Irão: a laicidade é um assunto de mulheres
Não sei se o Ministério da Virtude iraniano foi formalmente instituído mas a Oriflame já sentiu a sua acção. Querendo certamente cortar pela raiz a causa da actividade sísmica na região, abalada na noite de sexta por mais um terramoto, o regime dos ayatollahs resolveu suspender a actividade da firma sueca de venda directa de cosméticos, que tinha no Irão o mercado mais florescente do oriente: cerca de 20% das vendas na Ásia. Como sempre, o que passa por justiça neste país tem-se entretido na última semana a fabricar acusações para justificar a sentença. Primeiro, tentaram acusar a Oriflame de vender os seus produtos através de um esquema fraudulento. Como a acusação não pegou, depois de prender por espionagem 5 dos seus funcionários, ontem o ministro iraniano das secretas afirmou, usando o mausoléu de Khomeini como pano de fundo, que a Oriflame é uma ameaça à segurança do país:
«Oriflame intended to fight the (Iranian) system. There are no economic reasons behind the company» afirmou Heydar Moslehi aos jornalistas. «We realised through the evidence that the arrogance (Western powers) and intelligence agencies sought to create security problems for the country through this company», acrescentou.
Não faço ideia se Teerão pretende submeter os funcionários da Oriflame a requintes da tortura que é uma constante nas prisões iranianas para exibir uma confissão televisionada das acusações inventadas. Ou se esses funcionários vão engrossar as já largas fileiras de prisioneiros que aguardam execução por (não) motivos análogos. Ou se, como os Baha'i recentemente condenados a 20 anos de prisão, os verdadeiros motivos da sua prisão serão disfarçados, para além de espionagem ao serviço de um estado hostil, com acusações de «espalharem a corrupção pela Terra». Mas tenho a certeza que esta acção contra a Oriflame é uma acção contra a coragem indomável das iranianas, que não se vergam aos ditames imbecis de um regime brutal e sanguinário e continuam a usar maquilhagem contra as indicações expressas dos ayatollahs que já declaram a prática «uma corrupção da juventude».
Acima de tudo, tal como a activista iraniana dos direitos humanos Shirin Ebadi, tenho a certeza de que serão as mulheres que trarão democracia ao Irão. Simplesmente porque, como o que aconteceu ontem em todo o globo mostrou, a laicidade é e continuará a ser um assunto de mulheres.