"Melhores cidadãos e melhores pessoas"
1. Este facto, amplamente noticiado e comentado, é retirado deste gráfico do relatório anual da OCDE, Education at a Glance 2011 (página 44 no capítulo relativo ao indicador A2), hoje divulgado:
O gráfico, com dados referentes a 2009, compara com o do relatório do ano passado (ver abaixo), o Education at a Glance 2010 (página 42), que tinha dados relativos a 2008.
Da comparação dos gráficos podemos observar três coisas relevantes:
- Portugal salta da cauda da tabela relativa a 2008 para o topo nos dados de 2009;
- vários países fornecem a informação relativa à idade dos diplomados com o ensino secundário. Portugal é um deles.
- o aumento de diplomados com mais de 25 anos é único factor responsável pela subida de Portugal na tabela.
Sobre isto há três comentários a fazer:
- Podemos discutir se a OCDE faz bem em juntar os diplomados do secundário que são jovens com aqueles que, mais velhos, beneficiam das vias institucionais reunidas sob o programa Novas Oportunidades (programa que, em texto, a OCDE, reconhece estar na base desta mudança na brusca percentagem de diplomados do secundário - embora a OCDE faça o mesmo, naturalmente, com todos os países com programas semelhantes). Eu próprio tenho algumas dúvidas da decisão - para além de tudo, ela presta-se ao aproveitamento político a que já estamos habituados.
- No entanto, não se pode dizer que o que está em causa esteja particularmente camuflado: o gráfico mostra-nos que 63% dos jovens com menos 25 anos havia terminado o secundário; em 2008, o valor atingira os 58% (recorde-se que o valor estava nos 51% em 2005).
- A OCDE podia disponibilizar informação mais clara que permitisse distinguir, de forma mais clara, nas tabelas do indicador A2 (página 54 à 58 do relatório), o que considera general programmes e pre-vocational/vocational programmes.
2. Nuno Crato apressou-se a dizer que a inclusão dos alunos do Novas Oportunidades "inflaciona em muito os números" - o que se percebe - e que a relatório "esconde a realidade" - sem que se perceba bem que "realidade" está em causa. (by the way, imaginam o que se diria de um(a) ministro(a) socialista que dissesse que um relatório internacional da OCDE "esconde a realidade"? Era o provincianismo sem limites). Talvez se queira reportar à qualidade dos conhecimentos e competências ministradas. Se assim é, Crato podia dizer que aguarda serenamente os resultados do PIAAC - Programme for International Assessment of Adult Competencies, uma espécie de PISA para os adultos, que começou a ser concebido em 2008, está - diz a OCDE - a ser aplicado este ano, e terá os resultados publicados em 2013. Mas isso seria dar demasiada credibilidade a estudos internacionais - os mesmos que, neste livro, eram utilizados para demonstrar a cegueira dos então responsáveis da área da educação. Já sabemos que a OCDE, tantas vezes a prova da ignorância dos portugueses, já não tem credibilidade nenhuma.
Pelo menos em parte, Crato quer referir-se à empregabilidade dos diplomados do Novas Oportunidades. Para que serve o canudo, afinal? A preocupação faz, se não for redutora e estiver devidamente enquadrada, todo o sentido. Sobre isto, há a lembrar, porém, para que a avaliação seja minimamente séria - e ninguém esperaria o contrário de alguém que acusa os outros de manipuladores - que a evolução do mercado de trabalho, em particular a partir da segunda metade de 2008, seja tida em conta. Seria no mínimo estranho que, depois da crise internacional ter provocado uma forte subida do desemprego (em Portugal e lá fora), a maioria dos diplomados do Novas Oportunidades tivessem grandes hipóteses de traduzir as competências e a sua certificação em novos empregos quando largos milhares de postos de trabalho eram destruídos todos os meses.
Mas sublinho o "se não for redutora". O impacto positivo da educação (e da certificação do conhecimento obtido ao longo da vida - a não ser que queiram defender que na vida profissional as pessoas não aprendem nada) não se resume à empregabilidade. A educação, como alguém disse recentemente, “liberta e vale por outras razões. Por exemplo, pela "capacidade" que dá nos para sabermos ouvir "um poema de Fernando Pessoa, gostarmos e percebemos [o] poema. A educação eleva as pessoas”, e torna-as “[m]elhores cidadãos e melhores pessoas.” As palavras não são de nenhum filósofo romântico, mas do próprio Nuno Crato, e foram proferidas há um par de semanas na Universidade de Verão do PSD.
Melhores cidadãos e melhores pessoas. Gostava de saber qual é a parte da avaliação ao Novas Oportunidades que vai analisar isto.