a pedido de várias famílias (daquelas fracturantes, descontruídas e assim)
Pedro Marques Lopes, EMPRESÁRIO, COMENTADOR, BLOGUISTA, NOVO MEMBRO DO 'EIXO DO MAL' "Somos um país que acredita pouco na liberdade" Era suposto ser um almoço, mas ele preferiu jantar. Ficou pois para as 22 horas, no restaurante que o minhoto tripeiro lisboeta (Minho de família, Porto de nascimento e clube, coração da Lisboa onde chegou aos quatro anos - "Amo esta cidade como só os imigrantes amam a cidade que os acolhe") Pedro Marques Lopes frequenta e prefere há mais de 20 anos. "Ia muito ao Frágil [bar na mesma rua, que esteve no centro da 'fundação' do Bairro Alto como centro da vida nocturna lisboeta] e a primeira vez que tive dinheiro para vir aqui e me encostei àquele balcão achei-me um tipo importantíssimo". O tom é o dele, entre a ironia e uma certa grandiloquência - mistura estranha, mas que no caso resulta - e o balcão é o longo balcão do Pap'Açorda, que acolhe, num travelling estreito, os clientes à espera de mesa.
Nesta noite, ao fim do travelling está uma estrela. Não o Pedro - que também é uma estrela, e ascendente, como se irá demonstrar - mas uma estrela das que já quase não há. De óculos rectangulares, vestido bata negro de cavas e o célebre cabelo louro, Catherine Deneuve ocupa a melhor mesa, a do espelho, na primeira sala, a dos fumadores. Está a jantar com um homem moreno, de cara vagamente argelina, e deve ter estado ao sol mais do que devia - ou isso ou fez um peeling um bocado violento. Cool (ou, na versão francesa, blasée), nem pestaneja quando o Rodrigo Cabrita dispara, mesmo ao lado, uns flashes sobre o sujeito deste texto. Cool e meio, o Pedro espera até nos sentarmos à mesa - numa mesa mais longe - para, entre dois pimentinhos padron, referir a presença luminosa em que nem fotógrafo nem jornalista haviam reparado. "Adoro a Catherine Deneuve", garante, e ei-la a meio metro e a meio da caldeirada e dos linguadinhos fritos com açorda (dois pratos do dia), muito direita nos seus 65 anos, a caminho da casa de banho. Sim, a Deneuve também vai à casa-de-banho. Pior, a Deneuve também envelhece. Falamos disso - disso e da crise da meia idade, uma coisa de que se ouve toda a vida falar e que um dia se suspeita estar a ocorrer connosco. Uma espécie de redescoberta do mundo - outra idade das perguntas, agora em nostálgico, perplexo e amargo. "Luto para não ser amargo", diz ele. Que aos 42 anos logrou algo que faz parte da mitologia dessa chamada crise: mudar de vida. Filho de um empresário de hipermercados e de uma professora primária, tirou o curso de Direito na Católica e um MBA na Universidade Nova. "Queria ser actor, a maior paixão da minha vida foi o teatro. Mas venho de uma família de self-made men que olham para a cultura de lado. Também quis ser jornalista. Acabei merceeiro, como o meu pai. Também fui cauteleiro [administrador da Casa da Sorte] e gasolineiro [tem postos de gasolina]. Há quatro anos tive uma doença muito grave e estava deitado à espera de morrer quando percebi que nunca tinha feito nada na puta da vida, em termos profissionais, de que gostasse. Era como se fosse homossexual e tivesse medo de assumir." Parêntesis: Pedro é de direita - diz ele - e liberal (o que é óbvio). Defendeu a legalização do aborto até às 10 semanas, defende o casamento das pessoas do mesmo sexo, é ateu. Na direita portuguesa, não há muitos como ele, ou então andam bem escondidos - e é o primeiro a afirmá-lo: "Somos um país que acredita pouco na li berdade. Ser de direita é achar que a liberdade é um valor superior à igualdade". Diz-se próximo do PSD e há quem o diga "a cabeça" de Pedro Passos Coelho. Era ele o homem de gabardine bege que acompanhou o prospectivo líder ao anúncio da candidatura. Fim de parêntesis. "Então comecei a escrever num blogue, O Acidental [já acabou], na revista Atlântico [já fechou] e no respectivo blogue [ainda existe]; convidaram-me para fazer comentário político no Rádio Clube Português , meti-me na política, fui convidado pelo Nuno Artur Silva [das Produções Fictícias] para fazer um comentário-vídeo na Net sobre futebol [À lei da bola] e agora para o Eixo do Mal [vai substituir José Júdice a partir de Setembro]." Em pouco mais de seis meses, passou de ilustre desconhecido a vedeta do Jornal das Nove da SIC Notícias, onde esteve esta semana a comentar o Pontal, a ausência de Ferreira Leite, e o rumo do PSD. E a fazer o que gosta. Haveria muito mais a dizer sobre isso e sobre ele, mas não há espaço. Fica para a próxima. Vai haver muitas ocasiões para falar de Pedro Marques Lopes. (publicado no dn de 24 de agosto, na rubrica 'dois cafés e a conta')