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adenda ortográfica

O post duplo que escrevi ontem mereceu comentários interessantes. A maior parte eram puros disparates ou "tiros ao lado". Uma das questões mencionadas dizia respeito ao facto de eu apresentar argumentos "políticos" (sic) em vez de filológicos. Gosto de escrever sobre domínios de que possuo algum conhecimento. Como sou historiador, resvalo facilmente para esse campo, até em assuntos tão atuais como o Acordo Ortográfico. Daí o tom José Hermano Saraiva. Um meio-homónimo meu prestou-se a completar o que escrevi com alguns argumentos filológicos. Não os sei avaliar, mas agradeço a atenção e espero que contribua para o debate sobre este assunto. Eis o texto que me enviou o Paulo Porto:

 

"Alguns leitores queixaram-se que o Pinto não apresentou argumentos filológicos nos últimos posts sobre o AO. Em complemento ao argumentário do Pinto, aqui ficam argumentos filológicos sobre o assunto.

No que respeita a Portugal, a principal alteração do AO de 2008 é a eliminação das consoantes mudas. Esta eliminação tem fundamento filológico válido e chega com 100 anos de atraso.

Na reforma unilateral portuguesa de 1911, aquela que, pela primeira vez separou a ortografia usada em Portugal e no Brasil, entendeu-se que, por regra, eram suprimidas todas as consoantes mudas, excepto aquelas que, supostamente, serviam para abrir a vocalização da vogal átona anterior.

Exemplos: direcção, inspecção.

Este critério mostrou-se incongruente e completamente erróneo por dois motivos:

1º É falso que em português as consoantes mudas condicionem a pronuncia da vogal átona anterior como se evidência pelos dois tipos de exemplos seguintes:

Exemplos de palavras com consoante muda que não abre a átona anterior: actuar, actual, caracteres, tactear.

Exemplos de palavras com vogal átona que se pronuncia aberta apesar de não serem seguidas por consoante muda: bebé, corar, inflação, invasão, obrigado, opaco, opinião, ortografia, padeiro, retórica, republica, vadio, etc.

2º Com a excepção referida acima, a regra da reforma de 1911 foi a supressão das consoantes mudas. Esta regra englobou a supressão de inúmeras consoantes mudas que eram precedidas de vogal átona aberta. Nesses casos, mais de 100 anos depois, continuamos a pronunciar a átona aberta sem necessidade do auxílio de uma consoante muda:

Exemplos de palavras que perderam consoante muda e que continuam a ser pronunciadas em Portugal com átona aberta: Official, occidente, occorência, occulto, opposto e muitas, muitas mais.

No que respeita às consoantes mudas, o AO de 2008 vem pôr fim a esta incongruência grosseira da reforma unilateral portuguesa de 1911, e permite quase uniformizar as ortografias portuguesa e brasileira.

Para a generalidade de nós, a uniformização da ortografia é uma vantagem e vem equiparar o português aas outras línguas internacionais de ortografia uniformizada – francês, espanhol, árabe, alemão - apesar de todas estas terem diferenças bem maiores do que o ptpt e o ptbr.  A excepção a esta regra é o inglês, mas o português não compete com o inglês, compete com as línguas internacionais mencionadas.

No entanto, para minorias intelectualmente empedernidas e para o lobby dos editores e tradutores, a LP não pode ser uma língua universal com ortografia uniforme. Para estes, e ao contrário do que fazem os falantes de espanhol, árabe, francês ou alemão, a LP tem de ser encarada como um ghetto, ou um conjunto de ghettos. Para os intelectualmente empedernidos e para aqueles que vivem da traficância entre ghettos, o AO de 2008 é uma tragédia."

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