Estado e a crise
Ao contrário das alternativas dicotómicas que o Henrique Burnay sugere, a crise actual não exige que se seja pró-mercado ou anti-capitalista. É necessário perceber o que correu mal e aprender com os erros —mas criticar os excessos de uma certa ideologia fundamentalista não implica necessariamente que se salte para o campo oposto; insistir no contrário, Henrique, não passa de uma espécie de chantagem política, que pretende impôr uma falsa alternativa. Se a queda do muro mostrou (para quem ainda não tinha percebido) que o socialismo faliu, esta crise mostrou que o hiper-liberalismo foi pelo mesmo caminho. Torna-se necessário aprender com os erros e falhanços dos dois extremos, procurando uma síntese reconciliadora. Ora, essa é a posição de uma social democracia moderada, que valoriza e reconhece a capacidade do mercado em gerar riqueza ao mesmo tempo que se preocupa com a igualdade de oportunidades e justiça social. Por outro lado, o Bruno Cardoso Reis diz que não é altura para ofensivas ideológicas, pois os tempos exigem pragmatismo. Discordo. O pragmatismo é sem dúvida importante, mas não chega. E não chega porque nunca resolveremos verdadeiramente um problema se ignorarmos as suas causas sistémicas mais profundas (adimitindo que elas existem). Se o crédito barato, que garantiu o acesso a casas e consumo a milhões de pessoas, se mostrou insustentável, não podemos apenas lidar com os seus excessos, limitando-nos a pagar a factura. Torna-se necessário pensar qual a alternativa—que não a do crédito—para a tal prosperidade partilhada que o Bruno (e eu) defende. E isto está longe de se esgotar nesse tal pragmatismo. Adenda: Em resposta ao comentário do Henrique Burnay e à responsabilidade do poder político na crise actual, sugiro (eu queria obrigar, mas não tenho poderes para tal) a leitura deste artigo. Leiam-no, se faz favor, e depois podemos falar da 'culpa' do Fanny e Freddy e do poder político que distorceu o mercado.

