Gritámos, aplaudimos e chorámos - e tínhamos que chorar.
Sabemos o impacto desta vitória para tantas famílias e para tantas crianças, conhecemos as suas histórias, os medos, angústias, incertezas e o sofrimento por que já passaram por não serem reconhecidas na lei. Chorámos porque sabíamos que muitas vezes o preconceito não deixa ver as pessoas e não deixa ver as famílias - e não deixa ver as crianças; e sabíamos o quão difícil pode ser ultrapassá-lo e o quão importante e urgente era, neste caso, ultrapassá-lo.
Chorámos porque vimos que em todas as bancadas há pessoas sensíveis ao bem-estar das nossas crianças - e que perceberam que isso é mais importante que tudo o resto e que os argumentos apresentados contra este projeto em concreto nunca se poderiam sobrepor a esse bem-estar.
Chorámos porque lutámos por uma questão que era reconhecidamente uma questão de Direitos Humanos, como já estabeleceu o Tribunal Europeu - e porque percebemos que há pessoas de diversos grupos parlamentares que os valorizam.
Chorámos porque percebemos que Portugal ainda pode ser notícia por boas razões e que, mesmo num momento particularmente duro, as vidas das pessoas podem falar mais alto - e o Parlamento pode dar eco a essas vidas.
Não, não se afirmou o óbvio: que, no que diz respeito à candidatura à adoção, os projetos parentais de casais do mesmo sexo continuam a ser limitados sem qualquer justificação que possa sustentar a atual discriminação. Mas já antecipávamos que, apesar do trabalho que temos feito, e da evolução notável que aconteceu ao longo de um ano (como se comprova com as votações), não seria dado ainda esse passo fundamental. O trabalho, também quanto a esta questão, continua.
Mas conhecer as crianças e as famílias que podem ser protegidas pela coadoção é perceber a urgência desta lei - e a força emocional que encontramos nas nossas famílias é a força com que lutámos e lutamos pelo seu reconhecimento. Como diz, no livro 'Dia C', a Isabel Fiadeiro Advirta - que é sempre uma inspiração: "Trata-se de uma luta contra o tempo em que cada minuto que passa representa vidas inseguras, crianças desprotegidas, famílias discriminadas. O cronómetro não pára, a vida não pára e nós não vamos parar até que os nossos filhos e as nossas filhas estejam em segurança. Juntem-se a nós – ou saiam da frente."