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VD e saúde (I)

A violência doméstica (VD) contra as mulheres é um problema social que, embora amplamente reconhecido, não é  identificado e denunciado com o devido rigor, o que o torna sub-diagnosticado.

 

Para além dos aspectos sociais e legais que encerra, a saúde física e psíquica da mulher vítima de VD está ameaçada e, por isso, torna-se necessário abordar a questão também como um problema de saúde, não só nas suas implicações agudas mas, e sobretudo, nas sequelas crónicas que determina.

 

A OMS, pela mão de Margaret Chan, dizia em 2009 a "Prevenção da violência contra a mulher exige uma abordagem multi-sectorial, e, neste contexto, o sector de saúde tem um papel central a desempenhar. Este papel inclui ajudar a identificar o abuso precoce, proporcionando às vítimas o necessário tratamento e encaminhamento das mulheres. Promissoras estratégias de saúde pública incluem mudanças de atitudes que promovam o fim da violência e da desigualdade de género, ajudando as mulheres a tornarem-se financeiramente independentes, fortalecendo a sua auto-estima e reduzindo o consumo excessivo de álcool.".

Inúmeras vezes a porta de entrada para a assunção do problema faz-se através dos serviços de saúde, pelo que um  maior envolvimento desses serviços no diagnóstico da situação é desejável e mandatório. Para que tal aconteça é fundamental, num primeiro momento, perceber quais são os principais entraves à ”descoberta” do problema. Ellsberg dividiu as razões em dois grandes blocos, de um lado as dificuldades das mulheres em denunciar o sucedido e, do outro, as dos agentes de saúde em as questionar sobre ele.

 

Sentimentos de vergonha e de humilhação, culpa, receio da culpabilização de terceiros, más experiências passadas face ao pedido de ajuda, medo pela sua integridade física e pela dos filhos, dependência emocional ou material do agressor ou esperança na mudança do seu comportamento são algumas das principais razões que levam a mulher vítima de VD a não falar sobre o sucedido.

 

Do lado dos prestadores de cuidados de saúde existem, para além de pouco conhecimento e baixa sensibilização para o tema, um conjunto de crenças que contribuem para que o assunto não seja pesquisado. São disso exemplo acreditar-se que as mulheres “gostam” de ser agredidas, caso contrário não permaneceriam na relação, ou que a VD é um problema social e legal mas não uma questão de saúde pública. O sentimento de impotência face ao tema, a convicção de que a violência é um problema pessoal e privado e que, por isso, os profissionais não têm o direito de se intrometer neste tipo de assunto e a possibilidade das mulheres se ofenderem quando directamente questionadas, do mesmo modo que a falsa crença de que as mulheres mais diferenciadas e de nível socioeconómico mais elevado não são alvos comuns deste tipo de actos, são aspectos a ter em conta. Outros factores importantes dizem respeito à pouca disponibilidade prática por via do excesso de trabalho, em particular num contexto de urgência, e a eventuais experiências próprias, como vítima ou agressor(a), dos trabalhadores da saúde. Acresce, sobretudo nos meios mais pequenos, o medo das represálias. 


Ultrapassar estas dificuldades é o objectivo primário, sobretudo porque são elas a determinar não só um diagnóstico inicial deficiente como a impossibilidade de desenvolver programas de intervenção eficazes, dirigidos às necessidades clínicas reais destas mulheres. Há, portanto, que informar para melhor assistir.

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