Voodoo economics
O ministro das Finanças afirmou hoje que as reformas estruturais podem traduzir-se num aumento do PIB de cerca de 5% nos próximos cinco anos, segundo alguns estudos, mas o governo "simplesmente não sabe" ainda qual o impacto específico. (Negócios)
Em Londres, numa resposta a um português chamado Tomás (aqui, a partir do min 59), Gaspar explicou quais os estudos a que se referia. Ficamos a saber que afinal não há propriamente estudos. Há, por um lado, a recente experiência alemã, que, segundo Gaspar, é a demonstração empírica do sucesso das famosas reformas estruturais nesse país, e, por outro, os modelos de equilibrio geral utilizados pelos bancos centrais, que nos garantem que aquilo que aconteceu na alemanha, desde que se façam as reformas estruturais, pode acontecer a qualquer um.
Quando Gaspar diz que as reformas estruturais podem traduzir-se num aumento de PIB de cerca de 5% nos próximos cinco anos, está realmente a dizer o seguinte: num modelo de uma pequena economia aberta onde existe concorrência monopolística no mercado de trabalho e no sector de bens não transacionáveis, a redução de markups - salários e preços acima daquilo que seria o equilíbrio concorrencial - resulta num aumenta o PIB potencial em 5%. E aqui entramos no mundo da transformação estrutural da economia portuguesa, o projecto dilecto de Gaspar.
Como é que Gaspar sabe que as reformas estruturais aumentam o PIB potencial da economia portuguesa? E como é que sabe que esse aumento é de 5%? Vamos por partes. Numa situação de concorrência monopolística a remuneração dos factores não é igual à sua produtividade marginal, o que reduz o potencial produtivo de uma economia. Isto acontece por definição. Daqui se deduz - que não é o mesmo que fazer um estudo - que, eliminando um conjunto de rigidezes, isto é, aproximando a economia do ideal da concorrência perfeita, estamos a tornar os mercados mais eficientes e, portanto, mais produtivos. As reformas aumentam o PIB potencial porque é isso que significa promover a concorrência e a flexibilidade dos mercados. É uma questão puramente conceptual, axiomática. Ser 5%, 2% ou 10% resulta do modo como se martela parameteriza e calibra o modelo recorrendo a complicadas técnicas estatísticas. Há quem lhe chame ciência, mas estes modelos estão mais próximos do voodoo. E é isto, no fundo, que nos promete Gaspar: com ou sem 'impactos específicos', trata-se de um futuro radioso garantido por modelos DSGE.