As madres durante 15 anitos enfiaram-me na moleirinha que se era chamado para exercer... a vocação! | (e fiquemos por aqui, nem vale a pena falar no chorrilho de asneiras que o Gonçalinho escreve sempre que aborda o tema mulheres)
É isso mesmo. foi o que tive nas últimas 24 horas. Cinco coisas - cinco - sobre as quais queria escrever um post mas não consegui. Nem uma palavra. Deviam ter saído uma de cada vez, fluidas, ligeiras e inspiradas, por ordem cronológica, assim no meio de um alívio generalizado. Em vez disso, atabalhoaram-se todas a quererem sair ao mesmo tempo e pronto, nada feito. Nem uma linha viu a luz do dia. Para memória futura (minha), ficam os temas: 1º o ISIS e o califado, a propósito de um recente artigo do Paulo Rangel no Público; 2º um post mais ou menos íntimo sobre o 4º aniversário de uma inesquecível (para mim) direta, em que acabei uma certa e determinada tese; 3º os 15 anos do referendo em Timor; 4º a suprema irritação que me causou a fala de Marinho e Pinto, ontem na TVI e hoje no Expresso; 5º uma crónica que saiu no mesmo Expresso, da autoria de um prof. de Economia, chamada "Redescobrindo os Descobrimentos". Obstipação. Virtual, felizmente.
Luis Menezes está, no twitter, muito enxofrado com o post do Paulo que descreve como, e cito, uma patetice". Aconselhei-o a ouvir bem o que disse, talvez assim mude o alvo do qualificativo patetice e o direcione para as suas próprias declarações. Eu até ajudo, estou simpática.
Acabei de ouvir, no "frente a frente" do Jornal da Noite da Sic Notícias, o deputado Luís Menezes dizer que Portugal é um "pequeno paraíso" no que respeita a certos "problemas". Que problemas? Ora aí é está o busílis. Aproveitando o seu minuto inicial para falar dos incidentes de Ferguson, referiu que se trata de uma cidade com 20 mil habitantes, 80% dos quais negros e que a polícia local é constituída, na sua quase totalidade, por brancos. E depois adiantou que por cá não se verificam tais situações, tanto mais que "os portugueses partiram à descoberta do mundo há 600 anos" (já cá faltava a lição de luso-tropicalismo). Bom. Seria boa ocasião para confrontar o deputado com dados sobre a componente "%-de-cor-de-pele" dos contigentes policiais que atuam na Amadora ou noutras localidades e da respetiva população, mas é melhor nem ir por aí. Basta constatar o incrível grau de ignorância que revela, daquela básica-nhurra-truz-truz-bate-na-madeira, quando menciona o facto de "Portugal não ter problemas com os seus imigrantes" que, aliás e segundo o mesmo, "recebe muito bem". Em bom português dir-se-ia que é parvo ou faz-se: como é que um deputado eleito da nação não percebe que nem os habitantes de Ferguson (e o jovem baleado que deu origem aos tumultos) são "imigrantes", nem os "alguns" problemas que diz existirem em Portugal envolvem "imigrantes". Numa palavra, são todos naturais, cá e lá. O que ele não quis dizer é que o problema, em Portugal (como nos EUA, neste caso) é de origem rácica (ou étnica, para ser mais politicamente correto). A paranóia mediática sobre meets e arrastões não acirra e alimenta o medo e instiga o ódio a imigrantes ou estrangeiros, mas a negros, por serem negros. Portugueses. Mas para o deputado, português tem que ser branquinho como ele; se é preto, então é imigrante. Tão simples como isso.
consideramos, e bem, que o maior mal é o que se faz de propósito e gratuitamente. porque, se formos minimamente sinceros, ou capazes de nos vermos, achar-nos-emos, todos, capazes de fazer mal. por reacção, por defesa, por distracção.
mas fazer mal por fazer, por nada, é outra coisa -- pensamos.
o problema é que muito raramente alguém achará que fez mal sem razão, ou sem provocação ou agressão prévia. é tudo uma questão de perspectiva: aquilo que consideramos razoável não é universal, longe disso. muito menos a capacidade de empatia.
no limite, cada um de nós é uma espécie. o único, primeiro e último exemplar, em extinção, sem nenhum outro ser no mundo que considere seu igual, e um único fito: olhar por si, sobreviver e prosperar até poder.
somos todos fair game uns dos outros. todos. e, nessa perspectiva, não há mal gratuito ou sem ser gratuito, há necessidades. ou negócios, como dizem os mafiosos: o mal nunca é por mal, é porque tem de ser.
Lê-se nos Padrões da Comunidade do facebook: "O Facebook não permite discursos que incentivem ao ódio mas distingue o discurso sério do humorístico. Embora incentivemos o debate de ideias, instituições, eventos e práticas, não permitimos que indivíduos ou grupos ataquem pessoas baseados na sua raça, etnia, nacionalidade, religião, sexo, orientação sexual, deficiência ou doença."
A Shyznogud deu com uma página chamada "Base de dados nacional das mulheres brancas que se misturam com pretos" e que divulga fotos de tais atrocidades abomináveis (já homens brancos que se misturam com pretas não tem nada de mal, antes pelo contrário, né sinhô?). Aparentemente, para expor e denunciar tais poucas vergonhas; em concreto, as mulheres, sempre as mulheres.
Já fiz duas denúncias - eu e mais sabe-se lá quantos - mas o Facebook repete que "Revimos a página que denunciaste por conter discurso ou símbolos que incentivam o ódio e considerámos que não desrespeitava os nossos Padrões da Comunidade". Portanto, das duas, uma: ou o FB tem um estranho sentido de humor ou acha que "preto" não é referência a "raça" nem "etnia" (a cor dos sapatos, talvez?) nem é um "ataque". Há uma terceira via: está-se a borrifar, desde que não haja impacto visual (como nudez), que importa lá isso, não é?
Sabei, pois, ó gentes, que em boa verdade vos digo: se tiverdes contrato com uma seguradora, lede bem os seus termos e confirmai, exigindo clareza cartesiana, o que está coberto e o que não está coberto. Por exemplo, no seguro de uma habitação, e antes que venha aí o inverno, exigi informações sobre se o murinho, o jardim, o portão ou outros elementos que considerais como "fazendo parte da casa" estão seguros. Se não, não vos admireis se, depois do vendaval, o agente vier dizer que "não contempla espaços exteriores". E se tiverdes contas a pedir por acidente de trabalho ou outro, daqueles que obrigam a tratamento hospitalar, fisioterapias, apoio domiciliário, transporte, vigiai de perto tudo, mas mesmo tudo, confirmai duas vezes os valores, observai tudo com canina devoção e ateia descrença. Sabei que tentarão enganar-vos por todos os meios, esquecer-se-ão de prescrições e de tratamentos, cometerão erros elementares que não se admitem a uma criança de 8 anos - e curiosamente sempre "para baixo" e nunca "para cima", desculpar-se-ão com atrasos, esperas, confirmações e desconhecimentos e sacudirão sempre a água para cima de terceiros, os atrasos do hospital, o hospital que não mandou, não comunicou, não informou. Sabede que tudo é feito para vos cansar, para vos exasperar, para vos fazer perder a concentração e, em última análise, para vos roubar. E preparai-vos para ligar para o número da companhia as vezes que forem necessárias, em caso da mínima dúvida, e pedir e informar, e lembrar, e relembrar, e saber porque é que a fisioterapia foi prescrita há uma semana e ainda não há sessões marcadas, e porque é que o valor não corresponde, e porque é que aquilo e aqueloutro foi anulado sem explicação, e porque é que, e porque é que, e porque é que. E não vos fieis nas desculpas sobre o sistema informático, o técnico que ainda não averiguou e o colega que ainda não confirmou, pois tudo isso são igualmente formas para vos cansar e fazer desistir.
E, por fim, se receberdes em casa um perito, sede corteses mas sucintos e firmes e recusai-vos a emitir opiniões sugeridas e dirigidas e a dizer "o que achais" sobre assuntos que não são de vossa responsabilidade, resisti a criar empatia excessiva com o agente, pois é certo e seguro que tentará lançar-vos contra outros cidadãos, promovendo a dúvida, a incerteza e a discórdia: certamente que um colega estará a essa hora, em casa deles, a tentar convencê-los a fazer o mesmo. E se for preciso, reclamai, protestai, denunciai, porque o silêncio faz ganhar milhões. Tudo isto que acabo de escrever aplica-se, por experiência própria, à Bonança, depois Império Bonança, agora, em plena merging apoteótica, à Fidelidade. Há quem grite com os funcionários e quem chame "filhos da puta" e beba mais um copo. Eu, depois de ver o Chatoné a descer a montanha de cajado na mão, ensaio um sermão, prontos.
eu percebo que as pessoas não gostem umas das outras -- oh se percebo -- e que tenham até ferniquoques perante aparições dos objectos do seu desgosto. percebo que se amofine alguém com a estética e ética alheias, que se amarinhem paredes por causa de um par de sapatos ou um corte de cabelo, uma maneira de pontuar ou maiúsculas em profusão. percebo tudo, juro, e até simpatizo, sou muito dada a repulsas desse jaez. percebo pois que a pessoa que escreve o excerto acima se torça toda perante imagens, escritos, voz e até nome da isabel moreira, como eventualmente de outras 'mulheres magricelas' que escrevem 'textos agressivos nos jornais' com 'obsessão da defesa de género' e outras cenas que a pessoa discerne à sua volta e a deixam enervadíssima até à psoríase.
bom.
o que me parece um pouco estranho é que esta pessoa sinta que tem de expressar este incómodo que lhe é tão particular e subjectivo tão publicamente e de forma tão assertivamente odienta. é que, concordo, se o recato não é de direita nem de esquerda -- é de bom gosto, direi eu --, nada nos revela melhor e de forma mais cruel que as obsessões que não conseguimos controlar, as raivas e ódios que nos assolam em ímpetos tresloucados. e tresloucado porquê, perguntar-se-á. por um motivo simples: a pessoa não consegue disfarçar que não é o acto que o deixa desvairado, é a 'im' -- ou, se quisermos ser compreensivos, o 'tipo im'.
repare-se que a pessoa, se receita recato, fá-lo apenas a 'mulheres magricelas'. se a mulher for pulposa ou mesmo badocha já pode, supõe-se, exibir-se em 'poses ousadas na praia' (quer dizer, de bikini, pouca-vergonha) e colocar as fotos no fb para esta pessoa, entre outras, apreciarem. mais: afinal o recato é sobretudo para quem desempenha 'funções de estado que não de somenos'. donde se retirará que, se a mulher, voluptuosa de preferência, não desempenhar funções de estado ou desempenhando-as forem de somenos, já pode ousar o que entender na praia e no fb. é isto, não é?
portanto a questão em apreço parece ser que a pessoa não quer ver mulheres magricelas de bikini na praia, só gorduchas. (eu compreendo; também gostava de só ver pessoas bonitas e inteligentes e com sentido de humor, bom gosto musical e bem vestidas e calçadas -- e todas a acharem-me o máximo, faz favor -- por todo o lado, mas tenho a sorte que se sabe (excepto naquilo de me acharem o máximo, vá lá)). e também acha que pessoas com função de estado, se magricelas, não deviam ir à praia ou ter conta no fb (estou tentada a concordar, quase, derivados, mas no meu caso incluía também os gordinhos e os assim-assim).
a grande diferença entre mim e esta pessoa, no fundo, é que apesar das minhas ilusões de grandeza e pancas variadíssimas consigo perceber que não vale a pena escrever textos a exigir que as pessoas de quem não gosto não sejam magras, não saiam à rua, não usem bikini, não vão à praia, não escrevam nos jornais, não defendam lá o que entendem defender (com limites, claro) e não sejam, se lhes apetece, exibicionistas. nem me passa pela cabeça achar que a defesa da privacidade é um dever. se a pessoa não quiser defender a privacidade dela é problema dela; o que me chateia é que haja quem ache seu dever impedir-me de defender a minha, e em nome da liberdade ainda por cima.
no fundo (e mesmo à superfície) é tudo uma questão de, precisamente, privacidade. se eu fosse a esta pessoa guardar-me-ia de exibir de forma tão despudorada e descontrolada as minhas obsessões, nomeadamente a minha obsessão com a isabel moreira e com o que ela decide ou não tatuar no corpo dela, e em geral o que decide ou não fazer com o corpo e a vida dela. porque isso é a exibição muito pouco recatada de um ímpeto persecutório e de um desejo totalitário (e muito pouco cristão, já agora) de aniquilamento. esta pessoa, na verdade, queria que a isabel desaparecesse do espaço público (se até a tatuagem dela o deixa desvairado -- queria o quê, 'amor de mãe'?), que a isabel não tivesse 'funções de estado', que a isabel não fosse a isabel, que a isabel não existisse.
sejamos sinceros: esta pessoa tem, além de problemas graves com o português e com os conceitos -- 'animosidade de'???, 'uma forma de exibicionismo que precisaria de recato???? --, problemas ainda mais graves com a liberdade, e nomeadamente com a liberdade das mulheres em geral e com a da isabel em particular. o que me parece, devo confessar, todo um programa psicanalítico (psiquiátrico não sei). não vou tão longe que queira que esta pessoa se feche em casa ou num mosteiro e cesse todo o discurso público; mas confesso que preferia, até por ela, que a pessoa guardasse estas ousadias de ódio para si. é que é feio como tudo e quiçá com o andamento pode tornar-se perigoso -- o que não é de direita nem de esquerda, é só mesmo o que é.