Até no Burkina Faso
O Diário Económico resolveu trazer para a capa uma manchete muito intrigante. Intrigante porque li de fio a pavio o Education at a Glance 2012, a suposta fonte de tão surpreendente afirmação, sem deparar com semelhante coisa. Peguei outra vez nos ficheiros excel do relatório e, como expectável, confirmei que a dita cuja manchete é totalmente falsa. Já a notícia que supostamente apoia a manchete é um tratado de como bem aldrabar o leitor sem incorrer em mentiras. Passo a explicar, começando pelo parágrafo mais enganador:
"Actualmente, é o Estado que financia na totalidade a escola pública até ao 12º ano, ano em que termina a escolaridade obrigatória, uma característica que Portugal partilha apenas com a Suécia."
Depois do título bombástico (e completamente falso, repito) quem leia este parágrafo não lê que só em Portugal e na Suécia são 12 os anos de escolaridade obrigatória, pensa que só em Portugal e na Suécia é gratuito o ensino obrigatório, ideia falsa que é reforçada nos restantes parágrafos. O parágrafo que se segue começa com um argumento de autoridade, o relatório da OCDE, para rematar com uma Lapalissada que diz apenas que existem escolas privadas em "Espanha, Irlanda, Itália e França", e no resto do mundo acrescento, mas sugere que há propinas nas escolas públicas destes países - o que, mais uma vez, é falso.
Para esclarecer o que se passa com a Educação de facto nada melhor que um exemplo do "campeão" do Estado social, esse país de brandos costumes conhecido por Estados Unidos da América. Embora não chegue aos extremos da Finlândia, num Estado tão "socialista" como o Texas foi manchete há pouco mais de um ano o escândalo de em alguns distritos pretenderem cobrar 30 dólares por mês pelo autocarro que transporta as criancinhas de casa para a escola totalmente gratuita, material escolar essencial inclusive.
Ou seja, em toda a OCDE, EUA incluídos, tal "Como em todos os países desenvolvidos, a educação primária e secundária é gratuita, universal e obrigatória". Não sei qual foi o objectivo da jornalista ao escrever esta coisa inenarrável mas percebe-se o objectivo de quem propôs a medida: como andámos a viver acima das nossas possibilidades, dizem, está na hora de nos remetermos ao nosso verdadeiro lugar, um lugar que em termos de educação devem considerar no clube dos sub-desenvolvidos. Enfim, de alguns países sub-desenvolvidos, até no Burkina Faso a escolaridade obrigatória é gratuita...