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Palavras para Sakineh

Para que não haja qualquer tipo de ambiguidade no meu propósito permitam que comece por citar uma das maiores figuras do combate contra a pena de morte, Victor Hugo: “A pena de morte é a expressão especial e eterna da barbárie.”

 

O princípio que rege este texto é pois claro: Toda e qualquer condenação à morte, onde quer que ela seja pronunciada, é uma barbaridade.

Não há execuções “limpas”, justas e muito menos formas “humanas” de matar.

 

Como diz Robert Badinter, o homem que aboliu a pena de morte em França há apenas trinta anos, “a abolição da pena de morte é sempre uma vitória moral do homem sobre si próprio”.

A minha indignação, a minha repulsa por semelhante acto de cobardia é por isso a mesma, sempre.

 

Dito isto, não posso, no entanto, deixar de constatar que a condenação à morte por lapidação é um dos muitos exemplos do requinte criativo no horror de que a mente humana provou ser capaz todo ao longo da sua história.

 

Encontramos referências a execuções por lapidação na mitologia clássica, no Antigo e no Novo Testamento, no Talmud. Curiosamente parece que o Corão não faz qualquer referência a este suplício mas logo leis islâmicas se apressaram a recupera-lo.

Hoje em dia são cerca de dez os regimes que ainda prevêem no seu código penal esta forma de execução, normalmente pública pois pretende-se que seja um castigo exemplar.

 

Não se trata por isso de avaliar aqui nem religiões, nem regimes por muitas dúvidas e profundas discordâncias que se possam legitimamente ter. E tenho.

 

Fazer qualquer tipo de recuperação política ou ideológica da defesa de Sakineh, pois é obviamente do caso dela que se trata, é participar no que a noção de “exemplaridade” tem de mais monstruoso por ser a negação do primeiro dos direitos de todo o ser humano, o facto de ser uma vida particular e única.

 

Sou a primeira a lamentar que a comunidade internacional não se emocione da mesma forma contra todas as execuções capitais e que o nome dos condenados não seja de todos conhecidos como é agora o caso de Sakineh.

Esse facto, até pelo exemplo do caso de Amina Lawal em 2005, não nos deve coibir de nos mobilizarmos para tentar salvar esta vida em particular.

 

Também recuso o debate sobre a forma, mais que duvidosa, como decorreu o seu processo pois é o princípio da condenação à morte por lapidação que contesto. Mesmo que o processo tivesse decorrido em total conformidade com a lei iraniana, a atrocidade de apedrejar uma mulher até à morte por adultério, crime considerado por esta mais grave do que o homicídio, não seria menor.

 

Num dos muitos textos de apoio a Sakineh Mohammadi Ashtiani que têm surgido pode ler-se: mata-se com pedras, salva-se com palavras.

 

Por isso, para além de participar na mobilização prevista para o próximo dia 28 em Lisboa, achei que devia juntar-me às palavras que, um pouco por todo o mundo, estão a ser recolhidas para salvar Sakineh.

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