Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

jugular

jornalistas de choque

Na Catalunha, há vários anos que os jornalistas usam coletes e braçadeiras distintivas em situações ditas "de conflito". É o caso das manifestações. Na de ontem, em Barcelona, havia dezenas de coletes laranja no meio da multidão e atrás das linhas policiais, e é algo que nenhum dos repórteres que abordei põe em causa: "Estamos aqui a trabalhar, não para apanhar."

 

Os coletes, aliás, surgiram porque os jornalistas não raro apanhavam e, como me disse um fotógrafo, "os Mossos de Esquadra quando batem, batem a valer". O argumento de que assim os jornalistas se estão a colocar num plano diferente do das demais pessoas, arrogando-se uma proteção especial, não cala, parece, entre os profissionais catalães; aliás, o uso deste tipo de identificação foi solicitado pelo Colégio de Periodistas da Catalunha. E diz-se solicitado porque os coletes têm de ser numerados e intransmissíveis, custam dinheiro e são como que "alugados", tendo de ser requisitados de novo de dois em dois anos. Ou seja: são um controlo do Estado, através do ministério que tutela as polícias.

 

Poder-se-á dizer que também a carteira de jornalista é, em Portugal, uma forma de controlo estatal dos jornalistas, já que a entidade que a concede (mediante pagamento, de resto) é criada pelo Estado; e que se trata igualmente de uma forma de distinção em relação aos demais cidadãos.

 

Mas não só se dá o caso de mesmo com colete e braçadeiras os repórteres catalães continuarem a levar encontrões da polícia (facto denunciado há um ano pelo Colégio, aquando do movimento 15 de Maio) como o que está em causa na proposta feita pela PSP na sequência dos inaceitáveis incidentes do Chiado é uma espécie de "carta branca para agredir", como se só admitisse errar quando bate em jornalistas (só porque sobre eles não pode inventar histórias de provocações e agressões). Estando-se a falar de polícias e não de feras, de gente supostamente submetida a treino, a educação legal e a uma cadeia de comando e não de delinquentes primários, o argumento de que bateram nos jornalistas porque estes não estavam identificados é infame. E é-o porque implica que bater em quem nada estava a fazer que justificasse baterem-lhe só é digno de nota por se tratar de repórteres.

 

Talvez seja preciso recordar às polícias e governos portugueses que o uso da força de que detêm o monopólio nos regimes de Direito democrático serve para defender os cidadãos, não para vingar a honra dos agentes ou afirmar essa coisa chamada "autoridade do Estado".

 

Como cidadã, que sou antes, durante e depois de jornalista, não admito que seja preciso usar colete pirilampo (e, já agora, à prova de bala, mais viseira e capacete?) para ter, numa manifestação, a esperança de não ser espancada porque sim. Se temos polícias e governantes que não conseguem distinguir sobre quem podem e devem usar de violência com proporção e na medida da necessidade, é de coletes de forças e grades que precisamos.

 

(publicado hoje no dn)

10 comentários

Comentar post

Arquivo

Isabel Moreira

Ana Vidigal
Irene Pimentel
Miguel Vale de Almeida

Rogério da Costa Pereira

Rui Herbon


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Comentários recentes

  • Anónimo

    The times they are a-changin’. Como sempre …

  • Anónimo

    De facto vivemos tempos curiosos, onde supostament...

  • Anónimo

    De acordo, muito bem escrito.

  • Manuel Dias

    Temos de perguntar porque as autocracias estão ...

  • Anónimo

    aaaaaaaaaaaaAcho que para o bem ou para o mal o po...

Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2014
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2013
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2012
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2011
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2010
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2009
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2008
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2007
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D

Links

blogs

media