O optimismo dos cegos
No Prós e Contras de ontem, Carlos Moedas garantiu que o ajustamento da economia portuguesa está a ser um sucesso: o défice externo não só está a cair como ficou mesmo abaixo do esperado, e as exportações, depois de um mau mês de dezembro, voltaram a crescer a um excelente ritmo, como no ano de 2011. Tudo boas notícias, portanto. O problema é que, para além de não referir que parte do 'sucesso' da redução do défice externo se deve a uma queda da procura interna mais acentuada do que estava previsto, o que não pode ser considerado positivo, Carlos Moedas parece achar que o comportamento passado das exportações permite projectar tendências. Era bom que assim fosse. Infelizmente, não é. As exportações existem, não porque no passado houve exportações, mas porque houve encomendas. Se não houver encomendas, as exportações caem. Vejamos o que nos diz o INE sobre a evolução das encomendas:
O nosso Índice de Novas Encomendas na Indústria acentua variação homóloga negativa O índice de novas encomendas recebidas pelas empresas industriais registou uma diminuição homóloga de 8,4% em janeiro (redução de 7,7% no mês anterior). Este comportamento foi determinado pela evolução do índice relativo ao mercado externo, que passou de uma variação de - 9,5% em dezembro para -11,3% em janeiro. As novas encomendas com origem no mercado nacional diminuíram 4,4% (redução de -5,3% no mês precedente).
Ao contrário do que deseja diz Carlos Moedas, não há qualquer razão para estar optimista. Se queremos mesmo saber o que vai acontecer às nossas exportações, a melhor previsão que temos é a que consta do gráfico abaixo:
O Governo pode dizer o que quiser sobre reformas estruturais redentoras e sobre o sucesso do ajustamento português. No mundo real, as únicas transformações estruturais vísiveis são o agravamento da recessão, o aumento do desemprego, a queda do investimento público e privado e um sector exportador com as encomendas em retracção. Em suma: uma economia bloqueada. E as más notícias, infelizmente, não acabam aqui. O Pacto Orçamental recentemente aprovado e que este governo entusiasticamente apoia, se for mesmo para levar a sério, vai constitucionalizar a austeridade e comprometer a economia europeia com uma estratégia de desalavancagem colectiva que irá inevitavelmente resultar numa profunda recessão. Tirando tudo isto, sim, está tudo a correr muitíssimo bem.