Moralismo redux
Camilo Lourenço, um homem que 'domina as matérias' e que só fala daquilo que sabe, decidiu criticar António José Seguro por este ter dito: 'é tão importante exigir consolidação aos países que têm desequilibrios como os que têm excedentes que coloquem esse dinheiro para dinamizar o consumo interno'. Camilo Lourenço acha que este raciocínio está errado porque a poupança é uma coisa positiva. Não lhe ocorre pensar que Seguro limita-se a constatar uma evidência: se os défices são um desequilibrio, então, os excedentes também têm de ser considerados como tal. Caso contrário, saímos do campo da economia e entramos do puritanismo moralista, onde a poupança é sinal de virtude e os défices a prova da degenerescência moral dos incapazes. De acordo com esta lógica moralista, o ajustamento deve caber exclusivanente aos devedores, que estão em pecado e, por isso, têm de sujeitar as suas economias a uma austeridade regeneradora, sem a qual a salvação não é possível. Já os credores, que são o exemplo da virtude e da prudência, não têm de fazer nada. Este moralismo tem um problema: para além de injusto, é macroeconomicamente insustentável. Para Camilo, a solução para reequilibrar a Europa passa por todos os países se tornarem em pequenas Alemanhas. Que isto seja uma impossibilidade (matemática) é coisa que não preocupa Camilo. O que Seguro diz já tinha sido defendido por Keynes, em Bretton Woods. Infelizmente, os Americanos recusaram as suas propostas. Uns anos depois, com a Europa devastada pelo desemprego e pela recessão, a necessidade de criar o Plano Marshall acabou por dar razão às ideias de Keynes. Ao contrário do que pensa Camilo, Seguro não quer penalizar quem poupa. Quer, isso sim, assegurar que o moralismo defendido por pessoas como Camilo Lourenço não acabe por penalizar tanto quem deve como quem poupa.