Esta gente passa-se!
Depois da IV Conferência Mundial sobre a Mulher em Pequim em que, recorrendo a todos os mecanismos possíveis de pressão política e aos seus aliados na ONU - os fundamentalistas islâmicos, Malta e alguns países latinoamericanos - os representantes do Vaticano tentaram boicotar a Plataforma de Acção que estabelecia a universalidade dos direitos humanos das mulheres, teve início uma campanha que pretende mudar o estatuto do Vaticano nas Nações Unidas.
De facto é incompreensível o estatuto de «observador permanente» da Igreja Católica nesta organização já que, como afirma Elfriede Harth, representante para a Europa do grupo Catholics For a Free Choice , «O Papa é um líder espiritual e religioso e não um chefe de Estado».
O documento emanado da «Santa Sé» depois de Pequim condena veementemente a Plataforma de Acção, ou antes, a «ideologia de género» subjacente. Assim declara inaceitáveis todo o capítulo IV, secção C, sobre saúde, «por dar atenção desproporcional à saúde sexual e reprodutiva», a afirmação de que as mulheres têm direito a controlar a sua sexualidade -«porque poderia entender-se como aprovação a relações sexuais fora do matrimónio heterossexual» - e a secção sobre os direitos humanos, pelo «excessivo individualismo na forma de tratar tais direitos».
Mas se este documento em si é vergonhoso, mais vergonhosa é a explicação da recusa da não ratificação da Convenção das Nações Unidas que pretende pôr fim à discriminação de deficientes, em vigor desde Maio. De facto, o Vaticano não assina esta convenção porque ela não condena o aborto e não afirma o direito à vida de embriões/fetos com deficiências graves. Em particular, o Vaticano condena os artigos da Convenção que afirmam os direitos dos deficientes à auto-determinação sexual e à educação e saúde reprodutivas.
Claro que depois da veemente oposição do Vaticano à resolução que propõe a descriminalização da homossexualidade, punida com pena de morte em vários países, esta oposição à afirmação dos direitos dos deficientes não é inesperada mas frisa a necessidade da alteração de estatuto do Vaticano na ONU!
Adenda: Para além da referida convenção, o Vaticano não ratificou as muitas convenções que versam sobre direitos humanos. Por exemplo, rejeitou as convenções que pretendiam a eliminação da discriminação com base na sexualidade mas também as que se destinavam a banir a discriminação baseado no emprego, profissão e educação. Também não ratificou as convenções que tratavam da protecção dos direitos dos povos indígenas, das mulheres e em defesa da família e do matrimónio. O mesmo aconteceu com as convenções contra o genocídio, os crimes de guerra, os crimes contra a humanidade e o apartheid, para além de se ter recusado a assinar as convenções que pediam a supressão da escravatura e/ou trabalhos forçados, a tortura e a pena de morte.
Aparentemente o único «direito» humano que o Vaticano quer defender com o seu voto na ONU é o direito à intolerância em relação aos que não seguem os seus «princípios de natureza moral e religiosa».