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31 de Cavalaria

Vamos imaginar uma qualquer multinacional (veio-me à cabeça a Union Carbide) que tenha causado considerável dano a um país asiático ou africano. Vamos imaginar uma qualquer empresa portuguesa que também se tenha portado mal. Ou vamos imaginar uma ideologia, um indivíduo, uma arma, uma estirpe de vírus, um hábito de consumo, o que quiserem. Algo que tenha causado devastação. Um porta-voz espertalhaço poderia justificar o acto dizendo que Luís de Camões também diz, n'Os Lusíadas, que os reis de Portugal "as terras de África e de Ásia andaram devastando". Todos nós ouviríamos a explicação mal enjorcada e acharíamos um disparate.

Pois no 31 da Armada não é bem assim. Nuno Miguel Guedes mete paninhos quentes na língua destravada do Presidente da República, a propósito do "dia da Raça". Bastava dizer que "foi erro, pá, nunca se enganaram?". Nada disso. Pelo contrário. Não foi erro nenhum, foi apenas o uso do "sentido em que era usado no século XVI, significando gesta, povo, colectivo". Uma bela lição de patriotismo, afinal, e os cães (rafeiros, provavelmente) do Bloco de Esquerda deviam ladrar menos e ler mais Camões, que é o que lhes falta. No fundo, basta que qualquer expressão venha nos Lusíadas para poder ser usada. Eu sugiro então que, das próximas vezes que alguém vier falar da al-Qaeda, não mencione "terrorismo" mas sim "Maura lança" (imaginar Bush como D. Sebastião e "novo temor da Maura lança" enche-me o peito). Adiante. Tudo isto são divagações mais ou menos prosaicas. Gostava era que o ilustre blogger, uma vez que parece versado em epopeia camoniana (ao contrário dos analfabetos detractores do Chefe de Estado), nos ilumine com a informação devida acerca da fonte. Ou seja, que nos diga onde é que n'Os Lusíadas consta exactamente esse conceito de "Raça" (sim, com maiúscula) que tanta tinta tem feito correr. É que eu, na minha modesta ignorância, percebi que a edição que possuo deve estar truncada, certamente expurgada, por um qualquer censor comunista, dos maravilhosos conceitos patrióticos do Poeta. Na verdade, apenas encontrei uma referência, no Canto Décimo (100) que, se aplicada conforme as disposições do blogger, não será muito abonatória dos nautas lusos, nossos egrégios avós, ali cantados: "Olha as Arábias três, que tanta terra/ Tomam, todas da gente vaga e baça,/ Donde vêm os cavalos pera a guerra,/ Ligeiros e feroces, de alta raça". Aguardo, portanto, esclarecimentos. É que o blogger diz que "a raça (...) neste contexto somos nós" e eu, apesar de pouco dado a tiques de sangue azul, não fico lá muito satisfeito por ser comparado a um cavalo árabe, ainda que ligeiro e feroz. Talvez para quem se considere um jumento seja um elogio, mas eu ainda vou mantendo algum amor-próprio.

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