11 músicas que me fazem chorar
Pois é assim a vida, há quem se comova a ver o seu clube de eleição a levar abadas (daqui a pouco haverá lágrimas e ranger de dentes algures), a ver a novela, a olhar para quem é expulso da Casa dos Segredos ou à saída de "O Campeão"; desculpem, metade das gentes não saberá do que falo, mas uma imagem indelével que guardo de criança é ver a quantidade de olhos vermelhos e maquilhagens esborratadas - nem falo da sinfonia de fon fon fon no escurinho - à saída deste filme, quando o pai da magnífica morre no ringue e o puto cai num pranto (a realização de Zeffirelli não deixava, de facto, grandes alternativas). Há, também e evidentemente, aqueles que sofrem sentidas comoções ao ver as contas a aumentar e os rendimentos a minguar. Cheira-me, aliás, que é uma comoção com excelentes perspetivas de crescimento para o ano que agora começou. Eu, por formação, educação, personalidade e, sobretudo, sorte, não me incluo em nenhum destes. Porém, o Criador (ou Grande Arquiteto, em jeito de piscadela de olho à atualidade jornalística), a quem eu chamaria de Supremo Ironista, não me deixou seco de lágrimas: fez-me pé-de-chumbo, duro de ouvido, incapaz de ler uma pauta, inábil de tocar o que quer que seja, desajeitado para tocar duas notas, desafinado a cantar whatever, inapto para a assobiadela ou para o trauteio. Talvez por isso, o que para o comum dos mortais será possivelmente banalidade cósmica é para mim mistério transcendente: a música. Por isso, sou particularmente sensível a ela. E à medida que cresci tornei-me exigente com aquilo que oiço: quantas desilusões tenho apanhado ao voltar a ouvir coisas que, na minha juventude, considerava pérolas inestimáveis, e que agora não passam de ruído nos meus tímpanos. Sigh!
A música é uma linguagem universal, é uma das minhas convicções. É, aliás, um dos pilares da minha prudência agnóstica que me impede de resvalar para a ferocidade ateia. Não há como a música para revelar o divino nos homens e para humanizar os deuses, convicto que estou - não percam tempo a contradizer-me e a invocar exemplos, por favor - que música e desumanidade são incompatíveis, que nenhum verdugo alguma vez ouviu Mozart e que não há monstro, ditador, carrasco ou torturador melómano.
Dito isto, e porque os tempos sombrios que se avizinham convidam à reflexão sobre as qualidades humanas, as emoções e os sentimentos, decidi fazer uma seleção de músicas que me causam uma comoção especial (escolher "11 músicas preferidas" seria banal e desinteressante), com inputs causais diferentes e outputs lacrimais igualmente distintos. Quem sabe se não toco alguma corda sensível que permita a alguém começar o dia com um ato mais compassivo, tolerante ou sorridente, e nunca é de excluir um qualquer "efeito borboleta". A seleção foi divertida, como se pode imaginar, e a "prova de admissão final", muito estranha para quem observasse. Vão todas propositadamente mal identificadas para torturar quem as ouve: é que por cima desta alma sensível está uma carapaça perversa de Ming the Merciless. E já agora: o número 11 não é nenhuma alusão cabalística bizarra; escolhi 10, depois lembrei-me de mais uma, as outras encostaram-se um bocadinho e couberam todas. Pronto. 11 dias, 11 músicas. A primeira vem já ali ao fundo.