Fui alertado pelo David Marçal no Facebook, que remete para o De Rerum Natura. E fui espreitar: desde 8 de outubro que a homeopatia é legal. O nossos Ministérios da Saúde e da Educação já o definiram. Está aqui. Como este governo é cada vez mais uma anedota, não me admiro. O diploma diz que a homeoterapia é "uma terapêutica que utiliza (...) medicamentos homeopáticos (...)". Ora pois. Chamar "medicamento" a água com açúcar tem que se lhe diga. Mas adiante. Aprendi muito. Até já me sinto melhor, só de ler aquelas linhas. O diploma define os "princípios teóricos" da homeopatia, a saber, "a lei da semelhança, o princípio da duração da cura, o princípio do remédio único" e mais uns quantos. Nada de confusões, é que andam para aí uns falsos homeopatas que tinham acrescentado mais um ou dois. E a homeopatia, esclarece ainda o texto, segue o fundamento de que "o semelhante cura o semelhante", "utiliza uma abordagem holística" e os seus medicamentos "têm como princípio" [note-se, não diz "têm eficácia comprovada" ou "foram cientificamente testados"] a indução de um processo de reorganização das funções vitais [o que será reorganizar as funções vitais? comer pelas orelhas? mijar pelo nariz?], estimulando o mecanismo de autorregulação [deduzo que sejam os mercados internos]". E um homeopata, o que deve conhecer? Muita coisa, segundo o diploma: conhecimentos ora "suficientes", ora "aprofundados", mas ninguém me diz o que significam estes adjetivos em contexto terapêutico. Quem mede, define, determina e estabelece o que são estes "conhecimentos suficientes do ser humano"? ou de "fisiologia, patologia", etc? Será ler umas merdas? É? Então corrijam o diploma, senhores, façam o favor, e ponham assim: o homeopata deve saber umas merdas acerca do ser humano blá blá, ler umas merdas sobre fisiologia, patologia, blá blá. Ah! e aos "conhecimentos aprofundados", idem: o homeopata deve saber bué da merdas sobre ciências comportamentais, etc. É que assim a gente entendia e sabia de que é que estamos exatamente a falar, com o rigor correspondente ao diploma e à pseudociência, vulgo vigarice, que o governo acaba de regulamentar. É que deduzo que o diploma se destine a acabar com a pouca vergonha de pseudo-homeopatas que devem andar por aí, vígaros não-qualificados que exercem pseudo-homeopatia sem o mínimo de qualidade e de resultados (homeopáticos, obviamente). Agora, aguardo com esperança e serenidade a regulamentação da astrologia, do jogo de búzios e do pedra-papel-tesoura. Para que os portugueses não sejam mais enganados por quem exerce estas atividades sem qualificações. A bem danação (e do fisco, presumo).
adenda: Ao Divino Espírito Santo: concedei-me a graça da paciência para aturar comentadores, escrevedores, opinadores, tudólogadores, caça-penhores e outras dores.
Alguém me consegue explicar isto sem ser por motivos marcadamente ideológicos (a saber, através de incentivos fiscais, se valorizar a família tradicional em detrimento das outras)?
* A frase entre aspas que aparece na imagem é de Manuel Faustino, em entrevista ao Jornal de Negócios de hoje
Meus caros alunos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra interessados em organizar um debate político nas instalações da vossa Faculdade e que viram o vosso pedido recusado em razão do assunto,
escrevo-vos com duas sugestões, esperando que vos ajudem, caso as queiram prosseguir, na obtenção do vosso intento ou pelo menos a serem ressarcidos moralmente.
Em primeiro lugar, ofereçam a obra A Matter of Principle de Ronald Dworkin ao Director da vossa Faculdade. É uma obra digna e devemos oferecer presentes que melhorem as vidas dos presenteados.
Em segundo lugar, dada a fundamentação que é veiculada pelos órgãos de comunicação social e cuja prova, sendo verdade, não será difícil de fazer, proponham uma acção administrativa especial (enquanto ainda existe) pedindo a condenação à prática do acto devido. Vai valer a pena, só para ver funcionar o artigo 71.º do CPTA.
'O que eu acho inacreditável, desculpar-me-á, é que se proponha mais um crime! Já há crimes a mais! Um crime é suposto ser uma coisa muito grave. Já temos policias a mais. Tudo quanto pode ser criminoso no assédio verbal já é crime a outros títulos. A lei não pode regular tudo. Não vêem que estão a criar um totalitarismo?!' (comentário de zé, aqui)
gostei muito deste comentário. portanto, 'há crimes a mais'; 'um crime é suposto ser 1 coisa muito grave'; 'tudo o que pode ser criminoso no assédio verbal já é crime a outros títulos'; 'a lei não pode regular tudo'; 'não vêem que estamos a criar 1 totalitarismo?'.
ou seja: o assédio verbal não é uma coisa muito grave;
tudo o que pode ser criminoso (que é uma coisa muito grave, portanto) no assédio verbal já é crime (portanto uma coisa muito grave, ou seja, o assédio verbal é uma coisa muito grave, excepto não sendo, o que se calhar significa que não será assédio verbal mas outra coisa qualquer);
a lei não pode regular tudo -- porém já regula o crime de assédio verbal, mas com outros nomes, porque é muito grave;
estamos a criar um totalitarismo ao querermos, deduz-se, chamar crime a uma coisa que já é crime e portanto muito grave mas ninguém reparou portanto ninguém trata como tal.
obrigada.
a propósito, e para os que insistem que o assédio sexual de rua 'não tem dignidade penal' e portanto não pode ser crime, exemplos de alguns crimes constantes no código penal em vigor:
190.º - violação de domicílio ou perturbação da vida privada
1 - quem, sem consentimento, se introduzir na habitação de outra pessoa ou nela permanecer depois de intimado a retirar-se é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 240 dias.
2 - na mesma pena incorre quem, com intenção de perturbar a vida privada, a paz e o sossego de outra pessoa, telefonar para a sua habitação ou para o seu telemóvel.
artigo 251º ultraje por motivo de crença religiosa
1- quem publicamente ofender outra pessoa ou dela escarnecer em razão da sua crença ou função religiosa, por forma adequada a perturbar a paz pública, é punido com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.
ofensa à memória de pessoa falecida (artigo 185)
1 - quem, por qualquer forma, ofender gravemente a memória de pessoa falecida é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias
"Vale a pena as pessoas terem consciência que numa família com zero rendimento cada criança recebia, de RSI, em 2009 93€, com uma majoração, para as famílias com mais de 3 filhos, em que a terceira criança recebia 112€. Isto com zero de rendimento, que não é a situação normal.Hoje, cada criança recebe de RSI, numa família com zero de rendimento, 53€, ou seja, sensivelmente metade"
vou usar o mesmo método, respondendo por interposta pessoa, mais concretamente com um comentário do joão viegas ao interposto post:
'Não, não é tudo assédio.
E’ assédio um comportamento que, ostensivamente, se dirige a uma pessoa transmitindo-lhe a ideia que ela não é considerada como tal, mas como objecto, ou pelo menos como um ser que não pertence à mesma espécie do que o seu interlocutor e que, como tal, pode muito bem aguentar com os caprichos e as vontades deste ultimo, ainda que não lhe apeteça atura-lo.
Como é obvio, a caracterização dependera sempre do contexto. Entre outras coisas, a consciência de que o comportamento não é desejado pela vitima, ou a indiferença manifesta a esta questão, sera um indicio importante. Não vi o filme, mas posso imaginar que muitas interpelações de rua, ainda que não usem palavrões ou alusões explicitas, mereçam a qualificação de assédio e que devam ser distinguidas de comportamentos anodinos e inofensivos como “por favor, minha Senhora, sabe indicar-me onde fica a praça do Chile”.
Portanto não é muito complicado fazer a diferença.
Mas, como sempre, ha burgessos interessados em misturar tudo. Estes ultimos, que normalmente nunca dedicaram dois segundos a tentar saber do que estão a falar, são normalmente os primeiros a vir com queixumes do tipo : “isto agora, uma pessoa não pode fazer perguntas inocentes nem dar os bons dias na rua, é o totalitarismo do politicamente correcto”.
E, ao que parece, nos temos que os aturar.'
qualquer dúvida mais, é só perguntar.
adenda: ler este post do dimas pestana no fb também é muito instrutivo quanto ao desespero (desa)argumentativo a que se assiste por parte dos inimigos da penalização do assédio de rua.