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jugular

Quatro reparos e muitos desconcertos - sobre falácias

Fiquei extraordinariamente desconcertada com o desconcerto do Paulo em relação ao Blair Hitch project e mais ainda com o seu conceito de falácia, em particular porque o ilustra, falaciosa e recorrentemente, ao longo de todo o texto. E este foi tão desconcertante que não o consigo discutir de uma assentada, vou primeiro tentar explicar porque é falacioso criticar a proposição ou premissa que foi debatida, «religion is a force for good in the world».

 

Disse o Paulo que era falácia discutir-se, não pela primeira vez nem sequer pela primeira vez neste formato, há cerca de um ano foi debatido na BBC, com resultados ainda mais esmagadores, um tema muito semelhante, a premissa dos argumentos falaciosos que surgem invariavelmente em qualquer discussão de religião, como o nosso espaço de comentários confirma. De facto, o que quer que se discuta, normalmente sobre catolicismo porque em Portugal essa é a religião que inflama ânimos, seja a aversão a contraceptivos da Igreja, a sua homofobia ou misoginia, a existência de Deus, do Diabo ou o livre arbítrio, surge sempre na discussão, como se de um argumento final se tratasse, o Argumentum ad Nauseam de que a religião é uma força para o bem, dá de comer a tantos pobrezinhos e está na vanguarda do tratamento das pessoas com SIDA, logo tudo o mais que afirma é verdadeiro.

 

Quiçá seja útil recordar ao Paulo o que é falácia e, com mais urgência ainda, o que é a lógica informal que estuda as falácias formais e informais que ocorrem quando as pessoas argumentam. O Dicionário de Inglês conciso de Oxford (Concise Oxford English Dictionary) define lógica como «a ciência da argumentação, prova, reflexão ou inferência». Ou seja, é a lógica que permite analisar um argumento ou raciocínio e deliberar sobre a sua veracidade. A lógica não é um pressuposto para a argumentação, é claro; mas conhecendo-a, mesmo que superficialmente, torna-se mais fácil evidenciar argumentos inválidos. E o objectivo de um argumento passa necessariamente pelas razões (premissas) que sustentam uma conclusão. Um argumento é falacioso quando é logicamente inconsistente, sem fundamento, inválido ou incapaz de sustentar o que alega sustentar, isto é, «quando parece que as razões apresentadas, as premissas, sustentam a conclusão, mas na realidade não sustentam».

 

Por outras palavras, o que se discutiu neste debate não foi uma conclusão, foi a premissa de todas as discussões informais e muitas discussões formais sobre religião. E uma premissa não pode ser falaciosa, apenas verdadeira ou falsa e foi isso que se tentou apurar no debate, para evitar sermos mimoseados ad nauseam com argumentos non sequitur, ainda por cima assentes numa premissa falsa, do tipo

 

Premissa 1 - A religião que o argumentador segue diz A

Premissa 2 - Essa religião é uma força para o bem

Conclusão - A é verdadeiro

 

Em jeito de conclusão, percebo que tenhas ficado muito maçado com o debate - e quiçá com o seu desfecho -, que contraria os teus pre-conceitos, que elaboraste ao longo do texto. Assim, acusaste quem o fez de não exibir a subserviência devida à religião o que, como devia ser evidente, não passa de mais uma forma falaciosa de procurar desviar o assunto, que transformaste na questão de saber se o tema em debate é um absurdo indecente que nunca deveria ser debatido, muito menos naqueles moldes, evitando assim a maçada de discutir o que realmente estava em discussão.

A tua reacção é bastante comum, infelizmente, e é a minha crença arreigada de que nela reside a raiz de todos os males, passe a apropriação dos termos. Dever-se-ia fazer uma análise desapaixonada e cuidadosa de todas as ideias, por mais repugnantes que nos sejam: sempre que nos deparamos com ideias ou afirmações que nos ofendem, o melhor é pensar nelas, em vez de, falaciosamente, tentar desviar o assunto. E interrogarmo-nos se realmente conseguimos refutar cabalmente aquelas ideias que nos irritam ou se é precisamente porque não o sabemos fazer que ficámos tão irritados e nos esquivamos sequer a discuti-las.

11 comentários

  • Sem imagem de perfil

    Anónimo 05.12.2010

    Pelo contrário a Palmira não tem razão.

    Diz a Palmira que  «religion is a force for good in the world» é uma premissa, mas trata-se de facto de uma conclusão.
    Uma conclusão é a proposição que se defende num argumento, recorrendo a premissas, e é precisamente essa conclusão que Blair vai defender. Para tal utiliza premissas que podem ser verdadeiras ou falsas.  Como Hitchens teve mais votos, conclui-se que ele demonstrou que essa conclusão assenta em premissas falsas, logo o argumento de Blair é falacioso.

    O Paulo diz duas coisas : primeiro que não se pode, num debate com estes moldes, demonstrar se as premissas são verdadeiras ou falsas. Segundo: não se pode discutir se a religião é boa ou má porque ela não é passiva de juízo moral. Pode-se apenas discutir a religião enquanto instrumento do bem ou do mal porque o uso que se dá a uma coisa já pode ser bom ou mau. O Paulo conclui assim que o debate assenta numa falácia.

    Ou seja, este post da Palmira não responde a nada daquilo que o Paulo diz. Melhor seria deixar as lições de lógica de lado e ir directa ao assunto que verdadeiramente interessa.
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    Palmira F. Silva 05.12.2010

    Nope, até este tipo de debates pelo menos «religion is a force for good in the world» tem sido aceite como premissa  verdadeira e indiscutível para outras argumentações - como as nossas caixas de comentários evidenciam.

    O que se pretendeu avaliar com o debate foi a falsidade ou veracidade desta premissa. Concordo que apenas este debate é insuficiente para se discutir profundamente o assunto mas a minha concordãncia termina aí. O debate foi de facto superficial porque apenas abordou uma premissa muito habitual na argumentação dos crentes e vale por ter demonstrado, à exaustão diria,  que esta premissa não podeser racional ou empiricamente justificada (ou seja, é premissas falsa ou errada que não deve ser utilizada em qualquer tipo de argumentação)


  • Sem imagem de perfil

    Anónimo 05.12.2010

    A premissa é uma proposição que suporta uma conclusão. A conclusão também é uma proposição mas suportada numa ou mais premissas. A Palmira confunde premissa com proposição.

    A conclusão de que a religião é uma força para o bem tem sido aceite como se ela resultasse 1) de premissas verdadeiras e 2) de um argumento bem construído.

    Exemplo:

    Premissa A: Salvar vidas é um bem
    Premissa B : a religião leva a que muitas vidas sejam salvas
    Conclusão: a religião é uma força para o bem

    O argumento é falacioso, não porque as premissas sejam falsa (são verdadeiras), mas porque omite duas premissas: a de que matar é um mal e a de que a religião também leva à morte de muitas vidas.

    Entre os que defendem o contrário comete-se o mesmo erro. Diz-se que (usando o mesmo exemplo) matar é um mal e que a religião leva à morte de muitas vidas, omitindo as outras duas premissas que apontam na direcção contrária.

    Sabendo que a religião tanto é uma força para o bem como para o mal, o propósito do debate é apenas um: determinar se é mais para o mal ou mais para o bem, e é aí que se torna absurda a ideia de que é uma questão que se pode decidir num debate nestes moldes.
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    Palmira F. Silva 05.12.2010

    sigh... e o aborto qu não viesse à baila, sigh again. ao menos estes desconhecidos podiam identificar-se para ser mais fácil distingui-los quando escrevem palermices como esta...
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    12345 05.12.2010

    O aborto? WTF?

    Onde é que eu falei do aborto?

    Parece-me que a Palmira está cansada e já não consegue raciocinar correctamente. O aborto nem me passou pela cabeça. Dei um exemplo baseado no que se discutiu no debate. Então o Hitchens não disse que a igreja católica matou milhões de pessoas com a política do preservativo? E Blair não disse que a igreja católica salvou muitas vidas?

    A partir daqui assino 12345
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    Palmira F. Silva 05.12.2010

    Ah, prontus, o (a?) 12345 até viu o debate. Infelizmente só não se apercebeu de que o que se estava a inferir no debate era se a premissa era verdadeira ou falsa, mas prontus pelo menos viu o debate, o que sempre é melhor que certas pessoas que resolvem criticar o que não viram...
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    12345 05.12.2010

    hahahahaha

    Quer chamar-lhe premissa? Prontus Palmira, chame-lhe premissa. Não é, mas eu deixo-a levar a bicicleta :)
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    Palmira F. Silva 05.12.2010

    bolas 12345, o tema do debate era a afirmação «a religião é uma força para o bem» e o que se debateu no debate foi a veracidade desta afirmação/premissa.

    Só um raciocínio/argumento pode ser falacioso, veja lá se percebe de vez o que está em causa.
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    Ana Matos Pires 05.12.2010

    A razão está do lado do(a)12345, Palmira:


    premissa
    s. f.
    1. Direito paroquial que consiste numa certa parte das primeiras novidades das terras.
    2. Ret. Cada uma das duas proposições de um silogismo (a maior e a menor), das quais se infere ou se tira a conclusão.

    silogismo
    s. m.
    Argumento formado de três proposições; a maior, a menor (premissas) e a conclusão deduzida da maior, por intermédio da menor.
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    Palmira F. Silva 05.12.2010

    Ah, como é que se me escapou as restantes duas proposições na afirmação/proposição is religion a force for good in the world? tsk, tsk, tsk :)

    pior ainda, como é que não me lembrei de ir ao Hoiuass ver o que quer dizer premissa em vez de andar a ler coisas irrelevantes como lógica formal e isso :)
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