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cultura de morte

No seu turno de presidência da União Europeia, a França vai este mês solicitar, nas Nações Unidas e com o apoio da UE, a descriminalização universal da homossexualidade. Existem ainda 75 países que proíbem – criminalizam, portanto – as relações entre pessoas do mesmo sexo, e nove onde este crime é punido com a pena de morte. A iniciativa da França visa, pois, uma coisa aparentemente óbvia: certificar que pessoas não são presas, julgadas e mortas por terem sexo com outras pessoas que por acaso são do mesmo sexo.


Na generalidade dos países europeus, assim como nos EUA e Canadá, a homossexualidade não só foi há muito descriminalizada (em Portugal, por acaso, só em 1982) como os crimes cometidos com motivação homofóbica são particularmente agravados – como, de resto, todos os crimes cometidos com motivação de ódio, seja ele racial, religioso ou político. O ódio é uma coisa terrível, sem dúvida, e dificilmente, dir-se-ia, compaginável com as ideias de concórdia e beatitude geralmente associadas às religiões por aqueles que as louvam e seguem. Sucede que em todos os locais onde os homossexuais são perseguidos legalmente a motivação que subjaz ao ódio institucionalizado é religiosa. Daí que não possa surgir como surpresa, apesar de estar a ser acolhida com viva indignação por todo o mundo, a posição do Vaticano sobre a proposta da França. Segundo o arcebispo Celestino Migliore, o pequeno Estado confessional opõe-se-lhe por considerar que vai conduzir a “uma reversão da discriminação”. Diz o clérigo que a seguir – a seguir a deixarem de prender e matar os homossexuais, depreende-se -- os Estados que não permitem o casamento homossexual serão “pressionados”.

Apelidada de “grotesta” pelo jornal italiano La Stampa e “totalmente idiota” pelas organizações gays italianas, a declaração vaticana deixou um editorialista do La Repubblica confessamente “aparvalhado”. Mas a verdade é que faz todo o sentido. Para o Vaticano, que se tem, ultimamente, desdobrado em declarações e normas anti-homossexualidade (chegando ao paradoxo de decretar que os homossexuais não podem ser padres, quando é suposto os padres não terem qualquer actividade sexual) e que acolhe cada proposta a favor da normalização institucional das relações homossexuais, seja através de uniões de facto ou de casamento civil, como uma espécie de anúncio do apocalipse, a criminalização da homossexualidade e a recusa do reconhecimento das uniões homossexuais estão no mesmo pacote. Uma deriva da outra – naturalmente. Afinal, por que outro motivo senão o de a homossexualidade constituir uma “desordem inaceitável” (palavras do papa) se recusaria a possibilidade de um casal homossexual ter os mesmos direitos que um casal heterossexual?

Para o Vaticano, pois, a possibilidade de acabar no mundo inteiro com a criminalização da homossexualidade levaria necessariamente à pressão para a aprovação dos casamentos homossexuais no mundo inteiro. E, portanto, a única forma de impedir que esse horror – a universalização do casamento homossexual – suceda é continuar a perseguir os homossexuais no maior número de países possível. Esta posição do Vaticano tem a vantagem de tornar cristalinos os motivos dos que opõem ao casamento das pessoas do mesmo sexo. Trata-se de ódio, ódio puro e simples – aquele tipo de ódio que mata. Que outro sentimento, senão o ódio, vive melhor com a perseguição e morte dos homossexuais que com a possibilidade de um apelo para que essa perseguição e ódio acabem? E que outra causa melhor que esta para animar o Vaticano em Dezembro, o mês das mensagens de paz na terra aos homens de boa vontade?
(publicado na coluna 'sermões impossíveis' da notícias magazine de 14 de dezembro)
 


 

4 comentários

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    Jaime Roriz 21.12.2008

    Orabem,

    Vejamos, do ponto de vista do direito, (porque é disso que se trata) o que significa proibir e, já agora, porque é que o orabem ficou tão chateado.

    Eu, como jurista, nem gosto nada do termo proibir, uma vez que, na maioria ddo ordenamento juridico a proibição resulta das normas e não é um expressão textual.

    Em lado nenhum do ordenamento jurídico está textualmente expresso que é proíbido matar.

    A proibição resulta da sanção que o direito pretende dar a um determinado comportamento e da coercibilidade que está compreendida nessa sanção.

    Em regra podemos considerar que há dois tipos de ilícito. (haverá mais mas simplifiquemos) O ilícito civil e o ilícito penal.

    O ilícito civil não é propriamente uma proibição, mas quem tiver determinado comportamento no que respeita às suas obrigações sujeita-se a determinadas penalidades destinadas a defender a segurança juridica e os interesses dos particulares.

    No ilícito penal - que pode ser divido em crimes e contra-ordenações - as sanções que encontramos destinam-se a dissuadir, através de penas ou multas, as pessoas de terem um determinado comportamento que ofende TODA a sociedade. É o caso de se matar uma pessoa ou de passar um sinal vermelho. Resulta da lei que ambos os comportamentos são proibidos e ambos estão sob a alçada das regras do direito penal.

    Orabem, não se ofenda assim tanto com o texto da Fernanda, porque a verdade é que a proibição da homossexualidade pretende punoir um determinado comportamento que é assumido, pelo direito do país, como um comportamento que ofende TODA a sociedade.

    Entendo assim que no texto da jornalista o termo proibir estava bem empregue. O grave é precisamente isso.
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    pedro oliveira 21.12.2008

    «a verdade é que a proibição da homossexualidade pretende punoir um determinado comportamento que é assumido, pelo direito do país, como um comportamento que ofende TODA a sociedade.»

    Caro Jaime,

    O incesto, também, é um comportamento.
    Deverá ser punido o incesto heterossexual e despenalizado/legalizado o incesto homossexual?
    Deverão ambos ser permitidos/legalizados?
    O incesto é proibido, pois, poderá gerar filhos «especiais» no incesto homossexual a questão não se coloca.
    É criminalizado por razões estritamente morais (religiosas como diria f.)
    Como jurista o que opina?
    Seria interessante a opinião dos senhores doutores Miguel Vale de Almeida e Paulo Côrte-Real sobre o assunto.
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    f. 22.12.2008

    caro pedro oliveira, não diga essas coisas senão o ora bem trucida-o. cum caraças, pedro oliveira o incesto não é nem sequer um bocadinho proibido. nem uma multita. o que é proibido, daí se calhar a sua confusão, é o casamento entre parentes em linha directa e entre irmãos. o casamento, não o acto sexual. aliás, da forma como está redigida a lei das uniões de facto (ou do que dela recordo, posso estar enganada), nada obsta a que dois parentes que 'cometam' incesto possam não só viver juntos (coisa que nada pode impedir, naturalmente) como invocar essa lei para os efeitos que ela permite.
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