Ultrapassar a troika pela direita
Duas ideias têm sido propagadas nas últimas semanas: que o PS, ao contrário do PSD, não tem programa eleitoral; que o memorando é um programa de governo que deixa amarrado o futuro executivo, qualquer que ele seja.
Ambas são falsas. Se o programa do PS não tem tantas páginas como o do PSD, é simplesmente porque não precisa: o PS propõe-se cumprir o memorando com a troika dando continuidade ao trabalho dos últimos anos de qualificação dos recursos humanos, das empresas e do território, e prosseguindo a modernização do Estado social, através do investimento na escola pública, da qualificação de um SNS universal e tendencialmente gratuito e da manutenção de uma segurança social pública.
Ao defender o tributo solidário, o plafonamento da segurança social, o co-financiamento privado no SNS, o cheque-ensino ou o fim do despedimento por justa causa, o PSD opta por um radical e inusitado experimentalismo político-institucional. Porém, uma vez que o memorando da troika não impõe uma ruptura com o modelo social vigente, o PSD deixou de poder usar a intervenção externa como desculpa para tamanho choque liberal.
Não se trata de terrorismo político, apenas perplexidade por ver um partido português ultrapassar FMI, BCE e Comissão Europeia pela direita.
(publicado também no Diário Económico)