crime de ódio
Já muito se disse sobre o ocorrido no 1º de Maio com a delegação do PS que visitou a manifestação da CGTP. Houve quem (PS) exigisse pedidos de desculpas às direcções da CGTP e do PCP, quem (PCP) exigisse desculpas por lhe terem exigido desculpas, quem (Carvalho da Silva) pedisse desculpa ao fim de um dia a desculpabilizar o ocorrido, quem (Jerónimo de Sousa) recusasse sequer tomar conhecimento do assunto, quem (Saramago) exortasse as organizações em causa a expulsar os seus associados responsáveis pelas agressões e quem (Pedro Sales, assessor do BE) garantisse que se um militante agredisse alguém naquelas circunstâncias seria expulso. As reacções foram (ou acabaram por ser), na generalidade, de desaprovação, com a notória e iniludível excepção da direcção do PCP. Mas uma questão foi pouco ou nada abordada: a da natureza do sucedido. Essa natureza foi aliás diluída na reacção dos próprios visados, que elidiram a sua componente mais óbvia: a de crime contra a liberdade e a integridade moral e física, e portanto de caso de polícia. É um erro. Conduzir as agressões e injúrias para o plano político-partidário e exigindo apenas por elas um pedido de desculpas opera, paradoxalmente, uma espécie de banalização da violência. Mais: permite que o caso se instrumentalize numa troca de galhardetes e acusações que chegou ao ridículo dos pedidos de desculpas cruzados. Seria, é claro, interessante saber onde andavam as autoridades policiais que em regra são deslocadas para a zona de manifestações. E é de lamentar que a bateria de jornalistas presente no local não tenha tido a presença de espírito - e a coragem - de questionar agressores e injuriadores. Mas as autoridades teriam decerto a maior facilidade em identificar os envolvidos a partir das muitas imagens de TV disponíveis. Aí saber-se-ia, sem sombra de dúvida, quem são e, pela sua boca, os motivos que os moveram. E isso - saber quem são estas pessoas e por que raio acham que têm o direito de fazer o que fizeram - não é nada despiciendo. Não é o facto de Vital Moreira não ter tido necessidade de receber tratamento hospitalar e ter saído pelo seu pé da zona de perigo que torna menos grave e menos ilegal o que se passou ou afasta a necessidade de tornar claro que agredir e injuriar são crimes previstos pelo Código Penal, agravados pelo facto de, claramente, terem sido cometidos por ódio político (agravamento previsto desde 1995). Claro que chamar a polícia a mexer neste assunto teria custos políticos - num país em que por dá cá aquela palha se anuncia o regresso do fascismo, em menos de um fósforo teríamos tiradas sobre "pressões", "perseguição" e "polícia política". Sucede que fascismo, pressão e perseguição foi o que sucedeu neste 1º de Maio, com gente a arvorar-se em polícia política a coberto do anonimato e da cobardia do número, num linchamento simbólico. Nenhum antifascista digno do nome pactua com isso nem arranja justificações como "descontrolo individual" ou "crispação política" (como faz o comunista Vítor Dias numa carta ao director do Público). Porque o contrário do fascismo é a democracia, não é outro totalitarismo qualquer.