer-me, ao contrário de tudo o resto: não sejam burros. isso, sim, é uma característica pela qual sou a primeira a discriminar e em relação à qual, como ao mau-caractismo, afirmo todo o meu preconceito. é-me igual ser 'acusada' de ser homossexual por escrever e falar e agir contra a discriminação dos homossexuais ou ser 'acusada' de não o ser e portanto dever estar inibida de fazê-lo. não preciso da vossa licença para nada, como nunca precisei da de ninguém. e deus me livre de algum dia ter esperado 'gratidão' ou qualquer idiotice do género. está tudo na vossa cabeça, tão pequenina. a cabeça de quem, lamento dizê-lo, estará perdido no dia em que desaparecer o labéu de discriminado -- quem serão vocês nesse dia? contra quem arremeterão? que raiva vos vai alimentar? 

 

get a life, pazinhos. 

 

Desertar ou ir à guerra? Há mais de 40 anos, muitos jovens portugueses confrontaram-se com esta difícil alternativa.

Há dias, em conversa com um amigo, concluímos que a questão da guerra colonial tinha marcado impressivamente a nossa geração e que faltava fazer um estudo sobre as atitudes relativas à oposição à guerra, nomeadamente acerca dos desertores e refractários. Como se verá abaixo, as diversas oposições ao regime tinham tácticas diversas no combate à guerra colonial. Ora, tanto o meu amigo como eu própria continuamos ambos a defender que era então correcta a atitude de desertar, senão a mais correcta. A questão é polémica e quase tabu em Portugal. Quarenta anos após 25 de Abril de 1974, a questão deve ser discutida. Pessoalmente penso que também urge fazer "justiça" à atitude que tiveram dezenas de milhares de jovens portugueses, ao recusarem-se a participar na guerra colonial.

 

Ora, acabo de saber que o cineasta Rui Simões estreou, na Cinemateca, o documentário Guerra ou Paz, cuja sinopse pode ser aqui lida - http://guerraoupaz-2010.blogspot.pt/

«Entre 1961 e 1974, 100.000 jovens portugueses partiram para a guerra nas ex-colónias. No mesmo período, outros 100.000, saíram de Portugal para não fazer essa mesma guerra. Em relação aos que fizeram a guerra já muito foi dito, escrito, filmado. Em relação aos outros, não existe nada, é uma espécie de assunto tabu na nossa sociedade. Que papel tiveram esses homens que “fugiram à guerra” na construção do país que somos hoje? Que percursos fizeram? De que forma resistiram? Esta é a história que GUERRA OU PAZ pretende contar: a dos jovens que se recusaram a participar numa guerra que não sentiam como sua, sem pôr em questão o seu amor à Pátria. Se há a figura do Soldado Desconhecido, este filme pretende retratar esse outro Homem Desconhecido que recusou ser soldado».

 

A propósito do tema da deserção, publico aqui excertos do meu livro História da Oposição à Ditadura, 1926-1974 (Figueirinhas, 2014)

 

Capítulo V, pp. 415-417

«Para a maioria dos elementos da oposição ao regime, a questão da guerra colonial era, desde o início dos anos 60, um tema incómodo, dado que, enquanto os socialistas e republicanos tinham alguma reserva em aceitar a independência das colónias, o PCP, que foi o único partido a reconhecê-la, oscilara inicialmente entre uma retórica nacionalista sobre os custos da guerra e um «modo proletário» de encarar o assunto, que vincava a solidariedade internacionalista com os povos das colónias[1]. Lembre-se que o tema da independência dos territórios africanos tinha surgido pela primeira vez, em texto, no V Congresso do PCP, em 1957, com a definição de uma táctica organizativa que passava por criar secções do partido nas colónias. Posteriormente, esta táctica mudaria, passando os comunistas a estimular a criação e apoio aos partidos indígenas em luta pela independência nacional.

Quanto

 

"Centros de excelência", disse ele

Ouvi ontem declarações de Paulo Macedo onde fazia referência a um grupo de estudo que estará a avaliar a operacionalização de "centros de excelência" na saúde. Sem saber mais sobre o assunto não discordo da necessidade de se concentrarem esforços e de se estudar a melhor maneira de operacionalizar essa ideia, só não percebo como é que havendo esse propósito se defende o desmantelamento da Maternidade Alfredo da Costa.

 

Também achei curioso, ao ler a notícia do Público sobre este assunto, que o ministro tivesse dito que a constituição dos tais centros deverá ser “ditada por princípios de racionalidade, e não por critérios meramente economicistas”. Realço o medo e a cobardia do não uso da palavra racionamento e a desvalorização dos critérios que têm norteado as políticas de saúde no que ao SNS diz respeito: os economicistas.

 

Fico a aguardar.

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