O estranho caso da "mera conveniência"
Foi anteontem publicada em Diário da República a Resolução de Conselho de Ministros n.º 40/2013 que, como se pode ler no sumário do DR, diz respeito a:
"Determina que se proceda à demissão de gestores públicos, por mera conveniência, à cessação da designação em regime de substituição de vogal de instituto público e à cessação dos cargos de direção ou de responsabilidade na área financeira de personalidades envolvidas na celebração de contratos de instrumentos financeiros derivados de natureza claramente especulativa e ou contratualmente desequilibrados".
O sumário já indicia o problema, mas vale a pena ler os considerandos da RCM onde, essencialmente, se culpa os referidos gestores pelos famosos contratos de swap. Dito isto, que se concluiria? que o Governo, a determinar a demissão dos gestores públicos envolvidos, o faria por "justa causa", regime que, de certo modo, se opõe à demissão por "mera conveniência". Basta pensar que o primeiro não dá direito a indemnização, mas o segundo pode dar.
Ou seja, o Governo faz uma RCM a culpar certos gestores públicos por contratos de swap ruinosos, que originaram a quebra de confiança necessária entre Governo e gestores, mas a consequência que retira daí é que o regime de demissão a aplicar é o da "mera conveniência", como se se tratasse apenas de nomear pessoas de maior confiança. Cabe perguntar, o que terá que acontecer para alguém ser demitido com justa causa?
Das duas, uma: ou os gestores em causa tomaram as melhores decisões à data, tendo-se percebido mais tarde que os contratos eram ruinosos e o Governo não teria razão para fazer os considerandos que faz na RCM, apesar de poder demitir os gestores - como sempre pode - por mera conveniência; ou, face a tais considerandos, o Governo está a culpar os gestores e então é incompreensível a aplicação do regime da mera conveniência.
Creio que é a isto que se chama coerência e "ética da responsabilidade".