Atenção com os (ou aos?) "chuis"
Ontem, depois de ler isto, isto e isto, fiquei a matutar na história do aparente - digo aparente porque não tenho números anteriores - aumento do número de suicídios nas forças da ordem.
O suicídio é um comportamento que pode surgir na sequência de diferentes situações vivenciais e que não é um sintoma específico de nenhuma patologia psiquiátrica - em rigor, pode acontecer mesmo na ausência de doença mental. Deve-se, por isso mesmo, ter atenção e cuidados redobrados na procura de relações causa-efeito. São vários e de diferente ordem os factores predisponentes, desencadeantes e de risco para a ideação suicida e para o suicídio consumado (cf. "questões frequentes"). Como facilmente se entende, qualquer abordagem preventiva terá de os conhecer e de os ter em conta. Daqui resulta que o primeiro movimento a fazer é procurar perceber, numa determinada situação concreta, quais são esses factores e qual a sua importância relativa naquele contexto particular.
Na avaliação clínica de uma tentativa de suicídio - numa urgência hospitalar para decidir da necessidade de internamento do sujeito, por exemplo - usam-se dois parâmetros major, a intencionalidade do acto ("quanto" é que o individuo quis morrer) e a letalidade do meio usado ("quanto" é que o método usada mata). Além disso, importa ter presente que o método habitualmente usado na tentativa de suicídio é o "mais à mão". Aplicando estas linhas gerais de avaliação ao caso das forças policiais resulta óbvio que o método mais à mão - a arma - é altamente letal, o que, só por si e de modo independente da intencionalidade, pode contribuir para um acrescido risco de suicídio - digamos que a eficácia da tentativa é, à partida, enorme.
Estava eu nestes pensamentos quando dei de caras com o anúncio da publicação do livro "Polícia à Portuguesa", de Fernando e Mário Contumélias. Parece, então, que o assunto é mais abrangente, não se limita à temática do suicídio. Estamos a falar de profissionais sujeitos a um intenso e crónico stress laboral, com todas as condições para desenvolver um Síndrome de Burnout. Ora, tanto quanto julgo saber, não existe qualquer estudo nacional sobre o assunto nestas áreas profissionais. Porque não começar por aí? Seria bem mais útil que enfiar num mesmo saco situações clínicas substancialmente diferentes no que aos seus factores etipatogénicos, diagnósticos e terapêuticos diz respeito, penso eu de que.

