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não fumadores, uni-vos

Há um mês, escrevi aqui sobre o espírito natalício, a propósito da lei do tabaco e dos protestos de tanta gente sobre aquilo que crismam de “fundamentalismo”, “totalitarismo”, “fascismo” e até “nazismo” e “polpotismo”. Apelava então à boa vontade que é apanágio da época, tentando fazer perceber aos fumadores que era altura de retribuírem aquela de que os não fumadores deram provas (e pulmões) durante décadas. Não tinha, é certo, grande esperança de que tal sucedesse – afinal, frisava também que de toxicodependentes não se pode esperar grande bom senso quanto à substância de que dependem.

Escrevi, naturalmente, antes de António Nunes, o inspector-geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, inaugurar o ano (e a sua intervenção no que à lei do tabaco respeita) no casino Estoril a saborear uma cigarrilha numa sala de espectáculos onde se jantava e onde, garantiu-me a jornalista Céu Neves – e eu acredito nela – se fumava em todo o lado, sem qualquer separação ou sinalização entre zonas de fumo e de não fumo. Escrevi antes de este facto, fotografado e amplamente difundido, no país e até no estrangeiro, e de a “explicação” do inspector (disse ele que a lei do tabaco não se aplicaria no casino, porque ali se aplica a “lei do jogo”) terem lançado uma discussão, que perdura, sobre a “excepção” dos casinos. Escrevi antes da petição das discotecas para a mudança da lei, e escrevi antes de o representante da associação das ditas ter saído de uma reunião com o director-geral da Saúde a festejar a possibilidade de poder atribuir aos fumadores uma percentagem do espaço superior à máxima admitida nos restaurantes, até então tidos como os campeões absolutos da área para fumo (afinal, os restaurantes até 100 metros quadrados até podem escolher ser “para fumadores”, desde que tenham um sistema de ventilação e extracção de ar que “proteja os trabalhadores e os outros clientes dos efeitos do fumo” – sistema que ninguém sabe explicar o que seja ao certo, mas isso agora não interessa nada). Escrevi antes de o director-geral da Saúde, Francisco George, ter vindo corrigir o representante das discotecas, frisando que o regime de excepção “mais favorável” (aos fumadores, entenda-se) é o dos restaurantes e que portanto nas discotecas tem de haver menos, e não mais, espaço para os do cigarro. E escrevi antes de o mesmo George ter, em entrevista ao DN, esclarecido que é possível dividir locais de trabalho em espaços para não fumadores e para fumadores, desde que a área para estes últimos não exceda/atinja 30% e haja os tais sistemas de extracção de ar. Ou seja, escrevi antes de a tão “proibicionista” lei do tabaco se ter transformado numa paródia e de as excepções terem esfumado a regra – a tal que, segundo o preâmbulo legislativo de declaração de intenções, era de combate ao tabagismo e de protecção dos não fumadores em relação ao fumo passivo. A tal que, supostamente, proibia o fumar nos locais de trabalho, excepto “em áreas expressamente previstas para o efeito”, áreas essas que toda a gente, a começar pela administração pública, interpretou como sendo “salas de fumo”. A tal que declaradamente ia levar ao encerramento centenas de restaurantes e discotecas e à extinção de sabe-se lá quantos postos de trabalho (que, sabe-se lá porquê, não foram extintos em nenhum lugar do mundo onde leis de tabaco bem mais draconianas estão em prática há anos, mas isso agora também não interessa puto). A tal que fez correr tanta tinta e que está prestes a ir para o sítio para onde todas as leis sobre tabaco têm ido neste país. Escrevi antes disso tudo, por isso pude escrever sobre a boa vontade. Agora já não dá. Agora só posso lançar um repto aos não fumadores: embora ser mesmo fundamentalistas, boa? Já que temos a fama, bem podemos ter o proveito. (publicado na coluna 'sermões impossíveis' da notícias magazine de 27 de Janeiro)

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