Ainda Darwin
Visitei ontem a exposição sobre Darwin organizada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Por ser empregado desta instituição, por ser amigo ou colega de alguns dos organizadores do evento e por ter dado um contributo tangencial sou muito suspeito, mas tenho duas certezas. A primeira: esta exposição é superior à que vi no Museu de História Natural de Nova Iorque, em 2006. De resto, era essa a obrigação, visto que muito do material foi gerado por essa exposição pioneira e era preciso acrescentar. Foi o que aconteceu. A segunda: a exposição trata do que realmente interessa, que é a biografia de Darwin e a génese da sua teoria. Trata ainda do que aconteceu à teoria de Darwin, na Biologia, depois da morte do naturalista. Centra-se muito pouco ou mesmo nada naquilo que geralmente é o chamariz do dito darwinismo. Quem se interessa pelo darwinismo, deve, antes de mais, tentar perceber o que Darwin disse. A teoria é muito simples mas tem subtilezas. Por exemplo, a resistência de muitos ao papel do acaso é um problema de ignorância.
Não nego a importância do darwinismo nos seus múltiplos aspectos. Não podemos exigir que a história natural desperte mais interesse que as questões (eco fantasmagórico) Quem somos? Para onde vamos? É inevitável que os Jónatas Machado deste mundo recebam tempo de antena, mas é tabloidismo intelectual fazer artigos apenas com Jónatas. Jónatas existe nos media por causa de Darwin. Tal como as estrelas da psicologia evolutiva. Por isso, embora o perceba, aborrece-me um pouco o timing do comentário do Miguel Vale de Almeida, Darwin: manusear com cuidado. Há aqui um tom anticlimático e até algo pachequista.
Não estamos propriamente a celebrar o feito dos cientistas de Los Alamos, nem estamos a tentar que as pessoas entendam a física quântica. Tudo deveria ser um pouco mais simples. Quando o frenesim criacionista e corporativista acabar, ainda haverá uns dias para na Gulbenkian se tentar perceber o que Darwin pensou e com alguma sorte alguém sairá de lá um pouco mais esclarecido sobre o que é a teoria da ascedência comum e o mecanismo da selecção natural.

