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imposto religioso

Em nome do "bem comum da nação", os bispos católicos exigiram ontem o fim de "recompensas exorbitantes", acrescentando: "É hora para repensar as atitudes éticas e cívicas com lucidez vigorosa." Apelos à moralização é coisa que se espera de bispos. Mas tudo deve começar em casa. Por exemplo, face à revogação parcial das leis de 1990 e 2001 que permitiam às Instituições Privadas de Solidariedade Social (IPSS) e às igrejas radicadas receber de volta o IVA, revogação que deixa intocada essa devolução à Igreja Católica (IC), seria de esperar dos bispos mais que um protesto tíbio pela discriminação das outras confissões. (Discriminação que no tocante ao IVA vigorou desde a sua introdução, em 1986, até 2001, quando a Lei da Liberdade Religiosa alargou a devolução às restantes confissões radicadas - sem que no entretanto se tenham notado grandes engulhos nos hierarcas.) Devíamos ouvi-los dizer: "Ah, se o Estado está tão aflito que até quer retirar este benefício fiscal às IPSS, que têm por função específica ajudar as pessoas, nós, que só o recebemos em função dos fins religiosos, que a bem dizer nem deviam custar dinheiro, abdicamos dele para essas organizações poderem prosseguir os seus meritórios fins." Acresce o pormenor de muitas das IPSS estarem ligadas à IC, pelo que o sacrifício, que ficava tão bem, nem seria por aí além.

 

À falta de milagres, é ao Estado que se exige moralização, sendo inadmissível que se não tenha ainda ouvido - nem, valha a verdade, se tenha exigido muito - uma explicação do Governo para excepcionar de forma tão escandalosa uma confissão em detrimento das outras e até de organizações beneméritas. Porque, afinal, além de evidenciar a relação malsã do Estado português com a IC, o que esta medida traduz é o entendimento da religião como "um bem comum" que o Estado deveria incentivar ao ponto de lhe alocar recursos. Com que justificação, afinal, se mantém o financiamento directo de confissões religiosas pelo Estado, seja por que meio (devolução do IVA, outras isenções fiscais ou consignação - a possibilidade de cada contribuinte alocar 0,5% da colecta a uma instituição para tal inscrita, permitida desde 2001)? Não deve o seu sustento depender dos respectivos fiéis, ao invés de ser imposto a todos?

 

Vai fazer um século que a liberdade religiosa foi declarada em Portugal. Num país onde até então era crime propagar doutrinas "contrárias aos dogmas católicos" e celebrar actos públicos de outras confissões, era-se livre de professar qualquer religião, ou religião nenhuma. Durante algum tempo depois de 1911, é certo, foi como se ser católico fosse crime. Mas, cem anos depois, é mais que altura de dar essas contas por saldadas. E perceber que, se tirar a todos para dar aos padres é sempre imoral, tirar aos pobres, e em tempo de escassez, é uma ignomínia.

 

(publicado hoje no dn)

9 comentários

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    f. 12.11.2010

    não, miguel. dar 0,5% do imposto q ias pagar não é sustentares uma confissão do teu bolso, é do bolso d todos, porque estás a retirar do imposto, q portanto não é teu. dares to teu bolso é dares do teu dinheiro (coisa q aliás t dá direito a desconto nos impostos). também me escapa a comparação com as forças armadas: estás mm a comparar as forças armadas com as religiões? em q medida? gostava d perceber.

    finalmente: a igreja católica dá aos pobres? óptimo. é aliás por isso q as ipss têm um estatuto especial, q devem na minha modesta opinião ter. mas as isenções fiscais d q falo não são as q premeiam as actividades beneméritas,
    são as q s aplicam em função de 'fins religiosos'. se me quiseres explicar em q medida os 'fins religiosos' devem ser considerados um bem comum, agradeço.
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    Miguel Marujo 12.11.2010

    sem muito tempo para me poder alongar, apenas isto:
    - estou a comparar com as forças armadas - que, sustento, não têm utiilidade, não servem para absolutamente nada! - como podia comparar com as dezenas de associações recreativas ou instituições agraciadas com apoios do Estado: devo ter uma palavra a dizer no dinheiro dos meus impostos e não os quero gastos numa instituição que promove a guerra, por exemplo; quero gastá-los (0,5% por amor de deus!) em algo em que julgo ser importante para o bem comum (se der esses 0,5% à Amnistia ou à AMI ou à Abraço, outras possibilidades, já não há questão alguma?!);
    - podia estar aqui longamente a explicar como entendo a fé que acredito - "os fins religiosos"- como promotora de coisas para o bem comum... e os exemplos há-os aos pontapés: o trabalho de solidariedade social é apenas um deles. Mas já sei também que vou esbarrar na necessidade de enfiar a religião na sacristia ou que a igreja também tem privilégios (e tem, e no caso do IVA, a discriminação de todas as outras religiões é injusta, porque devia ser para todas).
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    f. 12.11.2010

    miguel, as forças armadas são parte do estado. podes achar q não servem para nada, como há gente q acha, por exemplo, q a cultura não serve para nada, ou q o rsi não devia existir, etc. comparar isso com os impostos q são perdoados às igrejas por se considerar a religião algo q diz respeito a todos é realmente extraordinário.
    depois, a associação entre a religião e a solidariedade é tb muito interessante -- aliás, não és tu q a fazes, é mm o estado ao associar os dois grupos de instituições em leis e isenções, como se existisse qq relação directa entre elas. a ami e a igreja católica, ou evangélica, ou budista, ou hindu,
    ou muçulmana é o mesmo? portanto eu dar dinheiro a uma associação q tem como fim declarado ajudar pessoas em dificuldades é o mm q dar dinheiro para contruir igrejas e madrassas? muito m contas.
    depois, a conclusão: acho extraordinário q este tipo de debate acabe sempre com proclamações de vitimização -- q, vais perdoar, é o q fazes quando insinuas q eu quero 'enfiar a religião na sacristia'. não, miguel: eu só quero manter a mão da religião fora do meu bolso. lamento q não percebas ou não queiras perceber a diferença.
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    Miguel Marujo 12.11.2010

    peço desculpa: não comparo com os impostos perdoados à igreja, que eu critiquei, e sempre critiquei... critico a a tua crítica à consignação de 0,5%: porque é que se pode consignar 0,5% dos meus impostos à ILGA (que acho muito bem que se apoie, mas é só para exemplificar com uma associação que não existe para "ajudar pessoas em dificuldades") e não a uma igreja?
    o argumento de irem ao teu bolso, pode ser mal usado em muita coisa... tenho pena que uma intervenção oportuna dos bispos sobre remunerações exorbitantes seja confundida por ti... eis a sacristia tramada, que invoco, porque sinceramente quem ouve os bispos ontem e te lê hoje pensa que o lugar da igreja é só na sacristia. eu percebo a diferença, a confusão é estabelecida por ti.
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    f. 12.11.2010

    miguel, critico a possibilidade de consignação com base nos fins religiosos por motivos q já explicitei: os fins religiosos serem considerados como um bem comum d per si. aliás, no caso da igreja católica, apesar de poder fazê-lo nunca s inscreveu para tal -- é o princípio q m interessa, no caso, e no q diz respeito a todas as confissões, não apenas para a católica.
    depois, gosto do exemplo q usas: a ilga não existe para ajudar pessoas em dificuldades? ah sim? se calhar tens de te informar melhor.
    quanto à interpretação q fazes do meu texto, é tua. parece q achas q eu criticar uma intervenção dos bispos equivale a mandá-los calar. e depois não é de vitimização q se trata? miguel, as regras do jogo democrático, creio eu de que, são estas: tu falas e eu, s m apetecer, digo o q m aprouver. se achas q uma crítica é uma ordem d silêncio, devo inferir q m estás a mandar calar, é isso? tem juízo.
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    Miguel Marujo 12.11.2010

    essa da vitimização foi dita por ti, nunca me vitimizei; constato: a igreja fica melhor na sacristi, é o que se extrai de um texto que esquece a substância da intervenção dos bispos de ontem para se ater ao acessório... e isto, é uma crítica, não uma ordem de silêncio, porque aí sim és tu a vitimizar-te.

    conheço bem a ILGA, mas fico a saber que a ILGA existe para apoiar pessoas em dificuldades (expressão usada noutros termos, que eram os termos da conversa, mas estamos semore aprender! achei que era para combater a discriminação e apoiar pessoas que sofrem de discriminação... as dificuldades ficam para as IPSS.
  • Miguel, desta vez discordamos. Não se trata de meter a Igreja na sacristia mas de considerar que o sustento da sacristia não deve ser uma obrigação comum porque a sacristia não é um bem comum. Quanto às declarações dos bispos, fazem sentido, sim, mas mais fariam se o exemplo partisse deles. A Fernanda deixa-lhes aqui uma boa sugestão que prescindam de verbas para  fins religiosos a favor de mais solidariedade.  Concordo com ela. 'Dar comer', para os cristãos, significa, antes de mais, tirar da boca para dar aos outros. E se a  Igreja quiser sair verdadeiramente da sacristia não tem melhor caminho.
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    Miguel Marujo 14.11.2010

    só agora regresso, só agora vos leio:
    «o sustento da sacristia não deve ser uma obrigação comum porque a sacristia não é um bem comum»: lá está Alexandra: não acho que se discuta o sustento da sacristia, mas sim o que está fora da sacristia... e isso faz toda a diferença.
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