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Extraordinária ciência

Segundo Thomas Kuhn, há momentos na história em que as mudanças de paradigma transformam a ciência “normal” em ciência “extraordinária”. Podemos estar a testemunhar um desses momentos. Depois do Bosão de Higgs, na Física, temos agora o parecer dos Professores da Universidade Lusófona, António Fernando Santos Neves e José Fialho Feliciano, que vem revolucionar tudo aquilo que julgávamos saber acerca das modernas ciências sociais. Esse documento científico, descoberto hoje, diz respeito ao pedido de reconhecimento e creditação de competências apresentado por Miguel Relvas no âmbito da licenciatura em Ciência Política. Estes professores defendem a tese segundo a qual «A informação constante do currículo do candidato denota uma elevada experiência profissional», o que justifica o reconhecimento pedido. E como manda o método da falsificação de Popper, procuram testar empiricamente as três hipóteses explicativas que a acompanham.

Hipótese 1: O requerimento do aluno Relvas justifica-se por causa do «exercício de cargos públicos». Neste aspecto, «O currículo do candidato enquanto deputado, garantiu-lhe a aquisição de competências relevantes na área de estudo a que se candidata, Ciência Política, nomeadamente aquelas que dizem respeito [entre muitos outros] ao funcionamento dos sistemas eleitorais». Bastará passar pelos corredores da Assembleia da República para ouvir os deputados a dissertar sobre o método d’Hondt e as vantagens do sistema maioritário a duas voltas em relação ao sistema de voto alternativo. De resto, «No desempenho de cargos governativos, o candidato detém experiência em cargos ao mais alto nível, o que implicou profundo relacionamento com matérias do foro legal». Pode perguntar-se o que faziam os assessores jurídicos a que Relvas teve direito durante o desempenho desses «cargos ao mais alto nível». Mas os Professores Santos Neves e Fialho Feliciano sugerem a resposta: estavam a aprender «matérias do foro legal» com Miguel Relvas. 

Hipótese 2: O requerimento do aluno Relvas justifica-se por causa do «exercício de cargos políticos». A este propósito os autores lembram «O enquadramento de actuação das organizações de juventude partidária em Portugal» e asseguram mesmo que «o profundo envolvimento nessa realidade» pode «promover a aquisição de competências transversais de compreensão do papel de diferentes classes sociais e elites na modelação da sociedade». Infelizmente para Relvas, «a discussão curricular não permitiu, no entanto, afirmar que o candidato possuísse competências no que concerne ao conhecimento mais profundo da teoria do Estado e sua relação com fenómenos de democratização ou revolução». Por não referir a leitura de Marx, Tocqueville ou Skocpol no currículo? Não: isso são referências datadas. A prosa dos sábios da Lusófona é necessariamente densa, mas, fazendo agora de Fátima Campos Ferreira a falar do Higgs, parece-me que o que eles estão a tentar dizer é que a obrigatoriedade do famoso exame de Teoria do Estado, da Democracia e da Revolução se deve apenas ao facto de Relvas não ter estado na Assembleia da República entre 1975 e 1984, período em que podia ter aprendido muito sobre revolução e democratização.

Hipótese 3: O requerimento do aluno Relvas justifica-se por causa do «exercício de funções em domínios empresariais ou de intervenção social e cultural». De facto, «O terceiro domínio de experiência profissional declarada concerne essencialmente ao exercício de funções no domínio empresarial, embora também integre alguma experiência no domínio dos socio-media e de intervenção cultural», destacando-se, neste último domínio, a já conhecida experiência na Associação do Rancho Folclórico de Tomar. Aparentemente, «Para além das competências básicas ao nível da compreensão das organizações, e fenómenos associados que esta experiência acarretou, ela envolveu componentes de internacionalização, nomeadamente no espaço lusófono». Claro que isto não podia deixar de ser valorizado pela Universidade Lusófona.

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