tudo uma questão de estilo
Sempre achei piada ao disparate. A vida seria cinzenta sem disparates. Gosto sobretudo daqueles que são ditos com ar sério e convicto de quem está a pregar aos infiéis ou vende elixires milagrosos. Pena é que, quando alguns são proferidos na televisão por comentadores alegadamente creditados pelo seu percurso político, não haja jornalistas a dar gargalhadas, tiras em rodapé a prevenir os telespetadores (ou bolinha no canto direito) ou, ao menos, um narizinho vermelho. Comentadores que dizem alarvidades para engrupir o povoréu deveriam ser obrigados a usar um nas cerimónias oficiais, nos atos solenes e nas aparições públicas. Um exemplo fresquinho? O inefável Luís Filipe Meneses, há pouco, perante o não menos caricato Mário Crespo.
Luís Filipe Meneses reclamou-se - para desviar a conversa, que não lhe agradava - "social-democrata". Não um qualquer, nem da estirpe de Sá carneiro (demasiado batida) nem da categoria de Cavaco (demasiado queimada); ná. Bem melhor: um "social-democrata dos anos 60, ao estilo nórdico". Não pensemos, segundo Meneses, que fosse coisa fácil; era mesmo perigosa. Durante uns momentos, discorreu sobre o que era pertencer a tal categoria nesse tempo. Não me recordo dos termos exatos, mas disse claramente que não era fácil, que era algo de mal visto e olhado com desconfiança. Pobre Meneses, pensei eu, andou a comer o pão que o diabo amassou por Estocolmo na década de 60, quando ser-se "social-democrata ao estilo nórdico" era um estigma. Pior - e dessa lembro-me - afirmou que podia até ser perigoso, como se provou pelo assassinato de Olof Palme. O baboso Crespo sorriu, engoliu e validou.
Ora bem. Eis os factos: na Suécia, os sociais-democratas governaram ininterruptamente entre 1936 e 1976; na Dinamarca, entre 1953 e 1968; na Noruega, nos períodos 1945-63 e 1963-65. E Olof Palme, como alguns se lembrarão, foi assassinado quando a "década de 60" já havia terminado há muito. Agora, alguém que me explique onde é que o célebre pediatra, afamado autarca e saudoso ex-líder social-democrata (ao estilo português) foi desencantar semelhante delírio. Será que ser partidário, filiado ou simpatizante da ala política dominante e que governava aqueles países daria azo, na Escandinávia dos anos 60, a um estatuto socialmente desprimoroso? O Meneses lá saberá. Mas, cá para mim, ele confundiu a Escandinávia desse tempo com o Portugal atual.
Adenda: aos 2:44, aqui; percebi mal, pelos vistos: é "um animal em vias de extinção" e "um social-democrata DOS anos 60" (e isso é que é perigoso: "ser social-democrata DOS anos 60 no norte da europa significa andar na rua, correr o risco de ser insultado, até de morrer, como aconteceu com o Olof Palme"). Pronto, meti a pata na poça.

