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A quem tem sempre presente o risco implícito costumamos chamar paranóico. Mas talvez nós, os citadinos que não hesitam em mergulhar no corpo a corpo do metro ou do autocarro, que se sentam no escuro do cinema ao lado de desconhecidos, que atravessam ruas na crença de que os carros vão parar nos vermelhos e levantam dinheiro no multibanco sem guarda armada, sejamos o oposto igualmente extremo disso. Há um acto de fé inconsciente (e olha o pleonasmo) no nosso quotidiano, um heroísmo distraído, doce, em cada passo. Sim, cremos na civilizada convivência, na fundamental beatitude dos nossos semelhantes; sim, acreditamos que é possível viver em paz, e que é isso que todos queremos. Sabemos que, mesmo com Hobbes a garantir o contrário, não há polícia nem forças armadas nem leis e penas que cheguem para certificar isso; é uma decisão de cada um que permite esta trégua. Sabemos que pode mudar tudo de repente – mas na verdade não, não sabemos, não, não queremos saber. Confiamos por princípio, porque desconfiar por princípio, conformarmo-nos com a ideia de uma ameaça permanente, generalizada, é o inferno.
Esconjuramos nas histórias de faroeste – de que as novelas de Cormac McCarthy são o expoente cruel -- o avesso dessa tranquilidade nem sequer calculada. E em dias como 11 de Setembro de 2001 damo-nos conta de viver um milagre permanente. Neste décimo aniversário, celebremos isso: o pacto que nos une, a nossa determinação de vivermos juntos, misturados, desarmados, ombro a ombro, e, quando necessário -- sempre que necessário, para defender esta que é a mais preciosa e fundamental das nossas conquistas, a rua livre, pacífica, de iguais -- costas com costas.