«O mundo misterioso de Vítor Gaspar»
É o título do texto que Maria Henriques Espada publica hoje na Sábado. Foi em Fevereiro de 1991, nas páginas do Independente, que o país ouviu falar pela primeira vez de «um génio das finanças» - um «Mr Wonderful» que era o «braço direito do Ministro Miguel Beleza». Destes epítetos, Gaspar recusou o último, de uma forma que já fazia adivinhar o desastre que estava para vir: «Miguel Beleza é um homem muito apto fisicamente e se tem um braço direito, é o dele. Não precisa de próteses». Hoje, o Gaspar “Mr Wonderful” de que falava O Independente de Paulo Portas foi substituído pelo Gaspar “Cannibal” Lecter de que fala uma troca de emails no CDS de Paulo Portas, reproduzida pela Sábado.
O que se passou entre um momento e o outro? Depois da passagem pelo Terreiro do Paço, este «aluno brilhantíssimo» do brilhantíssimo professor António Borges rumou a Frankfurt, onde fica o BCE. Gaspar ficou tão marcado por essa experiência que está sempre a falar do «método do BCE». Parece que resolve todas as diferenças de opinião com um «no BCE era assim». Passos Coelho, por seu lado, responde invariavelmente aos restantes ministros com um «o Vítor não pensa assim». E contra argumentos destes não há factos que nos valham.
Seguiu-se Bruxelas, onde o esperava um cargo no Bureau of European Policy Advisers, conhecido na gíria eurocrática por BEPA. Mal chegou ao BEPA «uma das primeiras pessoas que quis cumprimentar foi Maria da Graça Carvalho». Por ser portuguesa? Não, Gaspar não é nenhum provinciano: «é que ela tinha mais publicações científicas do que eu». Um feito extraordinário que não estaria certamente ao alcance daquele beirão que aterrou no Conselho de Ministros de Passos vindo de uma universidade obscura do Canadá: «Nem o conheço», terá dito Gaspar quando lhe falaram do nome apontado para a pasta da Economia. O respeito que Gaspar tem por Álvaro resume-se nesta pergunta que lhe fez em plena reunião do Conselho de Ministros: «Não há dinheiro: Qual destas três palavras não percebeu?».
Em Bruxelas, Gaspar deixou uma imagem de desconforto. Uma vez, em plena hora do almoço, arrastou os colegas para «um exercício muito engraçado: aplicar às teorias kantianas equações usadas em econometria». Nem todos acharam muita graça ao exercício: «Um dos então espectadores reconhece que houve algum constrangimento no ambiente – haveria formas mais divertidas de passar a hora do almoço». Mas agora, de regresso ao seu país, Gaspar não se pode queixar da falta de sentido de humor que sentiu noutras paragens. Na sequência da decisão do Constitucional, Gaspar terá dito ’Estava tudo a correr tão bem, pena é a realidade’». E, depois da TSU, do IMI e do «enorme aumento de impostos», um dos interlocutores «confessa não saber ainda hoje se ele estava a tentar fazer uma graça ou se falava a sério».